RODOLFO BORGES
04/03/2016
"Não sei nem se ele fez delação... Ele vai fazer?", desconversou o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, quando questionado nesta quinta-feira sobre o acordo de delação premiada do senador Delcídio do Amaral (PT).
Janot, que acrescentou que não discute "ato jornalístico, que não é jurídico", seria o responsável por tomar o depoimento de Delcídio em caso de acordo por delação.
Não há confirmação oficial, portanto, sobre a existência do depoimento em que o ex-líder do Governo no Senado implica a presidenta Dilma Rousseff em tentativas de atrapalhar a Operação Lava Jato. Mas, a julgar pelas reações no mundo político e econômico, é como se a confirmação nem fosse necessária.
O próprio Delcídio do Amaral, ao se manifestar sobre a questão, não confirmou — mas também não negou — que tenha firmado um acordo de delação premiada.
Em nota, o senador e sua defesa afirmam que nem ele nem sua defesa "confirmam o conteúdo da matéria assinada pela jornalista Débora Bergamasco" na revista IstoÉ, que noticiou o que seriam os detalhes do acordo. "Não conhecemos a origem, tão pouco reconhecemos a autenticidade dos documentos que vão acostados ao texto", informa a nota, que destaca ainda que a jornalista não procurou o senador para confirmar a "fidedignidade dos fatos relatados".
Apesar de todas as incertezas que rondam a questão — ou talvez exatamente por conta delas —, a presidenta Dilma Rousseff divulgou nota no início da noite para dizer que as ações de seu Governo têm se pautado "pelo compromisso com o fortalecimento das instituições de Estado" e que "se há delação premiada homologada e devidamente autorizada, é justo e legítimo que seu teor seja do conhecimento da sociedade", ressalvando que "é necessária a autorização do Poder Judiciário". A presidenta repudia na nota "o uso abusivo de vazamentos como arma política". A reação inusual de Dilma expõe o impacto de ver pela primeira vez seu nome no meio do furacão da Lava Jato.
O ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo, que Delcídio também estaria acusando de tentar interferir na Lava Jato, se apressou em desqualificar o senador. Segundo Cardozo, que chegou a convocar uma entrevista coletiva para comentar a questão, o ex-líder do Governo teria motivos para mentir e retaliar o Palácio do Planalto, que não o ajudou a sair da cadeia após suspeita de estar interferindo na Lava Jato. Já o ministro-chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, disse que não viu "muita consistência" no material publicado pela IstoÉ. "Há muita poeira e pouca materialidade".
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que também seria apontado por Delcídio como entre aqueles que tentaram interferir na Lava Jato e que já vem dedicando boa parte de seu tempo para se defender de suspeitas e acusações ligadas ao caso, disse em nota que "jamais participou, direta ou indiretamente, de qualquer ilegalidade, seja nos fatos investigados pela Operação Lava Jato, ou em qualquer outro, antes, durante ou depois de seu Governo".
Não é o que pensa a oposição. O senador Aécio Neves (PSDB) subiu o tom e disse que chegou a hora de Dilma renunciar. "Será que não está no momento de a presidente da República, pensando não agora no seu partido e sequer no seu futuro, mas pensando no país, renunciar ao mandato de presidência da República?", disse. "Se isso tudo for verdade e se a delação for aceita pelo Supremo Tribunal Federal, o país estará diante de uma situação política de uma gravidade sem precedentes", acrescentou seu colega Ricardo Ferraço (PSDB).
Longe da fogueira armada em Brasília, a Bolsa de Valores de São Paulo reagiu com intensidade e, deslocando-se dos mercados internacionais, viu seu principal índice subir acima de 5%, repetindo um movimento que se observa sempre que as coisas vão mal para o Governo Dilma. O dólar, por sua vez, caiu mais de 2%, para 3,80 reais, seu menor patamar em três meses. E a delação premiada de Delcídio do Amaral nem sequer foi homologada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) — se é que virá a ser. Seja como for, o episódio Delcídio trouxe mais combustível para a crise, dez dias antes de uma manifestação pró-impeachment, um assunto que estava meio adormecido desde o final do ano, e agora volta com novas tintas.
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