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quarta-feira, 2 de março de 2016

EXCLUSIVO SEGUE EM ANEXO O INQUÉRITO 3.983 NA ÍNTEGRA SÃO 79 PÁGINAS APARECE O NOME DO PRESIDENTE DAS ASSEMBLÉIA DE DEUS MADUREIRA SAMUEL CÁSSIO FERREIRA ONDE RECEBERAM 250 MIL REAIS STF 11 MINISTROS APENAS 6 VOTARAM A FAVOR AO VOTO DO RELATOR TEORI ZAVASCKI PARA A ABERTURA DO PROCESSO CRIMINAL CONTRA EDUARDO CUNHA




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renato santos
fonte de pesquisa
portal G1

Sabe aquele  ditado  que  diz " SE NÃO FAZ  TEM QUEM FAZ", funciona e  bem, desta vez  foi EDUARDO CUNHA presidente da CÂMARA  DOS DEPUTADOS. 



Mas  não  foi só  ele, sobrou  para FERNANDO COLLOR  DE MELLO, o  RODRIGO  JANOT  pretende  levar  os  dois  para  a cadeia.

Não adiante  falar que  é perseguição  contra as IGREJAS, O NOME DO PRESIDENTE  DAS ASSEMBLEIA  DE DEUS APARECE  NO INQUÉRITO DO MINISTÉRIO PÚBLICO E FOI DENUNCIADO  TAMBÉM .

INQUÉRITO 3.983 DISTRITO FEDERAL V O T O O SENHOR MINISTRO TEORI ZAVASCKI (RELATOR): 1. Cumpre inicialmente apontar algumas premissas básicas de ordem conceitual, comuns a todo e qualquer juízo de recebimento da denúncia. Trata-se de juízo com pressupostos e requisitos estabelecidos por disciplina normativa própria nos arts. 41 e 395 do Código de Processo Penal e, relativamente a ação penal de competência originária do Tribunal (Lei 8.038/1990, arts. 1º a 12), também no art. 397 do mesmo Código (HC 116653, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 18/02/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-072 DIVULG 10-04-2014 PUBLIC 11-04-2014). Nesse contexto, “não se há cogitar de inépcia da denúncia nem de atipicidade quando se descrevem suficientemente os fatos, com a indicação de data, local, modo de execução e capitulação jurídica dos crimes, não se exigindo, pela natureza do delito e, em especial, quando se trata de crimes praticados em concurso de pessoas, a descrição minuciosa de todos os atos efetivamente praticados pelos acusados.” (HC 126022 AgR-segundo, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, julgado em 30/06/2015, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-162 DIVULG 18-08- 2015 PUBLIC 19-08-2015) Enfatiza-se, a partir daí, que o denunciado se defende dos fatos imputados, não da classificação jurídica delineada pela acusação (Inq 3113, Relator(a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 02/12/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-025 DIVULG 05-02-2015 PUBLIC 06-02-2015). Sobressai, na verdade, o requisito de justa causa (art. 395, III), que exige “suporte probatório mínimo a indicar a legitimidade da imputação e se traduz na existência, no inquérito policial ou nas peças de informação que instruem a denúncia, de elementos sérios e idôneos que demonstrem a materialidade do crime e de indícios razoáveis de autoria” (Inq Em elaboração INQ 3983 / DF 3719, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, julgado em 12/08/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-213 DIVULG 29-10-2014 PUBLIC 30-10-2014). À luz dessas premissas é que se analisa a pretensão acusatória formulada, a começar pelas diversas preliminares suscitadas pelas defesas dos denunciados. 2. Não prospera a alegada nulidade do depoimento prestado pela denunciada Solange Pereira de Almeida perante o Ministério Público, ao argumento de que teria sido, quando ouvida, qualificada como testemunha e não como investigada, o que teria comprometido seu direito de não autoincriminação. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal afirma que “a garantia contra a autoincriminação se estende a qualquer indagação por autoridade pública de cuja resposta possa advir a imputação ao declarante da prática de crime, ainda que em procedimento e foro diversos” (HC 79244, Relator(a): Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, DJ 24/3/2000). Trata-se, portanto, de garantia que se estende às testemunhas, no tocante às indagações cujas respostas possam, de alguma forma, causar-lhes prejuízo. O direito à não autoincriminação “traduz direito público subjetivo assegurado a qualquer pessoa, que, na condição de testemunha, de indiciado ou de réu, deva prestar depoimento perante órgãos do Poder Legislativo, do Poder Executivo ou do Poder Judiciário” (HC 79812, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, DJ 16/2/2001). No caso dos autos, verifica-se que, embora a denunciada Solange Almeida tenha sido ouvida pelo Ministério Público Federal, em 2.6.2015, na condição de testemunha, assumindo o compromisso de dizer a verdade, consta do termo de depoimento que ela foi informada de que estavam ressalvadas daquele compromisso “as garantias constitucionais aplicáveis” (fl. 364). Esclareceu o Ministério Público sobre: “[...] a situação da ora denunciada SOLANGE ALMEIDA quando foi intimada para ser ouvida. Naquele momento, com os elementos então existentes, desenhava-se que a exparlamentar, embora tivesse participação nos fatos - pois foi a 2 Em elaboração INQ 3983 / DF autora formal dos requerimentos - poderia ser testemunha e não participe (ou seja, poderia ter sido apenas instrumento inconsciente da conduta de EDUARDO CUNHA para a formulação dos requerimentos propostos perante a Comissão da Câmara). […] Deve-se destacar que não se imputou a ela, ao longo daquela oitiva, qualquer conduta delitiva e tampouco foi tratada coma autora do delito. […] Porém, como a situação era dúbia, garantiu-se, sim, a ela o exercício de seus direitos constitucionais e não foi tratada como imputada em sentido lato ao longo da investigação. Tanto assim que, no termo de inquirição, embora tenha constado o compromisso de dizer a verdade, constou, também, a ressalva das garantias constitucionais. […] Esta cláusula (‘com ressalva das garantias constitucionais aplicáveis’) inclusive, foi esclarecida para a ex-parlamentar no ato do depoimento, assegurando-lhe que poderia ficar em silêncio sobre qualquer pergunta que, no entendimento da depoente, pudesse lhe incriminar” (fls. 2.375-2.377). Ademais, a denunciada foi ouvida novamente no curso deste inquérito em 18.8.2015, sobre os mesmos fatos, tendo sido expressamente alertada “sobre o direito de permanecer em silêncio” (fl. 470). Assim, é inegável que lhe foi conferido o direito de não responder a perguntas cujas respostas pudessem eventualmente acarretar sua autoincriminação. Por outro lado, não se pode afastar a realidade de que o conteúdo do depoimento impugnado foi utilizado, precipuamente, para contextualizar a narrativa apresentada pela acusação. Não há, no ponto, nulidade a ser reconhecida. 3. Tampouco merecem acolhimento as preliminares suscitadas pelo denunciado Eduardo Cunha, a começar pela pretensão de ver suspenso o processo, por aplicação analógica do art. 86, § 4º, da Constituição da República. Tal previsão constitucional se destina expressamente ao Chefe do Poder Executivo da União, não autorizando, por sua natureza 3 Em elaboração INQ 3983 / DF restritiva, qualquer interpretação que amplie sua incidência a outras autoridades, notadamente do Poder Legislativo. Conforme já assentou esta Corte, “a norma consubstanciada no art. 86, § 4º, da Constituição, reclama e impõe, em função de seu caráter excepcional, exegese estrita (…)” (Inq 672 QO, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, DJ 16/4/1993). Na mesma linha de compreensão, ao decidir pela inconstitucionalidade de normas da Constituição do Estado de São Paulo que reproduziam o conteúdo dos arts. 86, §§ 3º e 4º, da Carta Magna, o Plenário do Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que “as prerrogativas contempladas nesses preceitos da Lei Fundamental – por serem unicamente compatíveis com a condição institucional de Chefe de Estado – são apenas extensíveis ao Presidente da República” (ADI 1021, Relator(a): Min. ILMAR GALVÃO, Relator(a) p/ acórdão: Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, DJ 17/11/1995). É inaplicável ao denunciado, portanto, a imunidade penal temporária conferida pela Carta Magna ao Presidente da República. Dela somente se poderia cogitar se o denunciado viesse a, efetivamente, assumir o exercício do cargo. 4. Também não prospera o alegado cerceamento de defesa, em razão do arguido em agravos regimentais, por meio dos quais se buscava acessar o inteiro teor do acordo de colaboração premiada e respectivos termos de depoimento de Fernando Soares. Conforme já consignado nas decisões agravadas, o Procurador-Geral da República juntou aos autos todos os depoimentos de colaboradores que se referiam ao acusado e aos fatos referidos na denúncia. À época dos requerimentos, o conteúdo solicitado pelo denunciado encontrava-se submetido a sigilo (art. 7º da Lei 12.850/2013), regime que visa a dois objetivos essenciais: (a) preservar os direitos assegurados ao colaborador, dentre os quais o de “ter nome, qualificação, imagem e demais informações pessoais preservados” (art. 5º, II, da Lei 12.850/2013) e o de “não ter sua identidade revelada pelos meios de comunicação, nem ser fotografado ou filmado, sem sua prévia autorização por escrito” (art. 5º, V, da Lei 12.850/2013), bem como (b) “garantir o êxito das investigações” (arts. 7º, § 2º e 8º, § 3º, da Lei 12.850/2013). 4 Em elaboração INQ 3983 / DF É certo que o próprio art. 7º, § 2º, da Lei 12.850/2013 mitiga o sigilo do conteúdo de colaboração depois de instaurado o respectivo inquérito, para assegurar “ao defensor, no interesse do representado, amplo acesso aos elementos de prova que digam respeito ao exercício do direito de defesa, devidamente precedido de autorização judicial, ressalvados os referentes às diligências em andamento”. Além dessa ressalva final, é importante que a interpretação da norma leve em consideração o contexto e as circunstâncias de cada caso, mormente quando se tratar de investigação de grande complexidade, sobre um grande leque de fatos e com envolvimento de muitas pessoas. Sobre isso, em recente julgamento perante a Segunda Turma desta Corte, consignei em voto de relator o seguinte: “Ora, se os depoimentos dizem respeito a fatos ainda sob investigação, e sobretudo não abrangidos pela ação penal ou inquérito já instaurados, podem e devem, salvo decisão judicial em contrário, permanecer em sigilo. O recebimento da denúncia em demanda que não guarda relação com aqueles termos de colaboração sigilosos, por óbvio, não lhes franqueia acesso automaticamente. Do contrário, uma colaboração que contemplasse inúmeros fatos delituosos impediria o dominus litis de denunciar algum deles até que se concluísse a investigação sobre todos, sob pena de ver de pronto revelada a integralidade da colaboração ao rol dos primeiros denunciados, o que prejudicaria sigilo muitas vezes imprescindível à apuração dos demais delitos revelados na colaboração. O que não se coloca em dúvida, repita-se, é o direito do acusado, por sua defesa, de ter acesso aos elementos que embasaram a denúncia ou constantes nos autos em que a denúncia foi formulada.”(Rcl 22009, Relator(a): Min. TEORI ZAVASCKI, julgado em 16/02/2015, pendente de publicação) No caso, os depoimentos prestados pelos colaboradores dizem respeito a inúmeros fatos, envolvendo diferentes pessoas e, 5 Em elaboração INQ 3983 / DF possivelmente, diferentes organizações criminosas, tendo sido prestados em ocasiões diferentes, em termos de declaração separados, dando origem a diferentes procedimentos investigatórios, em diferentes estágios de diligências. A instauração de inquérito específico, assim, dará ao defensor acesso aos termos de colaboração pertinentes aos fatos pelos quais é investigado o representado, como efetivamente ocorreu. É evidente que eventual sonegação de elemento relevante pode vir a configurar restrição ao exercício de defesa. Entretanto, mesmo essa possibilidade hipotética, abstratamente considerada, não se prestaria a invalidar o instituto da colaboração premiada, tal como disciplinado na legislação nacional. Como já decidido nesta Corte, “o direito assegurado ao indiciado (bem como ao seu defensor) de acesso aos elementos constantes em procedimento investigatório que lhe digam respeito e que já se encontrem documentados nos autos, não abrange, por óbvio, as informações concernentes à decretação e à realização das diligências investigatórias, mormente as que digam respeito a terceiros eventualmente envolvidos” (HC 94387 ED, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, DJe de 21/5/2010). O caso dos autos é exemplo claro do que se afirmou. A acusação juntou aos autos todos os termos de depoimento referentes aos fatos narrados na denúncia, franqueando à defesa, a tempo e modo, seu imprescindível exercício – que depois, aliás, acabaria renovado. Posteriormente, em decorrência de decisão proferida em dezembro de 2015, foi revogado o regime de sigilo ao qual até então se encontrava submetido o acordo de colaboração premiada de Fernando Soares, ressalvados os termos de números 5, 5-A e 17, que contemplam diligências sigilosas ainda em andamento e que dizem respeito a fatos narrados absolutamente estranhos aos da presente denúncia. Desse modo, não se sustenta a preliminar, o que importa prejuízo ao exame dos agravos regimentais interpostos. 