MATÉRIA REPUBLICADA PELA GAZETA CENTRAL
17 DE NOVEMBRO DE 2014.
Eternit continua produzindo amianto no Brasil. Itália condena dois diretores da empresa a 16 anos de prisão
A Itália condena dois ex-diretores do grupo Eternit a 16 anos de prisão. No Brasil, com laudos aparentemente contestáveis, a Eternit continua produzindo amianto em Minaçu. A empresa financia campanhas eleitorais e pesquisas supostamente “contaminadas”
Élio Martins, presidente da Eternit: sua primeira providência, no lugar de sugerir pesquisas independentes e críveis, foi informar que a Eternit europeia não tem a ver com a brasileira (Henrique Manreza/Brasil Econômico)
Editorial do Jornal Opção de Goiás
A Justiça de Turim condenou dois ex-dirigentes da Eternit, o magnata suíço Stephan Schmidheiny e o milionário belga Jean-Louis de Cartier, a 16 anos de prisão “por negligência, que teria causado a morte de 2,1 mil pessoas em decorrência da contaminação pelo amianto”, revela o jornal “Brasil Econômico” (quinta-feira, 22), na reportagem “Decisão de corte italiana respinga na Eternit Brasil”, assinada por Denise Carvalho. As prisões derrubaram o preço das ações da Eternit.
Os Estados brasileiros não se comportam como Estados, e sim como se fossem países. Apesar de que o amianto já foi banido em 58 países da Europa, porque provoca câncer e outros tipos de doenças (o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, começou sua carreira política denunciando os perigos do amianto; a história pode ser verificada na biografia “A Ponte — Vida e Ascensão de Barack Obama”, do jornalista David Remnick, editor-chefe da revista “New Yorker”), e de os Estados de São Paulo, Pernambuco, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul terem proibido o uso do minério, “a questão [da proibição] tramita há quatro anos no Supremo Tribunal Federal”.
Poderosa, a Eternit do Brasil encomenda pareceres de cientistas supostamente qualificados (e devem ser mesmo) — como se a ciência fosse eminentemente isenta (será preciso lembrar o que cientistas fizeram na Alemanha nazista e na União Soviética?) — e eles garantem que o amianto crisotila não faz mal à saúde. Ora, em Minaçu, onde está instalada a sede da Sama/Eternit em Goiás, há registros de trabalhadores que contraíram várias doenças. Procede que a Sama instalou medidas preventivas e que, possivelmente, os índices de doença diminuíram (a própria mudança de conduta sugere que havia alguma coisa errada).
Há uma questão pouco discutida: os próprios trabalhadores hoje não gostam de discutir o assunto, porque os salários na empresa são mais elevados do que a média salarial da região Norte do Estado. Assim, a saúde, presente e futura, não é debatida. A Sama é a principal fonte de renda e sobrevivência da população de Minaçu.
Além disso, por ser grande pagadora de impostos (trata-se de uma empresa, em tese, correta com seus negócios) e financiadora de campanhas eleitorais, a Sama é sempre defendida por políticos e governantes, independentemente de credos ideológicos e partidários. Nenhum governo de Goiás procedeu a uma investigação profunda sobre as condições de trabalho da Sama e sobre os riscos do amianto para a saúde coletiva (não apenas dos trabalhadores da empresa).
Não há qualquer interesse em fazer isto. PMDB, PSDB e PT, que irmanam-se na defesa da empresa, teoricamente para garantir empregos e impostos, sempre atuaram como protetores dos extratores de amianto. “Acreditam” piamente nas “pesquisas” do grupo. Parecem não ter um minuto de dúvida.
Bancando campanhas políticas, a Sama/Eternit é tão forte que nenhum jornal de Goiás deu a notícia da prisão dos ex-diretores da Eternit na Europa. Assim como não mencionam a possibilidade de, a médio ou longo prazo, a Eternit abandonar seus negócios em Minaçu. Há um pacto de silêncio que une políticos e mídia a favor da Sama.
Há algum tempo, o cineasta e agitador cultural PX Silveira, filho do falecido médico José Peixoto da Silveira, que foi candidato a governador contra Otávio Lage, na década de 1960, produziu um documentário sobre a Sama, mostrando inclusive pessoas que ficaram doentes em decorrência do contato com o minério, e tentou exibi-lo no Festival Internacional de Cinema Ambiental de Goiás. Não conseguiu.
O filme foi barrado. Não lhe deram nenhuma explicação oficial. A oficiosa sugeria que, com o filme, estaria prejudicando uma empresa que contribui com o “desenvolvimento” de Goiás. Crianças preocupam-se apenas com o presente, e isto é perfeitamente natural, mas governantes não podem pensar tão-somente na arrecadação de impostos em quatro anos. Têm o dever de pensar nas gerações sacrificadas do presente e das que serão sacrificadas no futuro. Isto é pensar como estadista.
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