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segunda-feira, 17 de agosto de 2015

PT, QUE FOI CRIADO PARA SER OPOSIÇÃO E DEFENDER O POVO PASSA PELO ACORDÃO E COM UMA VARIANTE O FORO DE SÃO PAULO QUE CAUSA A MORTE DO PT E DE SEUS SONHOS

renato santos
17/08/2015

UM BREVE ANÁLISE 


Mas achei necessário esperar por hoje, para ler os jornais – porque uma camada importante do que acontece nesse momento é a guinada da imprensa. 



Falando em nome do capital, o vice-presidente da Globo, João Roberto Marinho, tem feito uma rodada de conversas com políticos, incluindo Dilma, Temer, vários ministros e lideranças da oposição, pedindo um pé no freio da fervura política.


Obviamente há um “acordão” em curso. Mas, como sinalizou o senador Romero Jucá, outro representante da grana, em entrevista bastante interessante à Folha de São Paulo no sábado, há uma variante em aberto nesse acordão: se ele inclui Dilma ou não. 

Curiosamente, do ponto de vista dos outros atores políticos, seria uma vantagem manter Dilma (paralizada) em cena – como esponja de toda a insatisfação, que ainda vai aumentar, com a crescente deterioração da economia. Todo mundo sabe que há alguns anos de dureza pela frente.


Na semana passada, foi notável a rapidez com que Dilma e Lula aderiram à cruel “agenda Brasil” do presidente do Senado, Renan Calheiros, um apanhado de pautas anti-sociais (incluindo num primeiro momento até a cobrança do SUS e, claro e como sempre, a destruição ruralista das conquistas indígenas e da segurança ambiental). 

O fato mostrou como estão dispostos a se agarrar a qualquer bóia lançada. Estão dispostos a fazer esse feio papel de fantoches, apenas para se manterem formalmente no poder (no caso de Lula, tentar manter alguma influência contra as denúncias de corrupção).

Por isso era importante aferir não só a quentura das ruas ontem, mas também a cobertura e a análise da imprensa, cuja ordem agora é jogar água fria – na medida do possível. Meu amigo, o jornalista Bruno Torturra, postou no facebook ontem uma pequena análise em que diz: “os manifestantes de hoje não entendem que, no fundo, já ganharam a parada. A agenda liberal está estabelecida como nunca. 

As pautas de esquerda, as políticas sociais, a agenda dos movimentos populares e o próprio poder de Dilma e do PT estão esfacelados. 

Mas não importa para a turma. A briga nunca foi política, mas pessoal. Mas quem disse que eles são liberais? Querem sangue, cadeia e impeachment. E isso a elite empresarial, midiática e política já entende como dispensável. Indesejável até”.

Em outra análise convergente, diz o professor Moysés Pinto Neto: “O ‘centrão’, as velhas e novas oligarquias e tudo que há de pior no Brasil nunca estiveram tão fortes quanto hoje, ainda mais que a esquerda e os movimentos sociais recusam-se enfrentar o PT por causa da simbólica estrela, adotando o discurso do ‘golpismo’ que é, no fim das contas, uma estratégia usada desde a eleição de Lula para neutralizar a oposição em geral. Assim, como a emblemática foto das estudantes da UNE com Kátia Abreu demonstra, preferem se ajoelhar diante do Planalto enquanto são massacrados por propostas como a Lei 

Antiterrorismo (cujo projeto horrendo saíra de lá), os pactos com velhos oligarcas e o ataque aos direitos de minorias”. Escolhi essa imagem pavorosamente sintomática do melê oportunista-ideológico, tirada do twiter da ministra ruralista Kátia, como ilustração: ela com Carina Vitral, presidente da UNE, e Bárbara Melo, da UBES, numa foto-família.

Apesar de concordar com Bruno, eu, ao contrário dele, estou com a “irracionalidade” das ruas. Também quero ver Dilma fora da presidência e Lula preso, antes que este governo acabe. Não por razões de direita, mas por uma necessidade psicossocial terapeutica. 

Explico. O PT recriou o masoquismo social numa escala e modo nunca vistos. É claro que as ditaduras populistas têm fases de apoio social – no Brasil, o caso mais notável é o de Getúlio, adorado pela classe trabalhadora como “pai dos pobres”. Mas a característica desses ditadores é fazerem, sim, alguma entrega de bem estar social – manipulando ao mesmo tempo o ódio de classe (no caso de ditaduras de esquerda) ou outros ódios, por exemplo racial (quando são ditaduras de direita).


Os traços messiânicos de Lula não foram investidos numa tentativa de ditadura (em boa parte pelo fato do stalinista José Dirceu ter sido pego com a boca na botija). Mas foram suficientes não só para turbinar e eleger uma figura sem a menor expressão política, Dilma, como também (com uma campanha de mentiras, chantagens e ameaças) para reelegê-la. 

A burrada foi rapidamente exposta, tanto por inabilidade política quanto pela revelação da escalada gigantesca da corrupção em um governo que se dizia “popular”. 

Mas uma parte do eleitorado, pequena, porém ainda vistosa nas redes sociais, insiste em permanecer agarrada ao cadáver político da presidente – mesmo que, para se manter no poder, ela mesma se agarre a uma figura criminosa e oportunista como Renan. Dilma não tem nenhuma entrega para fazer – a não ser a de “esponja”.


O chamado “ódio” ao PT estaria restrito aos círculos de sempre – aos quais Lula sempre sobreviveu com facilidade. Isso se o masoquismo de um certo eleitorado petista não criasse e alimentasse uma onda correspondente de sadismo social. Em sua coluna de hoje, o colunista de direita Luiz Felipe Pondé fala de “ódio ‘fofo’ versus ódio não fofo”. 

Mas acho que o embate corresponde a um esquema patológico mais clássico, o que Freud chamou de “benefício secundário da doença” – quando a manutenção de uma neurose traz algum tipo de satisfação psicológica. 

No caso, a turma do “bem” arrancando satisfação psicossocial da sua condição de “vítima” (o que é um componente arquetípico prometéico comum a católicos e comunistas, que são influência na nossa intelectualidade dita de esquerda).


O tempo de o PT fazer uma autocrítica foi perdido. O partido será inapelavelmente destruído – e quanto antes isso acontecer melhor, para a liberação das “energias de esquerda” capturadas nessa defesa insana. Mas ainda há tempo de parte desse seu eleitorado intelectual dizer “fizemos merda”. 

Para isso, é preciso enxergar que o crescente ódio a Dilma, Lula e ao PT faz sim, sentido. É um produto dos erros e das traições e (não menos importante) da incapacidade de autocrítica. O povo, na real, é cada vez menos permeável a essas noções de “esquerda” e  “direita”. 

A direita sempre atacou o PT por suas qualidades, mas hoje o PT está sendo massivamente repudiado pelas camadas populares de seu próprio ex-eleitorado.


Como dizia John Lydon, anger is an energy. Há uma boa oportunidade da tentativa de acordão e do jogo de conveniências medíocre serem varridos pela potência desse psicodrama social. 


E Dilma é o bode sacrificial – por mais que os senhores da grana, da mídia e da política agora queiram, não vai ser fácil barrar esse roteiro arquetípico que foi colocado em movimento. Em tempo: os jornais continuam em cima do muro.

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