5. Da mesma forma, improcede a alegação de nulidade dos depoimentos complementares prestados pelo colaborador Júlio Camargo, em razão da ausência de nova homologação ou ratificação de seu acordo 6 Em elaboração INQ 3983 / DF de colaboração premiada pelo Supremo Tribunal Federal. Não se pode confundir o acordo de colaboração premiada (que está sujeito a homologação), com os termos de depoimentos prestados pelo colaborador (que, a toda evidência, independem de homologação judicial). No caso, o acordo de colaboração premiada firmado entre o Ministério Público Federal e Júlio Camargo foi devidamente homologado pelo juízo da 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba, nos termos da Lei 12.850/2013. À época, pelas declarações até então prestadas pelo colaborador, não havia notícia de envolvimento de autoridade com prerrogativa de foro no STF, razão pela qual era inquestionável a competência daquele juízo para a prática do ato homologatório. Ora, a Lei 12.850/2013 dispõe que, uma vez firmado o acordo de colaboração premiada, o colaborador poderá ser ouvido “pelo membro do Ministério Público ou pelo delegado de polícia responsável pelas investigações” (art. 4º, § 9º) e “em juízo a requerimento das partes ou por iniciativa da autoridade judicial” (art. 4º, § 12). E foi nessas circunstâncias - ou seja, em depoimento judicial prestado posteriormente à homologação do acordo, conforme reconhece o acusado -, que o colaborador revelou fatos envolvendo o Deputado Federal Eduardo Cunha, o que ensejou a tomada de novos depoimentos no curso deste inquérito, pois estavam diretamente relacionados ao conteúdo da denúncia aqui em exame. Registre-se, a propósito, a seguinte passagem da manifestação do Ministério Público: “Destaque-se que, na época, não havia elementos que pudessem comprovar que JÚLIO CAMARGO estivesse omitindo, por medo (como ulteriormente revelado expressamente por ele), o nome de EDUARDO CUNHA. Portanto, o motivo da incompetência não era contemporâneo à decisão judicial que foi prolatada. Enquanto a homologação do acordo ocorreu em outubro de 2014, o colaborador somente noticiou a participação de EDUARDO CUNHA em julho de 2015”. Anote-se, por fim, que essa mesma alegação já foi enfrentada e 7 Em elaboração INQ 3983 / DF afastada, no caso concreto, pelo Plenário do STF na Reclamação n. 21419- AgR, de minha relatoria, DJe de 5/11/2015, ajuizada pelo próprio denunciado. E se tudo isso não bastasse para demonstrar a improcedência da preliminar, cumpriria registrar que o Pleno desta Corte assentou a orientação de que, “por se tratar de negócio jurídico personalíssimo, o acordo de colaboração premiada não pode ser impugnado por coautores ou partícipes do colaborador na organização criminosa e nas infrações penais por ela praticadas, ainda que venham a ser expressamente nominados no respectivo instrumento no relato da colaboração e seus possíveis resultados (art. 6º, I, da Lei n. 12.850/13)” (HC 127483, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, DJe de 4/2/2016). Assim, ao contrário do que parece acreditar a defesa, a eventual desconstituição de acordo de colaboração tem âmbito de eficácia restrito às partes que o firmaram, não beneficiando e nem prejudicando terceiros. Mesmo em caso de retratação, o material probatório colhido em colaboração premiada pode ainda assim ser utilizado, naturalmente cercado de todas as cautelas, em face de terceiros, aos quais caberá, se for o caso, deduzir as razões de defesa nos procedimentos ou ações que em face a elas venham a ser promovidos. É o que decorre de texto normativo expresso, no § 10 do art. 4º da Lei 12.850 (“§ 10. As partes podem retratar-se da proposta, caso em que as provas autoincriminatórias produzidas pelo colaborador não poderão ser utilizadas exclusivamente em seu desfavor”). De qualquer modo, não é demais recordar que o conteúdo dos depoimentos colhidos em colaboração premiada não é por si só meio de prova, até porque descabe condenação lastreada exclusivamente na delação de corréu (HC 94034, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 10/06/2008, DJe de 5/9/2008). A Lei 12.850/2013 é também expressa nesse sentido (art. 4º, § 16): “Nenhuma sentença condenatória será proferida com fundamento apenas nas declarações de agente colaborador”. Ademais, conforme destaca a Procuradoria-Geral da República em sua manifestação, “não há que se falar em ausência de voluntariedade ou de espontaneidade, seja no ato de colaboração ou, muito menos, na nova revelação 8 Em elaboração INQ 3983 / DF dos fatos ilícitos praticados por EDUARDO CUNHA”, uma vez que “foi JÚLIO CAMARGO quem procurou o Ministério Público, no final de 2014, para formalizar o acordo” (fl. 2.428). E acrescenta: “o fato de a mídia ter noticiado que o Procurador-Geral da República estaria suspeitando da omissão de JÚLIO CAMARGO tampouco caracteriza a alegada coação” (fl. 2.428). Sobre essa específica questão, consta dos autos que, num primeiro momento, a versão apresentada por Júlio Camargo era dissonante do depoimento de Alberto Youssef e de outros elementos indiciários colhidos até então, especialmente depois que se teria descoberto a verdadeira autoria dos requerimentos apresentados pela então Deputada Solange Almeida à Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados – atribuída a Eduardo Cunha –, circunstância que chamou a atenção dos membros do Ministério Público Federal, que suspeitaram de suposta omissão por parte de Júlio Camargo sobre fatos que pudessem comprometer o Deputado Eduardo Cunha. Com base nessa desconfiança, “cogitou-se da rescisão do acordo de JÚLIO CAMARGO, pois havia cláusula contratual expressa que previa tal consequência, caso se constasse omissões. Porém referida rescisão não chegou a ser efetivada, pois, no dia 10 de junho de 2015 (Termo de Declarações Complementar n. 02), o colaborador, de forma novamente espontânea e voluntária, retratou-se e confirmou a participação de EDUARDO CUNHA nos fatos, perante integrantes do Grupo de Trabalho instituído pelo Procurador-Geral da República” (fl. 2.441). Posteriormente, em 30.7.2015, o referido colaborador prestou novo depoimento, agora em juízo, perante a 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba, ocasião em que confirmou as declarações anteriormente prestadas, alusivas à suposta participação de Eduardo Cunha nos fatos investigados, explicando que essa nova versão deu-se de forma espontânea, isenta de qualquer pressão ou coação. Veja-se as seguintes passagens do depoimento (fls. 756-757): “Defesa:- Dentro desse contexto que o senhor passou hoje aqui, primeiro, o senhor foi coagido em algum momento pra fazer a colaboração processual por alguém? Interrogado:- Não senhor, já inclusive fui perguntado 9 Em elaboração INQ 3983 / DF aqui... Defesa:- Ela é espontânea? Interrogado:- Ela é espontânea, aliás, acho que a minha foi, a minha, a do Augusto, depois do doutor Paulo Roberto e Youssef... Defesa:- Só se limitando só pelo senhor. Interrogado:- Sim, pois não. […] Defesa:- Esses fatos que o senhor está contando hoje ao doutor Sérgio, o senhor entregou documentos ao Ministério Público Federal que comprovem a sua, a veracidade dos mesmos? Interrogado:- Perfeitamente. Defesa:- O senhor auxiliou em diligência que possam justificar essa ligação que o senhor está fazendo hoje? Interrogado:- Sim senhor. Defesa:- Ou seja, qual foi então na sua, objetivamente, quem foi o beneficiário de toda essa transação, o beneficiário final, que ficou com o dinheiro final dessa transação com os navios-sonda? Interrogado:- Bom, eu acho que o Fernando foi um beneficiário como meu parceiro, da mesma maneira como eu ganhei ele ganhou também, eu não sabia que ele tinha sócio oculto que era o deputado Eduardo Cunha e que também ganhou. Defesa:- O senhor chegou a estar na dependência do Congresso alguma vez para tratar desse assunto? Interrogado:- Nunca. Defesa:- Nunca foi dentro do Congresso? Interrogado:- Nunca. Defesa:- Quem lhe mostrou a primeira vez o requerimento? Interrogado:- Foi o, foi o diretor da Mitsui no Rio de Janeiro. Defesa:- Ou seja, o primeiro depoimento do senhor Alberto Youssef então estava correto, realmente o senhor disse a 10 Em elaboração INQ 3983 / DF ele, ou desabafou com ele... Interrogado:- Estava correto. Defesa:- Que estava sendo pressionado, coagido. Segundo, hoje o senhor se sente à vontade para prestar esse depoimento, o senhor gostaria de ter alguma segurança? Interrogado:- Não senhor, me sinto à vontade. Defesa:- Não se sente pressionado por ninguém, ninguém lhe pressionou? Interrogado:- Não. [...]” Como se percebe, não há evidências de que o depoente colaborador tenha sido pressionado ou coagido a mudar de versão, seja no âmbito do órgão acusador, seja em juízo. 6. Relativamente às suscitadas divergências entre os termos de depoimento e as respectivas gravações, que revelariam indução de respostas por parte do Ministério Público, lembra-se que o § 13 do art. 4º da Lei 12.850/2013 traz comando no sentido de que, “sempre que possível, o registro dos atos de colaboração será feito pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinados a obter maior fidelidade das informações”. Não há, portanto, uma indispensabilidade legal absoluta que os depoimentos sejam registrados em meio magnético ou similar, mas uma recomendação de que esses mecanismos sejam utilizados para assegurar “maior fidelidade das informações”. Estabelece, portanto, meios auxiliares de registro ao documento escrito que é usualmente produzido, o qual, de resto, é lido e assinado por todos os presentes ao ato. Preservado o conteúdo das informações prestadas pelo colaborador, eventuais divergências de literalidade entre o documento escrito e a gravação, quando realizada, obviamente não implicará, automaticamente, nulidade do ato processual. No caso, entretanto, as inconsistências apontadas pela defesa não são suficientes a revelar discrepância entre o conteúdo escrito e as gravações produzidas em mídia eletrônica. Um fato dito com outras palavras não representa fato diverso. Nesse sentido, são relevantes os argumentos da 11 Em elaboração INQ 3983 / DF parte contrária (fl. 2.449): “[...] o colaborador e seu advogado estavam presentes e assinaram o termo escrito, oportunidade em que poderiam ter apontado eventuais divergências que lhes parecessem relevantes, o que não ocorreu. Se o termo escrito fosse uma montagem ou manipulação, como parece fazer crer a defesa, certamente nenhum advogado aceitaria assiná-lo, assim como o próprio colaborador, em razão das consequências que sofreria, inclusive criminais, como a prática do crime previsto no art. 19 da Lei 12.850”. Ressalte-se, de qualquer modo, que, conforme já anotado, o conteúdo da colaboração constitui apenas meio de obtenção de prova, que deverá ser desdobrado em outros elementos produzidos durante a instrução criminal, quando terá a defesa oportunidade de insurgir-se contra eventuais inconsistências existentes na versão escrita, inclusive solicitando ao colaborador, em juízo, que esclareça determinado ponto obscuro. Nem mesmo se pode afirmar tenha havido indução de respostas por parte dos membros do Ministério Público, que, como se constata pela leitura dos trechos indicados pela defesa, mantiveram-se equidistantes da fonte de prova que na ocasião era produzida, tudo, aliás, acompanhado pelos advogados da parte interessada e dos próprios depoentes colaboradores, que também, registre-se, em momento algum insurgiramse contra perguntas indutivas ou afirmativas sobre algum fato ainda não revelado. A esse propósito, procede a manifestação da acusação (fls. 2.451-2.455): “De início, o Termo de Declarações Complementar n. 01 de JÚLIO CAMARGO (tomado em 19.3.2015) - em que o denunciado invoca diversas e supostas induções - não foi utilizado em face do colaborador na denúncia ofertada. Até mesmo porque, no referido termo, o colaborador manteve sua versão de omissão da conduta de EDUARDO CUNHA, sendo 12 Em elaboração INQ 3983 / DF sua versão apenas alterada no Termo de Dec1arações Complementar n. 02 de JÚLIO CAMARGO (colhido em 10.6.2015). De qualquer sorte, relembre-se que os colaboradores estavam, sempre, acompanhados de seus advogados, que zelavam pela espontaneidade das dec1arações de seus clientes. Repita-se: não se pode crer que o advogado de um colaborador iria admitir que seu cliente fosse induzido a dizer algo que não sabia ou que permitiram que os membros do Ministério Público colocassem ‘palavras na boca’ do colaborador. […] (...) E muito menos a indução se confunde com o processo de busca da verdade. Verificando que o colaborador estava omitindo, o que se buscou foi apenas confrontá-lo com os elementos já produzidos em sentido contrário, para demonstrar que a sua versão pudesse estar implausível. Isto, além de perfeitamente admissível, e recomendável, até mesmo para que se saiba, realmente, que o colaborador está dizendo a verdade. […] Não bastasse, a versão apresentada pelo colaborador JÚLIO CAMARGO se mostrou, posteriormente, em perfeita consonância com o depoimento prestado pelo colaborador FERNANDO SOARES e por diversos outros elementos de corroboração. Assim como nos demais trechos que supostamente desacreditariam os termos de declaração dos colaboradores, a defesa cinge-se em buscar a contaminação da essência dos depoimentos exclusivamente por pequenas divergências circunstanciais constantes do termo de depoimento, que, conforme dito, são naturais. De qualquer forma, o que vale é o que ficou registrado em vídeo, conforme visto acima. Por fim, também conforme visto, terá a defesa, de qualquer forma, o direito de confrontar os colaboradores em Juízo no momento adequado. Tais alegações em hipótese alguma são suficientes para levar à rejeição da denúncia ou para desacreditar os diversos 13 Em elaboração INQ 3983 / DF elementos de prova existentes”. Raciocínio análogo se aplica à ausência de registros audiovisuais do Termo de Declarações Complementar n. 3 e do Termo de Acareação: “Tanto no Termo Complementar de n. 3 de JÚLIO CAMARGO quanto na acareação entre JÚLIO CAMARGO e PAULO ROBERTO COSTA não houve a gravação audiovisual apenas pela falta momentânea de disponibilidade de equipamentos no dia. Destaque-se que ambos atos foram realizados no Rio de Janeiro, para onde se deslocaram os membros do Grupo de Trabalho por designação do PGR. Assim, não se tratava do local onde habitualmente eram realizados as oitivas. Tanto no local em que ocorreu a oitiva quanto no qual foi feita a acareação não havia disponibilidade de equipamentos que permitissem a sua gravação naquele dia. Ademais, pelo seu teor, verifica-se que tanto o Termo de declarações complementar n. 03 quanto a acareação tratavam de fatos pontuais. O termo de declarações n. 03 apenas confirmava documentos já apresentados pelo colaborador. A acareação, por sua vez, visava apurar uma contradição em um aspecto, embora relevante, pontual. Não bastasse, se, na linha defensiva, o intuito fosse prejudicar a defesa, o Termo de Declarações Complementar n. 2, do dia 10 de junho de 2015 - certamente o mais importante - não teria sido gravado. Por fim, conforme decidiu o Ministro Teori Zavascki, acerca do pedido de EDUARDO CUNHA, o registro audiovisual ‘não é uma providência ou formalidade essencial à validade do ato, segundo decorre da Lei 12.850/2013 (art. 4º, § 13)’” (fl. 2159). 7. No tocante a supostos atos de investigação voltados a fatos já imputados na denúncia e no aditamento, conquanto estivesse já em curso prazo para defesa preliminar, melhor sorte não assiste à defesa. É que, como afirmado pela acusação, a busca e apreensão questionada foi deferida nos autos da AC 4.044 e não visava especificamente a coletar 14 Em elaboração INQ 3983 / DF elementos referentes a fatos circunscritos a este inquérito, mas sim a muitos outros, como se pode facilmente perceber de transcrição do pedido naqueles autos: “4. PRESSÃO AO GRUPO SCHAHIN Há, ainda, outro contexto que demonstra a utilização de requerimentos perante o Congresso para fins ilícitos. EDUARDO CUNHA se valeu de sua função para pressionar o Grupo SCHAHIN, em um contexto de disputa que este grupo possuía com LÚCIO BOLONHA FUNARO. […] LÚCIO BOLONHA FUNARO era o representante de fato da empresa CEBEL - CENTRAIS ELÉTRICAS BELEM S/A, empresa responsável pela Pequena Central Hidroelétrica (PCH) de APERTADINHO, em Rondônia. […]. Com o objetivo de construir a PCH de APERTADINHO, a CEBEL contratou os serviços da SCHAHIN ENGENHARIA. Porém, a Usina se rompeu em 9 de janeiro de 2008, conforme amplamente veiculado na mídia. Após o rompimento, surgiu uma divergência entre FUNARO e o consórcio construtor VILHENA (formado pela CONSTRUTORA SCHAHIN ENGENHARIA e pela EMPRESA INDUSTRIAL TÉCNICA - EIT), sobre a responsabilidade pela não renovação da apólice de seguro-garantia da obra e, via de consequência, pelas danos causados. […] Seguindo o mesmo enredo já descrito, imediatamente após a disputa entre FUNARO e SCHAHIN surgem dezenas de requerimentos no Congresso Nacional, patrocinados por EDUARDO CUNHA e seus correligionários, a pedido de LÚCIO BOLONHA FUNARO, com o intuito inequívoco realizar um ataque claro e sistemático às empresas do Grupo SCHAHIN. […] A maioria dos requerimentos acima indicados partiram de cinco parlamentares ligados a EDUARDO CUNHA: JOÃO 15 Em elaboração INQ 3983 / DF MAGALHÃES e CARLOS WILLIAN, então do PMDB mineiro, ALTINEU CORTÊS - do PR do RJ - indicado por EDUARDO CUNHA para uma sub-relatoria da CPI da PETROBRAS, ALEXANDRE SANTOS, NELSON BORNIER e SOLANGE ALMEIDA, os três do PMDB do RJ. […] Ouvido formalmente sobre esses fatos, o empresário MILTON TAUFIC SCHAIN declarou que já foi ameaçado de morte por LUCIO BOLONHA FUNARO diversas vezes em razão da disputa envolvendo a PCH de APERTADINHO. Afirmou, inclusive, que FUNARO estava por trás do furto de documentos na empresa, tendo cooptado um ex-advogado do grupo SCHAHIN e que o referido inquérito teria sumido. Ademais, o empresário destacou também a pressão que vem sofrendo por parte de parlamentares ligados a EDUARDO CUNHA que, em tese, não teriam qualquer interesse republicano em se envolver na disputa entre FUNARO e o grupo SCHAHIN. […] Assim, entre fevereiro de 2008 até a presente data há mais de trinta requerimentos em face do Grupo SCHAHIN, todos capitaneados por EDUARDO CUNHA a pedido de LÚCIO BOLONHA FUNARO. Diante de tais elementos, fica evidente que EDUARDO CUNHA auxiliou LÚCIO BOLONHA FUNARO na atuação ilícita em face do Grupo SCHAHIN. 5. A UTILIZAÇÃO DA CPI DA PETROBRAS PARA FINS ILÍCITOS. Também a CPI DA PETROBRAS foi utilizada por EDUARDO CUNHA para fins ilícitos. MILTON SCHAHIN narrou que a CPI DA PETROBRAS foi utilizada para pressionar e constranger o grupo e, ainda, que LÚCIO BOLONHA FUNARO, na data da instauração da referida Comissão Parlamentar, já afirmou que os SCHAHIN seriam convocados: […] 16 Em elaboração INQ 3983 / DF Ainda quanto à função fiscalizadora do Poder Legislativo, em outros dois episódios semelhantes, EDUARDO CUNHA se valeu de seus aliados para constranger e intimidar desafetos no âmbito da CPI da PETROBRAS. Em ambos os casos, EDUARDO CUNHA se valeu do então Deputado e hoje Ministro CELSO PANSERA (PMDB/RJ) para suas práticas ilícitas. […] No primeiro episódio mencionado, envolvendo o Ministro CELSO PANSERA, a citada Comissão Parlamentar de Inquérito, por meio de votação simbólica e no meio de outros 80 requerimentos, aprovou a convocação para depoimento de BEATRIZ CATTA PRETA, que foi advogada dos colaboradores PAULO ROBERTO COSTA, PEDRO BARUSCO, AUGUSTO MENDONÇA e JULIO CAMARGO. […] Porém, destaque-se que não havia indício de prática de lavagem de dinheiro por parte da referida causídica e que nenhum outro advogado dos centenas de acusados da operação Lava Jato foi convocado para justificar a origem de seus valores. A aprovação ocorreu em poucos minutos, sem discussão, e ocorreu, curiosamente, após ocorrer o depoimento de JULIO CAMARGO, então cliente de BEATRIZ CATTA PRETA, prestado à Procuradoria Geral da República, em 10 de junho de 2015, em que o colaborador afirmou que EDUARDO CUNHA recebeu parte da propina relacionada ao navios-sondas vendidos pela SANSUNG à PETROBRAS. Embora o depoimento tenha sido mantido em sigilo, EDUARDO CUNHA já tinha consciência, na data do requerimento, de que JÚLIO CAMARGO havia modificado sua versão inicial e o incriminado. […] o Ministério Público ouviu BEATRIZ CATTA PRETA, oportunidade em que narrou como tomou conhecimento de sua convocação à CPI da Petrobras: […]. Na sequência a advogada relatou que se sentiu intimidada e ameaçada com a convocação e que a vislumbrou no ato uma tentativa de constrangê-la no 17 Em elaboração INQ 3983 / DF exercício profissional da advocacia e que o ato da CPI da Petrobras representa uma retaliação em razão de sua atuação nas Colaborações Premiadas: […] Além da convocação da referida advogada, houve um segundo episódio envolvendo o Ministro CELSO PANSERA. Ele foi o responsável por elaborar requerimentos de afastamento dos sigilos bancários, fiscal e telefônico das duas filhas, da esposa e da irmã de ALBERTO YOUSSEF. Destaquese que não há nenhum indício, no bojo da Operação Lava Jato, que envolva os parentes de ALBERTO YOUSSEF sobre tais fatos. Analisando os registros da Câmara dos Deputados, verifica-se que o referido deputado elaborou doze requerimentos perante a CPI DA PETROBRAS, buscando convocar e afastar o sigilo bancário e fiscal, telefônico e telemático dos familiares de YOUSSEF. […]. Ao ser interrogado no bojo dos autos 2014.4.04.7000/PR, ALBERTO YOUSSEF afirmou, em 16 de julho de 2015, que estava sofrendo intimidações em face de seus familiares pela CPI da PETROBRAS, por pessoas ligadas a EDUARDO CUNHA. […] Assim, CELSO PANSERA, esquecendo-se dos verdadeiros e legítimos escopos de uma Comissão Parlamentar de Inquérito, valeu-se do seu cargo para aprovar requerimentos que indiretamente atingiam justamente duas pessoas que incriminavam EDUARDO CUNHA: BEATRIZ CATTA PRETA em razão da atuação desta como advogada de JÚLIO CAMARGO- e de ALBERTO YOUSSEF. E o fez sem que existissem quaisquer indícios em face seja da causídica ou mesmo dos familiares de ALBERTO YOUSSEF, demonstrando o nítido fim espúrio. Ainda dentro do contexto do desvio de finalidade da CPI da PETROBRAS, soma-se a contratação da empresa KROLL, paga com verba pública - aproximadamente R$ 1,18 milhões -, 18 Em elaboração INQ 3983 / DF com o intuito de supostamente investigar ativos de investigados no exterior. Na prática, o que se apurou é que a maioria dos investigados pela KROLL eram colaboradores da Justiça. Nenhum parlamentar ou empresário de destaque constou do escopo da KROLL. […] 6. O DESVIO DE FINALIDADE NA ATIVIDADE LEGISLATIVA DO DEPUTADO EDUARDO CUNHA [...] Não bastasse isso, também existem fortes indícios (todos também concatenados entre si) demonstrando que EDUARDO CUNHA também foi o responsável por alterar a legislação energética, para beneficiar seus interesses e de LÚCIO BOLONHA FUNARO no setor. Foi referido Deputado o relator das Medidas Provisórias n. 396/2007 e 450/2008. Tais alterações favoreceram a empresa SERRA DA CARIOCA II, em contexto envolvendo FURNAS. […] 7. DESVIO DE FINALIDADE EM FAVOR DE ANDREIA LÉGORA E DO TRIBUNAL MARÍTIMO Impende destacar outra atuação ilegítima de EDUARDO CUNHA, na condição de parlamentar, agora em favor de ANDRÉIA LEGORA MACHADO DAVID, pessoa bastante próxima a ele. […] O marido de ANDREIA, MARCELO DAVID GONÇALVES, é juiz do Tribunal Marítimo. ANDREIA, por sua vez, foi sócia do escritório MULTIPLUS CONSULTORIA EMPRESARIAL LTDA, entre 2007 e 2012. O sócio administrador desta empresa MULTIPLUS é FLÁVIO DE FREITAS INFANTE VIEIRA. Da mesma forma, ANDREIA foi sócia da INTERCLEAN SOLUÇÕES AMBIENTAIS, tendo adentrado em 15/9/2013. FLÁVIO DE FREITAS INFANTE 19 Em elaboração INQ 3983 / DF VIEIRA também era sócio da referida empresa, conforme pesquisas do Radar/PGR. […] EDUARDO CUNHA atuou em diversos feitos em favor do Tribunal Marítimo. Apresentou proposta para alterar o Projeto de Lei 1.572, que instituiu o Código Comercial, para favorecer as decisões do Tribunal Marítimo. Ademais, incluiu uma proposta com o fim de incluir um novo Livro, no mesmo projeto que institui o Código Comercial, relativo ao Direito Marítimo, com 262 artigos. Apresentou, ainda, Medida provisória 479/2009, com o intuito de recuperar a dignidade salarial dos Juízes do Tribunal Marítimo, visando estabelecer vencimentos equivalentes aos atribuídos aos Juízes de Direito do Distrito Federal. Reforçando a relação próxima entre MARCELO DAVID GONÇALVES e EDUARDO CUNHA, vale registrar que o Deputado apresentou requerimento para incluir no plano de trabalho da Comissão Especial destinada a proferir parecer ao PL 1572, de 2011, o próprio Juiz Marítimo MARCELO DAVID GONÇALVES. EDUARDO CUNHA ainda apresentou emenda ao Projeto de Novo Código de Processo Civil (Projeto de Lei 8046, de 2010 do Senado Federal), buscando equiparar as decisões do Tribunal Marítimo a um título executivo judicial. Referido dispositivo, porém, foi vetado pela Presidente da República. 8. ATUAÇÃO PARLAMENTAR EM FAVOR DE EMPREITEIRAS, EM ESPECIAL DA OAS, EM TROCA DE VANTAGENS INDEVIDAS SOB O DISFARCE DE DOAÇÕES ELEITORAIS. Não bastassem os elementos já apurados, as investigações indicam que EDUARDO CUNHA atua como um verdadeiro longa manus dos interesses das empreiteiras no Congresso Nacional, em especial da construtora OAS. O Deputado não apenas informava e acompanhava os projetos de interesse das empreiteiras, mas apresentava, por si 20 Em elaboração INQ 3983 / DF ou por meio de seus aliados, projetos e emendas, em especial a Medidas Provisórias - os conhecidos jabutis - que beneficiavam nitidamente as construtoras, muitas vezes em detrimento do interesse público. Em contraprestação, EDUARDO CUNHA recebia vantagens indevidas, para si e para outrem, em forma de doações eleitorais. Esta relação espúria ficou nítida a partir da análise do celular apreendido com JOSÉ ADELMÁRIO PINHEIRO FILHO, também conhecido por LEO PINHEIRO, da OAS, em que são verificados diversos contatos entre ele e EDUARDO CUNHA. […] Há centenas de mensagens entre LEO PINHEIRO e EDUARDO CUNHA. Em diversas delas ainda não se logrou compreender completamente o esquema ilícito. Mas em algumas delas já é possível identificar a prática de diversos atos por EDUARDO CUNHA, valendo-se de seu cargo, em especial atos legislativos, como emendas a Medidas Provisórias e projetos de lei, que atendem interesses da empreiteira. Em contraprestação, há solicitação e o recebimento de vantagens indevidas, dentre outras, mediante supostas doações eleitorais. […] Em contraprestação aos diversos serviços prestados por EDUARDO CUNHA, houve o pagamento de vantagens indevidas milionárias para o EDUARDO CUNHA ou para pessoas a ele ligadas, a título de doações de campanha. Nos contatos entre EDUARDO CUNHA e LEO PINHEIRO há frequente cobrança de valores por parte do parlamentar, em especial doações de campanha, não apenas para ele, mas também para outros correligionários. Verifica-se, pelas mensagens, que há doações regulares e ordinárias chamadas de rotineiras e outras extraordinárias. […] Em outra mensagem, EDUARDO CUNHA pediu doação para HENRIQUE - provavelmente, HENRIQUE EDUARDO ALVES - e solicitou que a doação fosse feita no Comitê Estadual 21 Em elaboração INQ 3983 / DF do PMDB: […] Nas trocas de mensagens é possível, ainda, verificar diversas outras menções a HENRIQUE ALVES, seja em reuniões na casa deste ou, ainda, para tratar de temas de interesse da OAS. […] Não bastasse os graves fatos até aqui narrados, apurou-se também pelas mensagens encontradas no celular de LEO PINHEIRO que há algum esquema ilícito envolvendo a compra de debêntures por entes públicos. Pelo que se pode inferir das mensagens, há a aquisição de debêntures emitidas pelas empresas, que são adquiridas ou por Bancos - Caixa Econômica Federal, por meio do FI FGTS, ou BNDES - ou por Fundos de Pensão onde há ingerência política. Tudo mediante pagamento de vantagem indevida aos responsáveis pelas indicações políticas, inclusive mediante doações oficiais. […] Em outro diálogo, datado de 9 de novembro de 2012, EDUARDO CUNHA e LEO PINHEIRO trataram de debênture da Caixa Econômica Federal, no valor de R$ 250 milhões. CUNHA afirmou que a debênture foi liberada e que deve ter sido depositada na conta vinculada: […] Em março de 2013, LEO PINHEIRO enviou mensagem para ALEXANDRE TOURINHO - então Diretor Financeiro da OAS questionando se já recebera a debênture de R$250.000.000,00, pois EDUARDO CUNHA estava cobrando LEO PINHEIRO - certamente referindo-se a um percentual pela aprovação do título: […] Nas demonstrações financeiras do FI FGTS do ano de 2014, apurou-se que houve a emissão de debêntures no valor de R$ 250 milhões para a OAS S.A, com data de emissão de 23/1/2012 e vencimento em 8/1/2015.
INQ 3983 / DF Ao final, da análise de mensagens entre EDUARDO CUNHA e LEO PINHEIRO, pode-se verificar a ocorrência de: 94 pedidos em dias diferentes para encontro, ligação ou contato; 18 comunicações em dias diferentes que indicam que um dos interlocutores estava ou estaria logo em um determinado local para um encontro iminente; 35 pedidos/solicitações/cobranças/agradecimentos em dias diferentes de EDUARDO CUNHA para LEO PINHEIRO; e 30 pedidos/solicitações/cobranças/agradecimentos em dias diferentes de LEO PINHEIRO para EDUARDO CUNHA. 9. DA LAVAGEM DE DINHEIRO POR INTERMÉDIO DE LÚCIO BOLONHA FUNARO Pelo que se viu até agora, são muitos os elementos que apontam o recebimento de vantagens indevidas milionárias por parte de EDUARDO CUNHA em razão de sua atuação perante o Congresso Nacional. Os elementos indicam, ainda, que um dos operadores dos valores recebidos ilicitamente por EDUARDO CUNHA é justamente LÚCIO BOLONHA FUNARO. A proximidade entre EDUARDO CUNHA e FUNARO é antiga e muito mais do que afirmam publicamente. Embora digam que apenas se conhecem, verificou-se um estreito e pernicioso relacionamento entre ambos. […] Recentemente a empresa AUTOMIAMI apresentou informações que comprovam que FUNARO pagou veículos de EDUARDO CUNHA […]. Tais elementos demonstram que LÚCIO BOLONHA FUNARO. direta ou indiretamente, pagou veículos no valor de R$ 180.000,00 em favor da empresa de EDUARDO CUNHA, a C3. […] Da mesma forma, o relatório da CVM no PAS 006/2012 comprova a relação entre EDUARDO CUNHA e LÚCIO BOLONHA FUNARO, apontando que ambos foram diretamente beneficiados no esquema de fraudes envolvendo o 23 Em elaboração INQ 3983 / DF Fundo de Pensão da PRECE entre 2003 e 2006. Os lucros obtidos fraudulentamente por EDUARDO CUNHA foram por meio de empresas e pessoas ligadas diretamente a LÚCIO BOLONHA FUNARO. […] Em outras palavras, todos os prejuízos ficavam para os Fundos e todos os lucros para determinados clientes das corretoras, dentre eles EDUARDO CUNHA, LÚCIO BOLONHA FUNARO e diversos outros personagens ligados a este último. Não por coincidência, os clientes das intermediárias paravam de operar ou não mais obtinham ajustes do dia positivos constantes quando os fundos deixava de atuar por determinada corretora ou distribuidora. […] Não bastassem todos estes elementos, verificou-se que FUNARO foi beneficiado com parte dos valores de propina referente à PETROBRAS. […]. Conforme aditamento à denúncia apresentada a este Egrégio STF, em vista novos elementos obtidos, apurou-se que os pagamentos para EDUARDO CUNHA, referentes às Sondas VITÓRIA 10000 e PETROBRAS 10000, se deram, além das formas já descritas na denúncia, até o ano de 2014 e, ainda, por afretamentos de táxi aéreo. […] JULIO CAMARGO comprometeu-se a pagar a EDUARDO CUNHA em horas de voo, por meio do afretamento de táxi aéreo para este ou para pessoas por ele indicadas. Assim, JULIO CAMARGO autorizou a que a empresa Global Táxi Aéreo faturasse quaisquer voos solicitados por EDUARDO CUNHA no valor de até R$ 300 mil para pagamento por meio da empresa Piemonte Empreendimentos Ltda., de propriedade de JULIO CAMARGO. […] Veja-se que, além do próprio EDUARDO CUNHA, pessoas próximas a ele, como LUCIO BOLONHA FUNARO e ALTAIR ALVES PINTO, utilizaram as aeronaves. A pessoa de RAQUEL ALBEJANTE PITTA foi noiva de LÚCIO BOLONHA FUNARO. Os voos utilizados por EDUARDO CUNHA custaram 24 Em elaboração INQ 3983 / DF R$122.245,00. […] Essa longa narrativa envolvendo a investigação da CVM, por si só, já é suficiente para demonstrar a proximidade entre LÚCIO BOLONHA FUNARO e EDUARDO CUNHA, contrariando o que ambos alegam publicamente. Em verdade, FUNARO atua de longa data como operador de EDUARDO CUNHA, realizando a lavagem da vantagem obtida por este último. 10. DO HISTÓRICO E DAS EMPRESAS UTILIZADAS POR LÚCIO BOLONHA FUNARO PARA LAVAGEM DE DINHEIRO. LÚCIO BOLONHA FUNARO é personagem antigo dos noticiários policiais nacionais, tendo aparecido nos grandes escândalos de corrupção do Brasil nos últimos tempos. […] Porém, apurou-se que o envolvimento de LÚCIO BOLONHA FUNARO com negócios espúrios continua plenamente ativo. FUNARO é, ainda, responsável por diversas empresas, que não possuem qualquer atividade lícita e que continuam a fazer exatamente aquilo que ele fazia e foi apurado - e inclusive confessado por ele - na época do Mensalão: a lavagem de valores para políticos. […] Há centenas de comunicações de operações suspeitas no COAF envolvendo LÚCIO BOLONHA FUNARO e suas empresas. […] Segundo se apurou, a movimentação de FUNARO se caracteriza pelo trânsito rápido de recursos, com o recebimento de recursos através de TEDs e depósitos em espécie para envio, no mesmo dia, de TEDs e pagamento de cheques emitidos, tendo realizado habitualmente transações desta natureza. […] As movimentações [...] foram consideradas suspeitas por 25 Em elaboração INQ 3983 / DF indicar a realização de operações financeiras em espécie, que apresentem atipicidade em relação à atividade econômica do cliente ou incompatibilidade com sua capacidade econômica financeira. Ademais, a movimentação não confere com a renda declarada do associado. […] Ademais, no RIF 16253 constou outra comunicação de operação suspeita envolvendo FUNARO, datada de novembro de 2014. Segundo apurado, FUNARO movimentou a quantia de R$ 10.490.827,00 e constou que, além da movimentação do cliente habitualmente se caracterizar pelo recebimento de recursos e transferências para outras contas, com trânsito rápido de recursos, os 'recursos recebidos estão sendo enviados sistematicamente para o exterior. […] A movimentação se mostrou suspeita pela resistência ao fornecimento de informações (básicas) necessárias para o início de relacionamento ou para a atualização cadastral, recebimento de recursos com imediata compra de instrumentos para a realização de pagamentos ou de transferências a terceiros, sem justificativa, realização de transferências unilaterais que, pela sua habitualidade, forma ou valor, não se justifiquem ou apresentem atipicidade e, por fim; realização de transferências internacionais nas quais não se justifique a origem dos fundos envolvidos ou que se mostrem incompatíveis com a capacidade econômico-financeira ou com o perfil do cliente. Mas não apenas na pessoa física que se verificou a realização de operações suspeitas. As diversas empresas de FUNARO foram objeto de diversas comunicações de operações suspeitas de lavagem de capitais. […] Ademais, foi identificado que a forma de movimentação de recursos era incompatível com empresas que desenvolviam o mesmo ramo de atividade, em especial pela triangulação de valores entre as empresas VISCAYA, ROYSTER e ARAGUAIA, sem justificativa aparente. [...] 10.9 Da Lavagem de Dinheiro para EDUARDO CUNHA 26 Em elaboração INQ 3983 / DF Conforme visto acima, identificou-se que as empresas de FUNARO pagaram veículos de EDUARDO CUNHA e sua empresa. No Relatório de Inteligência Financeira (RIF) n. 15495 do COAF surgiram informações que indicam, também, que EDUARDO CUNHA lava dinheiro por intermédio de LÚCIO BOLONHA FUNARO. Segundo o referido RIF, de acordo com os dados do CCS - Cadastro de Clientes do Sistema Financeiro Nacional, DENISE MARIA SANTOS constou como representante, responsável ou procuradora de duas contas de EDUARDO CUNHA no período de 21 de janeiro de 2008 a 11 de dezembro de 2012. DENISE consta como sócia da empresa TRANZABEL LTDA desde 24/5/2012. No ano de 2013, a empresa não possuía qualquer funcionário registrado e está com a situação cadastral suspensa perante a Secretaria da Fazenda de Minas Gerais. Ademais, DENISE consta como empregada da Câmara dos Deputados, com remuneração registrada de R$ 11.940,00, e como assessora direta de EDUARDO CUNHA, ao menos desde 2007 até a presente data. Ademais, DENISE é sócia da empresa TRANZABEL LTDA desde maio de 2012 até a presente data, com 50% da participação societária, e foi sócia da FR TRANSPORTADORA LTDA (fev/2005 a agosto de 2006). […] Porém deve-se destacar que DENISE não aparenta ter rendimentos compatíveis com a propriedade de tais empresas. Isto porque 50% do capital social da empresa TRANZABEL representa a quantia de R$ 1.462.000,00, enquanto o capital social da FRTRANSPORTADORA representa R$ 500.000,00. Nada obstante, a TRANZABEL foi relacionada em Comunicação de Operação Suspeita titularizada pela VISCAYA HOLDING PARTICIPAÇÕES, INTERMEDIAÇÕES, COBRANÇAS E SERVIÇOS LTDA. […] 27 Em elaboração INQ 3983 / DF 11. DO PATRIMÔNIO INCOMPATÍVEL DE EDUARDO CUNHA, DE PESSOAS FÍSICAS E JURÍDICAS A ELE RELACIONADAS Os elementos existentes indicam movimentação de valores incompatíveis com os rendimentos do Deputado Federal EDUARDO CUNHA tem três empresas em seu nome: […] Em 2002, o patrimônio de EDUARDO CUNHA declarado à Justiça Eleitoral era de R$ 525.768,00, contendo apenas dois bens: […] Em 2006, EDUARDO CUNHA possuía bens declarados em total de R$ 989.000,00, sendo R$ 551.500,00 apenas referentes à C3 PARTICIPAÇÕES: […] Por fim, EDUARDO CUNHA apresentou a declaração de bens no valor de R$ 1,649,226.10 no ano de 2014, sendo que, deste total, R$ 840.000,00 são referentes a quotas ou quinhões da empresa C3 PARTICIPAÇÕES. Ou seja, em geral, os valores da referida empresa representam mais da metade de todo o patrimônio declarado por EDUARDO CUNHA. Veja, por outro lado, que referida empresa não possui e nunca possuiu qualquer funcionário registrado. […] Ademais, segundo informações de fontes abertas, a frota de carros que EDUARDO CUNHA utiliza no Rio de Janeiro é bastante generosa: Porsche Cayenne, Touareg, Corolla, Edge, Tucson, Pajero Sport. Vale destacar que o Porshe Cayenne é conduzido pela esposa de EDUARDO CUNHA, CLÁUDIA CORDEIRO CRUZ, e o valor de mercado de um carro desses 0Km gira em torno de R$ 600.000,00. Em consulta às bases de dados do INFOSEG, verifica-se que realmente há diversos veículos registrados em nome de CLÁUDIA CRUZ e, em especial, em nome das empresas do casal. 28 Em elaboração INQ 3983 / DF […] Além destes veículos, consta um veículo em nome de EDUARDO CRUZ , declarado (TOYOTA CORROLA ano 2007), e diversos em nome dos filhos: a) BMW X1 2011, em nome de GHABRIELA CRUZ AMORIM, b) GM CAPTIVA 2011 em nome de FELIPE DYTZ DA CUNHA; c) VW TIGUAN 2011 em nome de DANIELLE DYTZ DA CUNHA DOCTORIVCH; d) MMC/PAJERO TR4, em nome de ANIELLE DITZ DA CUNHA (com endereço na Av. Nilo Peçanha, 50). Por sua vez, CLÁUDIA CRUZ aparece como responsável pelas seguintes empresas: (i) EJR DECORAÇÕES LTDA (13793330000395); (ii) C3 PRODUÇÕES ARTÍISTICAS E JORNALÍSTICAS LTDA-EPP; (iii) JESUSWEB LTDA; (iv) JESUS. COM SERVIÇOS DE PROMOÇÕES PROPAGANDA E ATIVIDADES DE RÁDIO LTDA. […] Conforme visto a C3 PRODUÇÕES não tem funcionários. No mesmo endereço da C3 está situada a empresa JESUSWEB LTDA, cujo nome fantasia é FÉ EM JESUS, situada também na Avenida Nilo Peçanha, n. 50. A empresa também não possui qualquer empregado registrado. […] Segundo as informações da Receita Federal, a empresa JESUS.COM apresentou as DIPJ referentes aos anos-calendários 2012 e 2013. Da mesma forma, a JESUS WEB somente apresentou DIPJ referente a 2013. Da mesma forma, segundo as mesmas informações, EDUARDO CUNHA e CLÁUDIA CORDEIRO CRUZ apresentaram indícios de variação patrimonial a descoberto nos anos de 2011 a 2014. Conforme amplamente noticiado na mídia e já comunicadas a este Egrégio Supremo Tribunal, informações da Suíça deram conta de contas de EDUARDO CUNHA e de seus familiares naquele país. Foram identificadas quatro contas ocultadas em nome de 29 Em elaboração INQ 3983 / DF EDUARDO CUNHA, a saber: 1) CONTA NETHERTON: aberta em nome da empresa NETHERTON INVESTMENTS PTE LTD, cujo Beneficiário Final é EDUARDO CUNHA. Referida conta, aberta em 03.09.2008, teve em 07.04.2015 a quantia de CHF 2.392.595,00 bloqueada. 2) CONTA KÓPEK: aberta em nome da esposa de EDUARDO CUNHA, CLÁUDIA CORDEIRO CRUZ, que fora aberta em 20.01.2008 e teve a quantia bloqueada e CHF 176.670,00197 apreendida em 07.04.2015, conta esta essencialmente vinculada a despesas de cartões crédito. 3) CONTAS ORION e (4) TRIUMPH: EDUARDO CUNHA era o Beneficiário Final (Beneficiai Owner) de duas outras contas, chamadas TRIUMPH SP e ORION SP, ambas fechadas pouco depois da deflagração da Operação Lava Jato, em 09.04.2014.” A narrativa feita no pedido da busca e apreensão, na parte em que faz referência aos requerimentos apresentados na Comissão de Fiscalização e Finanças da Câmara dos Deputados pela então Deputada Federal Solange Almeida (objeto deste inquérito), tinha como objetivo contextualizar suposta atuação reiterada de Eduardo Cunha, que se teria utilizado desse mesmo expediente em outras ocasiões ainda a serem esclarecidas. Ilustrativo, a esse respeito, o seguinte excerto da manifestação ministerial (fls. 2.459-2.460): “[...] Conforme constou naquele pedido, ‘verificou-se que o requerimento formulado por SOLANGE ALMEIDA, por ordem e pedido de EDUARDO CUNHA, refletia apenas a ‘ponta do iceberg’. Em outras palavras, vislumbrou-se que EDUARDO CUNHA se vale, habitualmente, de diversos Deputados Federais para a realização de requerimentos, solicitações e requisitos, com fins nitidamente ilícitos, transformando o Congresso Nacional em um verdadeiro ‘balcão de negócios’. Astutamente, os requerimentos aparentavam buscar fins lícitos, mas, em verdade, eram vocacionados apenas para o interesse pessoal de EDUARDO 30 Em elaboração INQ 3983 / DF CUNHA e seus comparsas’ Embora não seja o caso de narrar os diversos atos ilícitos narrados na referida peça - que possui mais de 250 páginas – buscava-se, naquela Ação Cautelar, aprofundar na apuração do envolvimento de EDUARDO CUNHA na pressão de empresários, assim como na atuação parlamentar em favor das empreiteiras (em especial, no desvio de finalidade na atividade legislativa, em especial na ‘venda’ de Medidas Provisórias para o Grupo OAS e outras empresas), bem como na lavagem de capitais. Ressalte-se: o foco principal não era obter provas para o presente feito. Portanto, a busca e apreensão buscava apurar especialmente outros fatos que, embora conexos com o objeto da presente denúncia, não se identificam com aqueles imputados na presente ação penal”. Tanto é verdade que contra o mesmo denunciado, Eduardo Cosentino da Cunha, tramita ao menos mais um inquérito (4146) que pode vir a receber influxos de elementos probatórios da mesma diligência. O objetivo de tal inquérito é apurar a suposta prática dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro em razão das quatro contas na Suíça atribuídas ao parlamentar, em grande medida descritas na busca e apreensão, que receberiam valores possivelmente oriundos de propina obtida em contrato de exploração de campo de petróleo na República do Benin, na África Ocidental. Neste segundo inquérito é que se observa uma identidade mais precisa com narrativa exclusiva da busca e apreensão. De todo modo, em caso de eventual encontro fortuito de provas relacionadas a este processo – confortado, aliás, pela jurisprudência desta Corte – serão garantidos aos acusados o contraditório e a ampla defesa, com a abertura de prazo para manifestação própria em momento oportuno, em autêntico contraditório diferido. No mais, tais elementos probatórios não foram utilizados e não são considerados para esse específico juízo de recebimento da denúncia. 31 Em elaboração INQ 3983 / DF 8. Em suma: não há como acolher as alegações preliminares sobre as questões formais acima enfrentadas. No que concerne às supostas deficiências das peças acusatórias – denúncia e aditamento –, por dizerem respeito à viabilidade da peça acusatória, serão examinadas a seguir, com o juízo de mérito. 9. No mérito, registre-se, inicialmente, que, por decisão proferida nos autos de Pet 5.245 e 5.278, foi determinada a instauração do presente inquérito em relação ao Deputado Federal Eduardo Cunha e a cisão do procedimento investigatório em relação aos demais envolvidos nos fatos descritos na denúncia (Fernando Soares, Júlio Camargo e Nestor Cerveró), com a remessa de cópia dos autos ao juízo da 13ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Curitiba para prosseguimento das investigações. Tal cisão, determinada por esta Corte, foi cumprida pelo juízo ordenado, no qual tramitou a Ação Penal 5083838- 59.2014.4.04.7000/PR (cópia integral à fl. 711), cuja sentença condenatória se acha às fls. 764-798. No tocante à denunciada Solange Almeida, de acordo com a denúncia, apenas com o desdobramento das investigações foi possível verificar seu envolvimento nos supostos crimes atribuídos ao Deputado Federal Eduardo Cunha, razão pela qual a Procuradoria-Geral da República sustentou não ser recomendável o desmembramento em relação a ela: “SOLANGE ALMEIDA, embora não seja mais titular de foro por prerrogativa de função perante este Egrégio Supremo Tribunal Federal, praticou condutas que se apresentam essencialmente vinculadas aos fatos imputados ao parlamentar em referência. Em outras palavras, a conduta de SOLANGE ALMEIDA está umbilicalmente ligada a de EDUARDO CUNHA. Deste modo, na linha da absoluta excepcionalidade de que tratam os precedentes do Supremo Tribunal Federal, há aqui uma essencialidade na produção das provas ao longo do processo e sua análise ao final, exatamente para não prejudicar 32 Em elaboração INQ 3983 / DF a apuração e, especialmente, ‘ocasionar prejuízo relevante a prestação jurisdicional’. Assim, afigura-se fundamental que SOLANGE ALMEIDA seja também processada perante o Supremo Tribunal Federal” (fl. 568). Segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal, cabe apenas ao próprio tribunal ao qual toca o foro por prerrogativa de função a análise da cisão das investigações (Rcl 7913-AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, DJe de 8/9/2011), assim como – conforme orientação mais recente – de promover, sempre que possível, o desmembramento de inquérito e peças de investigação correspondentes, para manter sob sua jurisdição, em regra, apenas o que envolva autoridade com prerrogativa de foro, segundo as circunstâncias de cada caso (Inq 3515 AgR, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 13/02/2014, DJe de 14/3/2014), ressalvadas as situações em que os fatos se revelem “de tal forma imbricados que a cisão por si só implique prejuízo a seu esclarecimento” (AP 853, Relator(a): Min. ROSA WEBER, DJe de 22/5/2014). Desse modo, as razões apresentadas pelo Ministério Público demonstram adequadamente a necessidade de manutenção da denunciada Solange Almeida para ser processada e julgada nesta Corte, em conjunto com o Deputado Federal Eduardo Cunha. 10. Conforme relatado, a denúncia, em seu núcleo, imputa a Eduardo Cosentino da Cunha e Solange Pereira de Almeida a prática de condutas tidas como tipificadas no art. 317, caput e § 1º, c/c art. 327, §§ 1º e 2º, ambos do Código Penal: “Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa § 1º - A pena é aumentada de um terço, se, em 33 Em elaboração INQ 3983 / DF consequência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional”. “Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública. § 1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública. § 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público”. Em relação ao denunciado Eduardo Cunha, é imputado ainda o cometimento do crime de lavagem de dinheiro (art. 1º, V, VI e VII, da Lei 9.613/1998, com redação anterior à Lei 12.683/2012): “Art. 1º Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de crime: […] V - contra a Administração Pública, inclusive a exigência, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, de qualquer vantagem, como condição ou preço para a prática ou omissão de atos administrativos; VI - contra o sistema financeiro nacional; VII - praticado por organização criminosa”. Conforme registrado no relatório, a denúncia, tal como originalmente apresentada, imputou ao acusado condutas delituosas 34 Em elaboração INQ 3983 / DF desdobradas em dois “momentos” distintos, a saber: “a solicitação e a aceitação da promessa de vantagens indevidas por Eduardo Cunha foi, em um primeiro momento, para garantir a manutenção do esquema ilícito implantado no âmbito da Petrobras, omitindo-se em interferir ou impedir a contratação do estaleiro Samsung, assim como para manter os indicados políticos em seus cargos na referida sociedade de economia mista. Em um segundo momento, o recebimento de valores indevidos - no montante de US$ 5.000.000,00 - foi para pressionar o retorno do pagamento das propinas, valendo-se de requerimentos, formulados por interposta pessoa e com desvio de finalidade, perante o Congresso Nacional” (fl. 605). 11. Relativamente ao primeiro momento, Eduardo Cunha, segundo a denúncia, (a) solicitou, entre junho de 2006 e outubro de 2012, para si e para outrem e aceitou promessa de vantagem indevida no montante aproximado de US$ 15.000.000,00 (quinze milhões de dólares) de Júlio Camargo, em razão da contratação, pela Petrobras, do estaleiro Samsung, para a construção do navio-sonda Petrobras 10000; e (b) solicitou, entre fevereiro de 2007 e outubro de 2012, para si e para outrem e aceitado promessa, direta e indiretamente, de vantagem indevida no montante aproximado de US$ 25.000.000,00 (vinte e cinco milhões de dólares) de Júlio Camargo, a fim de que a Petrobras realizasse a contratação do estaleiro Samsung, para a construção do navio-sonda Vitória 10000. Nessas situações, afirma, os repasses ilícitos foram intermediados por Fernando Soares, que representaria os interesses do denunciado Eduardo Cunha – segundo a acusação, este seria o “sócio oculto” daquele na empreitada criminosa (fl. 604). O ilícito teria contado, ainda, com a participação de Nestor Cerveró, que, na qualidade de Diretor da Área Internacional da Petrobras, deixou de praticar atos de ofício a que estava obrigado, além de os ter praticado infringindo dever funcional. Para embasar a denúncia, a acusação traz inúmeros indícios concretos a demonstrar que, de fato, ocorreram diversas irregularidades no âmbito dos mencionados contratos, tais como: (a) depoimentos 35 Em elaboração INQ 3983 / DF prestados por Júlio Camargo (fls. 692-703, 749-757, 814-856, 2010-2013), Alberto Youssef (fls. 14-16, 53-55, 428-433, 757-759) e Fernando Soares (fls. 2.026-2.076, 2.127-2.154), os quais, por força de acordo de colaboração premiada, atestam que houve pagamentos de propina a agentes públicos para viabilizar a contratação da empresa coreana Samsung pela Petrobras; (b) auditoria da Petrobras, que identificou diversas irregularidades durante o processo de contratação (fls. 890-921); (c) contratos celebrados entre Júlio Camargo e a empresa Samsung com objeto de intermediação realizada junto à Petrobras para que a negociação fosse realizada; (d) cópia da agenda de Nestor Cerveró e registros de entrada na Petrobras, que indicam diversas reuniões com Fernando Soares e Júlio Camargo na época da negociação (fls. 1.688-1696); e (e) documentos e extratos bancários que demonstrariam pagamentos realizados pela Samsung a Júlio Camargo e deste para Fernando Soares e Nestor Cerveró no exterior, por meio de offshores (fls. 704-710; 802-811, 1.041-1.231). Portanto, há elementos indiciários mais do que suficientes no sentido da prática de ilícitos voltados à contratação da construção dos naviossonda Petrobras 10000 e Vitória 10000, com pagamento de vantagem indevida para agente público (Nestor Cerveró, então Diretor da Petrobras). Essa conclusão é corroborada pelos autos da Ação Penal 5083838-59.2014.4.04.7000/PR, que tramitou na 13ª Vara Federal de Curitiba (fl. 711), na qual houve sentença condenatória proferida contra Nestor Cerveró, Júlio Camargo e Fernando Soares (fls. 764-798). Todavia, apesar desses elementos trazidos aos autos, e ao contrário do que faz crer a denúncia em sua versão original, não ficou demonstrada concretamente a participação dos denunciados Eduardo Cunha e Solange Almeida nessa fase inicial de negociação da construção dos navios-sonda. Com efeito, nada foi produzido, em termos probatórios, que indique a efetiva participação dos denunciados nos supostos crimes ocorridos na já longínqua época da celebração dos contratos, nos anos de 2006 e 2007, ou mesmo que tenham os acusados, no período imediato, recebido vantagem indevida para viabilizar a negociação ou se omitido em fiscalizar esses 36 Em elaboração INQ 3983 / DF contratos, em razão do mandato parlamentar. Os elementos mínimos de autoria exigidos para o recebimento da denúncia em relação a esses fatos iniciais não se fazem presentes. Pela análise dos elementos colhidos, é possível concluir apenas pela existência de indícios da prática crimes de corrupção ativa, passiva e lavagem de dinheiro com a participação de Nestor Cerveró, Fernando Soares e Júlio Camargo. Aliás, quanto a Solange Almeida, a denúncia sequer menciona a participação dela quando da celebração dos contratos ou de suposto recebimento de vantagem indevida deles decorrente. Narra, apenas, sua atuação nos fatos ocorridos a partir de 2011, quando teria ajudado Eduardo Cunha a pressionar Júlio Camargo a pagar vantagens indevidas a Fernando Soares e ao próprio Eduardo Cunha. Em relação ao Deputado Federal Eduardo Cunha, a primeira parte da denúncia é lastreada exclusivamente em depoimento de colaboradores que diziam que Fernando Soares agia em nome do parlamentar e do PMDB para recebimento de vantagem indevida. Veja-se, por exemplo, o Termo de colaboração 13 de Alberto Youssef (fls. 340-342): “QUE indagado acerca dos fatos referentes ao Anexo n. 13, NAVIOS E SAMSUNG, afirma que PAULO ROBERTO COSTA intermediou o aluguel de um navio plataforma junto à área internacional da PETROBRAS, em contrato que foi formalizado entre a SAMSUNG e a PETROBRAS, também com a participação da MITSUE, cujo representante no Brasil era JULIO CAMARGO; QUE para viabilizar a assinatura do contrato com a SAMSUNG, foi demandado que JULIO CAMARGO repassasse para o PMDB percentual que o declarante não sabe precisar, mas que se destinava a pagamento de vantagem indevida a integrantes do partido PMDB, notadamente o deputado federal EDUARDO CUNHA, bem como em favor de PAULO ROBERTO COSTA, à época Diretor de Abastecimento da PETROBRÁS; QUE para gerar tal valor, JULIO CAMARGO, agindo como broker em tal operação, inclusive respaldado em contrato firmado entre ele e a 37 Em elaboração INQ 3983 / DF SAMSUNG, passou a repassar valores a FERNANDO SOARES, conhecido por FERNANDO BAIANO; QUE JULIO CAMARGO, enquanto broker, recebia comissionamento da SAMSUNG, em percentual que o declarante desconhece, mas a partir do qual passou a fazer frente aos pagamentos destinados a FERNANDO BAIANO; QUE FERNANDO SOARES representava o deputado EDUARDO CUNHA do PMDB; QUE afirma que FERNANDO SOARES ‘representava’ o PMDB no âmbito da PETROBRÁS, isto é, era o operador do PMDB”. Em depoimento posterior, o mesmo Alberto Youssef esclareceu os fatos anteriormente narrados, relacionados ao Deputado Federal Eduardo Cunha, destacando que o nome do parlamentar surgiu apenas quando Júlio Camargo o procurou em 2011, relatando que havia deixado de passar valores decorrentes dos contratos das sondas para Fernando Soares. É o que consta da seguinte passagem do Termo de declaração complementar 15, de Alberto Youssef (fls. 52-55): “QUE em relação ao pagamento de valores para EDUARDO CUNHA e CERVERÓ pela empresa SAMSUNG, o declarante se recorda que, em determinado dia, o JULIO CAMARGO ligou ao declarante para que fosse ao escritório de JULIO para conversar com ele; QUE o declarante foi e ao chegar ao escritório até estranhou pois atendeu o declarante de maneira bastante rápida, o que era incomum; QUE, então, JULIO CAMARGO disse ao declarante que tinha intermediado um contrato de aluguel de sondas, no qual PAULO ROBERTO COSTA, GENU e FERNANDO SOARES participaram, entre SAMSUG MITSUE e área internacional da PETROBRAS; QUE JULIO CAMARGO relatou ao declarante que, em determinado momento, deixou de repassar os valores para FERNANDO SOARES e este último, para pressionar, fez um pedido para que EDUARDO CUNHA pedisse a uma Comissão do Congresso para questionar tudo sobre a empresa TOYO, MITSUE e sobre JULIO CAMARGO, SAMSUNG e suas relações com a 38 Em elaboração INQ 3983 / DF PETROBRAS, cobrando contratos e outras questões; QUE por isto JULIO CAMARGO ficou bastante assustado; QUE este pedido à PETROBRAS foi feito por intermédio de dois Deputados do PMDB; [...]; QUE o nome do EDUARDO CUNHA surgiu através do JULIO CAMARGO; QUE, salvo engano, PAULO ROBERTO COSTA mencionou o nome de EDUARDO CUNHA durante esse episódio; QUE PAULO ROBERTO COSTA dizia ao declarante que FERNANDO BAIANO representava o PMDB, mas o declarante nunca presenciou encontros de FERNANDO BAIANO com algum político do PMDB”. Em juízo, na ação penal que tramitou em primeira instância, mais uma vez Alberto Youssef relata uma suposta participação de Eduardo Cunha, não a partir de 2006 ou 2007, mas apenas a partir de 2010 e 2011, descrevendo que Fernando Soares teria pedido ao deputado para que pressionasse Júlio Camargo por meio de apresentação de requerimentos na Câmara dos Deputados: “Interrogado: - Agora, com respeito a esta denúncia específica Excelência, eu na condição de colaborador e de dizer a verdade, tem algumas discrepâncias com referência a esta denúncia específica. Juiz Federal: - Então vamos aqui, diz respeito a dois contratos de locação de sonda, de fornecimento de sonda pela Samsung com a Petrobras, o senhor participou desses contratos? Interrogado: - Não. Eu não participei. Eu fui chamado em 2011 pelo Doutor Júlio Camargo, aonde o Dr. Júlio se encontrava muito preocupado e me relatou que o Fernando Soares, através do Deputado Eduardo Cunha, havia pedido alguns requerimentos de informações referentes aos contratos da Mitsui, da Toyo e próprio dele Júlio Camargo, através de outros deputados, não que ele tinha protocolado, mas sim, pedido pra que (…) […] 39 Em elaboração INQ 3983 / DF Juiz Federal: - Em 2011, lá. O que é que foi então o objeto dessa reunião? Interrogado: - Em 2011, como já detalhei o objeto dessa reunião. Aí ele me relatou sobre o assunto do Fernando sobre o aluguel das sondas, sobre o requerimento e pediu que eu procurasse o Fernando, para que eu o acalmasse que ele ia conversar com ele e ia retomar o pagamento. Assim eu fiz. Conversei com o Fernando. […] Juiz Federal: - Eu indaguei o senhor, mas o senhor não me respondeu diretamente. Quando o senhor conversou lá com o Júlio Camargo, sobre as operações, ele mencionou quem eram os beneficiários das operações ou ele falou só no Fernando Soares? Interrogado: - Falou no Fernando Soares e contou a história da pressão que o Eduardo Cunha tava fazendo para que ele pudesse pagar o Fernando Soares, dando entendimento que esse valor fosse também, na época, para o Deputado” (fl. 711 – Processo 5083838-59.2014.4.04.7000/PR – evento 415). Paulo Roberto Costa, mencionado por Alberto Youssef em depoimento, por sua vez, disse que: “[...] não tem conhecimento sobre o aluguel de sondas da Samsung pela Petrobras, porque isso não era assunto da Diretoria de Abastecimento; QUE conhece Júlio Camargo, mas sua relação com tal pessoa não diz respeito ao aluguel de sondas pela Petrobras; QUE não recebeu comissão da Samsung; QUE nunca tratou com o deputado federal Eduardo Cunha do aluguel de sondas pela Petrobras junto a empresa Samsung; […] QUE nunca mencionou EDUARDO CUNHA e nunca se reuniu com ele” (fls. 430-433). Também o colaborador Júlio Camargo descreve que a participação dos denunciados somente se deu após ter atrasado pagamentos para Fernando Soares, sem, contudo, informar envolvimento deles à época da 40 Em elaboração INQ 3983 / DF celebração dos contratos entre a Petrobras e a Samsung: “QUE questionado sobre os detalhes destas sondas e como foi o contato, esclareceu que a primeira sonda se destinava ao mercado da África, onde a PETROBRAS já tinha alguns campos de petróleo para serem explorados, enquanto a segunda sonda seria para o Golfo do México; QUE o início da negociação das sondas ocorreu em 2005 em relação à primeira sonda e em 2006 em relação à segunda sonda […] QUE procurou FERNANDO SOARES, que no mercado é conhecido como FERNANDO BAIANO; QUE disse a FERNANDO SOARES que tinha um negócio e então explicou o negócio a ele; QUE então questionou se a PETROBRAS, mais especificamente a área internacional, teria interesse no referido negócio […] QUE então FERNANDO SOARES, dentro do prazo previsto, retornou dizendo que a PETROBRAS tinha interesse na sociedade com a MITSUI […] QUE os termos do consórcio ficaram acordados entre MITSUI e PETROBRAS, assim como o preço, prazo de entrega e escopo da construção do equipamento entre a SAMSUNG e o consórcio; QUE então começou a parte negocial entre FERNANDO SOARES e o declarante; […] que FERNANDO SOARES e o declarante iriam tratar do pagamento pelo serviços de FERNANDO SOARES; QUE os serviços de FERNANDO SOARES seriam a intermediação e facilitação das negociações com a PETROBRAS; […] QUE FERNANDO SOARES disse: ‘JULIO, quero receber por esta parceria a quantia de US$ 15 milhões de dólares’; QUE FERNANDO SOARES precisava deste valor para realizar o trabalho dele e dizia que com o pagamento deste valor ‘nós vamos ter sucesso’; QUE conversou com a SAMSUNG, que aceitou o valor de US$ 20 milhões; QUE deste valor US$ 15 milhões seria para FERNANDO SOARES; QUE então foi obtido o sucesso, tanto no consórcio MITSUI/PETROBRAS, quanto na venda do equipamento para o consórcio; QUE três meses após concluído o negócio, FERNANDO SOARES procurou o declarante e disse: ‘Temos uma nova oportunidade: a PETROBRAS irá precisar de uma nova 41 Em elaboração INQ 3983 / DF sonda, só que agora para o Golfo do México’ […] QUE nesta segunda sonda, logo que se inciou a negociação das condições técnicas, de preço e de prazo, FERNANDO SOARES já procurou o declarante e afirmou que já queria, desde logo, acenar o ‘preço’ desta ‘parceria’; […] o valor final da que deveria ser repassado a FERNANDO SOARES em razão da segunda sonda foi fixado em US$ 20 milhões; QUE conseguiu convencer a SAMSUNG ao pagamento de US$ 53 milhões ao declarante a título de comissões de broker, em relação às duas sondas, sendo que, deste valor, US$ 35 milhões seriam para FERNANDO SOARES; QUE este valor de US$ 35 milhões para FERNANDO SOARES englobaria tanto os serviços da primeira quanto da segunda sonda; […] QUE à medida que foi recebendo os valores da SAMSUNG a título de corretagem, os valores eram repassados a FERNANDO SOARES proporcionalmente; QUE os pagamentos foram sendo feitos pela SAMSUNG dentro dos eventos programados do contrato até o último evento, que era no momento da entrega da primeira sonda; QUE a entrega da primeira sonda ocorreu no final de 2008, ao que se recorda; […] QUE então ocorreu a entrega da segunda sonda, por volta de 2009, um ano aproximadamente depois da entrega da primeira; QUE novamente emitiu uma fatura, enviou para a SAMSUNG […] QUE, para a surpresa do declarante, recebeu uma posição da SAMSUNG afirmando que não havia feito os pagamentos porque o declarante não tinha cumprido os termos contratuais; QUE quando recebeu esta notícia da SAMSUNG, informou a FERNANDO SOARES que tinham um problema; QUE então explicou para FERNANDO SOARES que havia um problema contratual e que a SAMSUNG estava se negando a pagar os valores; […] QUE FERNANDO SOARES, então, pela primeira vez, deu uma resposta ‘muito dura e muito contundente’; ‘JULIO, já estou esperando há algum tempo o pagamento da primeira sonda, agora vem a segunda sonda e você me diz que estamos com problema. Queria te lembrar que dividimos nossa parceria em responsabilidades e que o recebimento de valores pela SAMSUNG é de sua responsabilidade’; […] QUE a conversa se encerrou com o 42 Em elaboração INQ 3983 / DF declarante dizendo que iria analisar e voltariam a conversar; QUE, em momento seguinte, por volta de uma semana depois, FERNANDO SOARES ligou para o declarante solicitando uma nova reunião; QUE FERNANDO SOARES disse: ‘Estou vindo na qualidade de seu amigo e na última vez disse que tinha compromissos inadiáveis e quero te dizer o seguinte: Eu tenho um compromisso com o Deputado EDUARDO CUNHA’; QUE FERNANDO SOARES disse que tinha um saldo a pagar de US$ 5 milhões para o Deputado EDUARDO CUNHA, em razão deste ‘pacote’ das sondas; QUE não sabe quanto já tinha sido pago, mas o valor restante seria de US$ 5 milhões para EDUARDO CUNHA; QUE FERNANDO SOARES disse ao declarante que estava preocupado, pois EDUARDO CUNHA havia dito a FERNANDO SOARES que iria fazer um requerimento na Câmara em relação ao declarante e às diversas empresas que o declarante representava; QUE, em outras palavras, FERNANDO SOARES já nesta oportunidade alertou o declarante de que poderia haver uma requisição da Câmara para o declarante e para as empresas que o declarante representava; QUE no momento entendeu que a requisição da Câmara partiria de EDUARDO CUNHA; […] QUE neste momento FERNANDO SOARES somente falou no nome de EDUARDO CUNHA, embora FERNANDO SOARES sempre mencionasse a proximidade com outros políticos, em especial do PMDB […] QUE FERNANDO SOARES, então, foi embora e, cerca de dez ou quinze dias depois, o Diretor TAKAGI, da MITSUI no Rio de Janeiro, procurou o declarante com uma requisição da Deputada SOLANGE ALMEIDA para o Ministro das Minas e Energia, EDISON LOBÃO; QUE tal requisição solicitava que todos os contratos da MITSUI com a PETROBRAS fossem alvo de verificação por parte dos órgãos competentes; QUE a ameaça então se concretizou” (Termo de declarações complementar 2 de Júlio Camargo - fls. 832-850). Em seu interrogatório, na ação penal que tramitou em primeira instância, Júlio Camargo apresentou a mesma versão dos fatos, sobre o 43 Em elaboração INQ 3983 / DF envolvimento dos denunciados somente a partir de 2010 e 2011 (fls. 749- 757). Diferentemente do disposto na denúncia original, Júlio Camargo apenas relata sua opinião pessoal de que Eduardo Cunha seria “sócio oculto” de Fernando Soares, mas – aqui o ponto – sem relatar qualquer fato ou trazer indícios da participação de Eduardo Cunha e Solange de Almeida na época da celebração dos contratos dos navios-sonda: “Defesa: - Ou seja, qual foi então na sua, objetivamente, quem foi o beneficiário de toda essa transação, o beneficiário final, que ficou com o dinheiro final dessa transação com os navios-sonda? Interrogado: - Bom, eu acho que o Fernando foi um beneficiário como meu parceiro, da mesma maneira como eu ganhei ele ganhou também, eu não sabia que ele tinha sócio oculto que era o deputado Eduardo Cunha e que também ganhou” (fl. 756-v). Se não bastasse a ausência de indícios mínimos acerca do “primeiro momento” da conduta imputada na narrativa trazida na denúncia original, tem-se que, já depois de seu oferecimento, Fernando Soares celebrou acordo de colaboração premiada com o Ministério Público, em que declara ter conhecido Eduardo Cunha apenas em 2009, ou seja, bem depois das tratativas sobre os contratos da Petrobras com a Samsung e o início dos pagamentos de valores por parte de Júlio Camargo. Fernando Soares relata, ainda, que se encontrou com Eduardo Cunha em algumas oportunidades em 2010, buscando estreitar as relações com ele, mas que apenas em 2010 e 2011 teria ocorrido o suposto envolvimento dos denunciados nas exigências de imediato pagamento de propina a Júlio Camargo (Termo de declaração 3 de Fernando Soares – fls. 2.026-2.046): “[...] o depoente, em relação aos contratos de aquisição dos navios sondas PETROBRAS 10.000 e VITÓRIA 10.000, deveria receber, a título de comissão, a quantia total de US$ 35 milhões de dólares de JÚLIO CAMARGO; QUE tais quantias seriam repassadas, em parte, para funcionários da PETROBRAS, […] 44 Em elaboração INQ 3983 / DF QUE entre 2006 e 2007 os valores foram pagos normalmente por JÚLIO CAMARGO; QUE, porém, a partir de 2007, com a assinatura do segundo contrato de navio sonda (VITÓRIA 1 0.000), JÚLIO CAMARGO passou a ‘enrolar’ os pagamentos e, em 2008, com a saída de CERVERÓ da Diretoria Internacional, os pagamentos cessaram de vez; QUE o valor devido por JÚLIO CAMARGO neste momento (ou seja, em 2008), para o depoente (que, em parte, seria repassado para os funcionários da PETROBRAS), referente às duas sondas (PETROBRAS 10000 e VITÓRIA 10000) era de aproximadamente US$ 16 milhões de dólares; […] QUE nada obstante as diversas tentativas de cobrar os valores de JÚLIO CAMARGO até 2011, todas foram sem sucesso; QUE o depoente conheceu o Deputado EDUARDO CUNHA em 2009, em um café da manhã no Hotel MARRIOT, no Rio de Janeiro, com um empresário angolano muito importante, chamado General JOÃO BAPTISTA DE MATOS; […] QUE ALEXANDRE SANTOS, então, apresentou o depoente ao Deputado EDUARDO CUNHA; […] QUE como o depoente sabia que EDUARDO CUNHA era um político muito influente, resolveu estreitar relações com ele; […] QUE a partir daí teve mais algumas vezes com EDUARDO CUNHA, inclusive no escritório dele no Rio de Janeiro, cerca de duas ou três vezes […] QUE tais reuniões foram em 2009 e 2010, sempre para tratar das mesmas conversas de aproximação; QUE questionado se nestas reuniões houve negociação de algo ilícito, disse que até então não; […] QUE posteriormente, ainda em 2010, veio a ideia de pedir ajuda a EDUARDO CUNHA na cobrança da dívida que JULIO CAMARGO tinha com o depoente; QUE então voltou a ter outra conversa com EDUARDO CUNHA em 2010 no escritório dele no Rio de Janeiro, oportunidade em que o depoente explicou a EDUARDO CUNHA tudo o que tinha ocorrido na contratação das duas sondas (PETROBRAS 10.0000 e VITÓRIA 10.000) e que JÚLIO CAMARGO tinha uma dívida com o depoente; QUE disse a EDUARDO CUNHA que esta dívida girava em tomo de US$ 16 milhões de dólares na época; […] QUE a ideia do 45 Em elaboração INQ 3983 / DF depoente era passar a usar o nome de EDUARDO CUNHA para pressionar JÚLIO CAMARGO e dar veracidade à versão apresentada anteriormente; QUE o depoente disse a EDUARDO CUNHA que, do valor devido por JÚLIO CAMARGO, caso lograsse obter o pagamento, repassaria 20% para a campanha dele; QUE EDUARDO CUNHA deu o de acordo e autorizou o depoente a usar o nome dele para cobrar os valores devidos de JÚLIO CAMARGO; […] QUE disse a JÚLIO CAMARGO que EDUARDO CUNHA estava lhe cobrando de maneira bastante contundente e disse a JÚLIO CAMARGO que o PMDB estava achando que o depoente havia recebido o valor e não estaria pagando a parte deles; […] QUE já em 2011, a partir de março, o depoente teve nova reunião na residência de EDUARDO CUNHA; QUE nesta reunião, o depoente perguntou se não poderia ser retomado o assunto de JÚLIO CAMARGO e o que EDUARDO CUNHA poderia fazer algo; QUE, embora em um primeiro momento o acordo fosse de apenas usar o nome de EDUARDO CUNHA, nesta reunião o depoente falou para EDUARDO CUNHA que seria necessário uma pressão mais forte, como uma reunião em que ele estivesse presente ou outra coisa do tipo; QUE então o depoente propôs a EDUARDO CUNHA que, do valor que deveria receber na época, iria repassar 50% do que recebesse de JÚLIO CAMARGO para EDUARDO CUNHA; QUE o valor era, conforme dito, de US$ 16 milhões na época, sendo que parte deste valor o depoente iria repassar para funcionários da PETROBRAS; QUE EDUARDO CUNHA disse que iria pensar em alguma forma mais efetiva de cobrar JÚLIO CAMARGO” (grifei). Além disso, a defesa trouxe à luz transcrição de declaração de Fernando Soares contida na gravação de seu depoimento prestado perante o Ministério Publico, no âmbito de colaboração premiada, no sentido de que o denunciado nada teve com as negociações e recebimento de vantagens indevidas em momento anterior a 2010 e 2011: 
INQ 3983 / DF “Fernando Soares: Eu queria explicar. Explica com gravação mesmo? Procurador: Pode ser. Isso não tem problema não, a gravação não tem problema não. Fernando Soares: Porque o importante é o seguinte: é se vocês me perguntar a forma como a denúncia foi feita do Eduardo Cunha não reflete o que realmente aconteceu. O Eduardo Cunha nunca foi o meu ‘sócio oculto’ nesse negócio das sondas. Na verdade, quando aconteceu o negócio das sondas eu nem conhecia o Eduardo Cunha. Eu vim a conhecer o Eduardo Cunha em 2009. […] Fernando Soares: Então na verdade o Eduardo Cunha entrou num momento que eu já tava desde 2007 tentando receber do Júlio Camargo e o Júlio Camargo não pagava. Ficava enrolando, enrolando, aquela história toda. Aí eu vim conhecer Eduardo Cunha em 2009, em 2000 e ... , final de 2010 começo de 2011 a gente conversando sobre eleições, não sei o que, dizendo porra eu to precisando arrumar dinheiro para a campanha, não sei o que, essa coisa toda, aí eu disse, pô Eduardo, eu tenho um assunto que se você me ajudar a resolver eu ajudo no campanha, [...] aí eu falei a ele da história do Júlio que tava me devendo, que não me pagava, ficava enrolando, não sei o que, e ai ele me disse, eu vou ver como a gente pode pressionar” (fls. 2.310-2.311). Como se vê, o conjunto dos elementos colhidos pelas partes dão conta da ausência de indícios de solicitação e aceitação de vantagem indevida “para garantir a manutenção do esquema ilícito implantado no âmbito da Petrobras, omitindo-se em interferir ou impedir a contratação do estaleiro Samsung, assim como para manter os indicados políticos em seus cargos na referida sociedade de economia mista” (fl. 605). Essa conclusão afasta, também, parte dos crimes de lavagem de dinheiro imputados a Eduardo Cunha. Segundo narra a peça acusatória, “os pagamentos dos valores totais da propina se iniciaram em 16 de setembro de 2006 – dois meses após a aprovação do primeiro contrato” (fl. 634) e se teriam 47 Em elaboração INQ 3983 / DF estendido até 2014, de acordo com o aditamento apresentado. Desse modo, as diversas operações financeiras descritas pela acusação e que teriam sido realizadas entre setembro de 2006 a 2010, por também não apresentarem indícios de que teriam a participação do denunciado, não ensejam o recebimento da denúncia, nessa parte. 12. Todavia, a denúncia narra, ainda, outra conduta, autônoma, que teria sido praticada pelo denunciado Eduardo Cunha com o auxílio da denunciada Solange Almeida. De acordo com a acusação, houve, “em um segundo momento, o recebimento de valores indevidos - no montante de US$ 5.000.000,00 - para pressionar o retorno do pagamento das propinas, valendo-se de requerimentos, formulados por interposta pessoa e com desvio de finalidade, perante o Congresso Nacional” (fl. 605). O aditamento à denúncia trouxe reforço narrativo lógico e elementos sólidos que apontam ter ambos os denunciados, Eduardo Cunha e sua correligionária Solange Almeida, aderido à exigência e recebimento de valores ilícitos nesse segundo momento, a partir de 2010 e 2011, ainda que se despreze relação com as tratativas ocorridas entre 2006 e 2009. Por oportuno, destacam-se os seguintes trechos do aditamento à denuncia: “Por volta de 2010, FERNANDO SOARES acionou EDUARDO CUNHA para cobrar a quantia devida por JULIO CAMARGO. Para tanto, FERNANDO SOARES ofereceu a quantia de USD 5.000.000,00 (cinco milhões de dólares) a EDUARDO CUNHA, caso este lograsse obter o valor então devido referente às sondas PETROBRAS 10.000 e VICTÓRIA 10.000. Neste momento, FERNANDO SOARES esclareceu sobre as irregularidades no processo de aquisição das sondas, incluindo o pagamento de propina para agentes públicos. EDUARDO CUNHA, conforme visto, aceitou o valor oferecido por FERNANDO SOARES. Em um primeiro momento autorizou FERNANDO SOARES a utilizar seu nome para a cobrança dos valores a serem pagos, a titulo de propina, por JÚLIO CAMARGO. Como não obtiveram sucesso, 48 Em elaboração INQ 3983 / DF EDUARDO CUNHA e FERNANDO SOARES se reuniram algumas vezes e, em 2011, decidiram estabelecer uma forma mais incisiva de cobrança. Foi estabelecido que EDUARDO CUNHA receberia o percentual de 50% daquilo que lograsse obter na cobrança de valores indevidos de JULIO CAMARGO. Algum tempo depois, por volta de maio de 2011, EDUARDO CUNHA se reuniu novamente com FERNANDO SOARES e afirmou que havia tomado a decisão de fazer requerimentos na Comissão de Fiscalização da Câmara como forma de pressão para o pagamento da propina. Para tal fim, EDUARDO CUNHA pediu explicações mais detalhadas sobre os negócios de JULIO CAMARGO junto a PETROBRAS. De posse de tais informações, inclusive sobre as empresas que JULIO CAMARGO representava, EDUARDO CUNHA, valendo-se da atuação de SOLANGE ALMEIDA, apresentou os Requerimentos 114 e 115 perante a Comissão de Fiscalização e Finanças da Câmara, visando a que fosse retomado o pagamento da propina e a receber seus valores. Conforme descrito na denúncia, referidos requerimentos foram feitos em nome da então deputada federal SOLANGE ALMEIDA” (fls. 2.002-2.003). Em relação a esses fatos, não há como acolher a tese da defesa de que a denúncia seria inepta por não descrever o fato criminoso, com todas suas circunstâncias. Pelo contrário. Nesse item, a peça acusatória narrou com segurança os fatos em tese delituosos e a conduta dos agentes, com as devidas circunstâncias de tempo, lugar e modo, sem que se possa avistar qualquer prejuízo ao exercício de defesa. Não é indispensável, como já enfatizado, que a denúncia descreva minuciosamente as condutas. Impõe-se, sim, uma descrição lógica e coerente, de modo a permitir que acusado possa exercer seu direito de defesa, o que de fato ocorreu em relação à segunda parte da denúncia e seu aditamento. 13. Nesse quadro, a materialidade e os indícios de autoria, elementos 49 Em elaboração INQ 3983 / DF básicos para o recebimento da denúncia, encontram-se presentes a partir do substrato trazido no inquérito. A denúncia apontou que Fernando Soares, por volta de 2010, buscou os préstimos de Eduardo Cunha para cobrar os valores devidos por Júlio Camargo relativos a “comissões” provenientes das operações de contração dos navios-sonda Petrobras 10000 e Vitória 10000, oferecendo ao denunciado o valor de US$ 5.000.000,00 (cinco milhões de dólares) caso obtivesse êxito. Aceitando a proposta, o denunciado, segundo o Ministério Público, inicialmente autorizou Fernando Soares a utilizar seu nome para cobrar os valores. Fracassada essa tentativa, o denunciado promoveu medidas de pressão mais efetivas, mediante requerimentos ilegítimos, por meio de interposta pessoa, a comissão da Câmara dos Deputados. A “interposta pessoa” a que se refere a denúncia seria a acusada Solange Almeida, deputada federal à época dos fatos, que, para coagir Júlio Camargo a pagar o valor ainda pendente, referente às aludidas “comissões” ilegítimas, apresentou, por solicitação de Eduardo Cunha, dois requerimentos à Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados, requisitando informações ao Tribunal de Contas da União e ao Ministério de Minas e Energia acerca dos contratos de interesse de Júlio Camargo com a Petrobras. A pressão exercida por Eduardo Cunha, intermediado por Solange Almeida, surtiu efeito, uma vez que Júlio Camargo se viu compelido a reunir-se com Fernando Soares e com o próprio Eduardo Cunha, em 18 de setembro de 2011, ocasião em que Júlio Camargo concordou em pagar as quantias prometidas tanto ao denunciado quanto a Fernando Soares, utilizando-se, para isso, dos serviços criminosos de Alberto Youssef. 14. Como já descrito, as declarações prestadas por Júlio Camargo, Alberto Youssef e Fernando Soares, tanto no âmbito de colaboração premiada, como já em juízo, na primeira instância, convergem com a descrição fática narrada na segunda parte da denúncia. Alberto Youssef, em depoimento judicial já mencionado, declarou: “Interrogado:- […] Eu fui chamado em 2011 pelo Doutor 50 Em elaboração INQ 3983 / DF Júlio Camargo, aonde o Dr. Júlio se encontrava muito preocupado e me relatou que o Fernando Soares, através do Deputado Eduardo Cunha, havia pedido alguns requerimentos de informações referentes aos contratos da Mitsui, da Toyo e próprio dele Júlio Camargo, através de outros deputados […] [...] Interrogado:- [Júlio Camargo] Contou do aluguel dos navios, não me deu detalhes e sim me disse que a Samsung havia parado de pagá-lo e por isso ele parou de pagar e por conta disso ele estava sendo retaliado. [...] Interrogado:- […] Aí ele me relatou sobre o assunto do Fernando sobre o aluguel das sondas, sobre o requerimento e pediu que eu procurasse o Fernando, para que eu o acalmasse que ele ia conversar com ele e ia retomar o pagamento. Assim eu fiz. Conversei com o Fernando. O Fernando acalmou e, logo em seguida, posteriormente, ele [Júlio Camargo] fez um depósito de dois milhões e alguns dólares, dois cento e pouco na conta da RFY no HSBC de Hong Kong, controlada pelo senhor Leonardo Meireles. Eu peguei esses reais uma parte mandei pelo Jaime, que entregasse ao Fernando Soares no Rio de Janeiro, no seu escritório na Rio Branco e o restante eu pedi também que o Jaime levasse, mas aí eu. Pessoalmente, fui junto e entreguei esses valores. Juiz Federal:- Para o Fernando Soares? Interrogado:- Sim. E isso foi em torno de quatro milhões e pouco de reais, que era mais ou menos o que dava os valores em dólares, que ele me remeteu. Juiz Federal:- Como o seu repassou os valores para o Senhor Fernando Soares? Interrogado:- Eu repassei em reais vivos. […] Juiz Federal:- [...] Quando o senhor conversou lá com o Júlio Camargo, sobre as operações, ele mencionou quem eram os beneficiários das operações ou ele falou só no Fernando Soares? 51 Em elaboração INQ 3983 / DF Interrogado:- Falou no Fernando Soares e contou a história da pressão que o Eduardo Cunha tava fazendo para que ele pudesse pagar o Fernando Soares, dando entendimento que esse valor fosse também, na época, para o Deputado” (fl. 711 – evento 415). Júlio Camargo também declarou que, após cessados os pagamentos a Fernando Soares, sofreu forte pressão deste e do Deputado Eduardo Cunha, inclusive por meio de requerimentos elaborados pela denunciada Solange Almeida e apresentados por ela na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados: “QUE explicou para FERNANDO SOARES que havia um problema contratual e que a SAMSUNG estava se negando a pagar os valores; […] QUE, porém, FERNANDO SOARES disse que estava ficando preocupado e afirmou: ‘Eu tenho os meus compromissos do meu lado, que são irrevogáveis e eu não posso dar este tipo de explicação que você está me dando’; […] QUE, em momento seguinte, por volta de uma semana depois, FERNANDO SOARES ligou para o declarante solicitando uma nova reunião; QUE FERNANDO SOARES disse: ‘Estou vindo na qualidade de seu amigo e na última vez disse que tinha compromissos inadiáveis e quero te dizer o seguinte: Eu tenho um compromisso com o Deputado EDUARDO CUNHA’; QUE FERNANDO SOARES disse que tinha um saldo a pagar de US$ 5 milhões para o Deputado EDUARDO CUNHA, em razão deste ‘pacote’ das sondas; QUE não sabe quanto já tinha sido pago, mas o valor restante seria de US$ 5 milhões para EDUARDO CUNHA; QUE FERNANDO SOARES disse ao declarante que estava preocupado, pois EDUARDO CUNHA havia dito a FERNANDO SOARES que iria fazer um requerimento na Câmara em relação ao declarante e às diversas empresas que o declarante representava; QUE, em outras palavras, FERNANDO SOARES já nesta oportunidade alertou o declarante de que poderia haver uma requisição da Câmara para o declarante e para as empresas que o declarante representava; QUE no momento entendeu que a requisição da 52 Em elaboração INQ 3983 / DF Câmara partiria de EDUARDO CUNHA; QUE FERNANDO SOARES disse que EDUARDO CUNHA criaria dificuldades com os contratos já firmados e os ainda em negociação na PETROBRAS, de interesse do declarante; […] QUE FERNANDO SOARES, então, foi embora e, cerca de dez ou quinze dias depois, o Diretor TAKAGI, da MITSUI no Rio de Janeiro, procurou o declarante com uma requisição da Deputada SOLANGE ALMEIDA para o Ministro das Minas e Energia, EDISON LOBÃO; QUE tal requisição solicitava que todos os contratos da MITSUI com a PETROBRAS fossem alvo de verificação por parte dos órgãos competentes; QUE a ameaça então se concretizou; QUE não conhecia até então a Deputada SOLANGE ALMEIDA e nem sequer tinha ouvido falar dela; […] QUE TAKAGI estava bastante assustado, mas o declarante não tinha ainda muita consciência das consequências daquele requerimento; QUE, porém, ficou também assustado com o requerimento, embora já tivesse sido ameaçado a respeito” (fls. 832-850). Fernando Soares, por sua vez, apresentou a mesma versão dos outros colaboradores, esclarecendo ainda que, de fato, procurou Eduardo Cunha para que este pressionasse Júlio Camargo a retomar os pagamentos, oferecendo ao deputado, inicialmente, 20% (vinte por cento) dos valores devidos para usar o seu nome e, num segundo momento, 50% (cinquenta por cento) para que o parlamentar exercesse uma pressão mais incisiva: “QUE posteriormente, ainda em 2010, veio a ideia de pedir ajuda a EDUARDO CUNHA na cobrança da dívida que JULIO CAMARGO tinha com o depoente; QUE então voltou a ter outra conversa com EDUARDO CUNHA, em 2010, no escritório dele no Rio de Janeiro, oportunidade em que o depoente explicou a EDUARDO CUNHA tudo o que tinha ocorrido na contratação das duas sondas (PETROBRAS 10.0000 e VITÓRIA 1 0.000) e que JÚLIO CAMARGO tinha uma dívida com o depoente; QUE disse a EDUARDO CUNHA que esta 53 Em elaboração INQ 3983 / DF dívida girava em tomo de US$ 16 milhões de dólares na época; […] QUE o depoente disse a EDUARDO CUNHA que, do valor devido por JÚLIO CAMARGO, caso lograsse obter o pagamento, repassaria 20% para a campanha dele; QUE EDUARDO CUNHA deu o de acordo e autorizou o depoente a usar o nome dele para cobrar os valores devidos de JÚLIO CAMARGO […] QUE disse a JÚLIO CAMARGO que EDUARDO CUNHA estava lhe cobrando de maneira bastante contundente e disse a JÚLIO CAMARGO que o PMDB estava achando que o depoente havia recebido o valor e não estaria pagando a parte deles; […] QUE JULIO CAMARGO foi ganhando tempo, dizendo que ainda não tinha uma posição; […] QUE já em 2011, a partir de março, o depoente teve nova reunião na residência de EDUARDO CUNHA; QUE nesta reunião, o depoente perguntou se não poderia ser retomado o assunto de JÚLIO CAMARGO e o que EDUARDO CUNHA poderia fazer algo; QUE, embora em um primeiro momento o acordo fosse de apenas usar o nome de EDUARDO CUNHA, nesta reunião o depoente falou para EDUARDO CUNHA que seria necessário uma pressão mais forte, como uma reunião em que ele estivesse presente ou outra coisa do tipo; QUE então o depoente propôs a EDUARDO CUNHA que, do valor que deveria receber na época, iria repassar 50% do que recebesse de JÚLIO CAMARGO para EDUARDO CUNHA; QUE o valor era, conforme dito, de US$ 16 milhões na época, sendo que parte deste valor o depoente iria repassar para funcionários da PETROBRAS; QUE EDUARDO CUNHA disse que iria pensar em alguma forma mais efetiva de cobrar JÚLIO CAMARGO […] QUE um tempo depois, por volta de abril de 2011, EDUARDO CUNHA mandou uma mensagem, pedindo para o depoente se encontrar com ele no escritório do Rio de Janeiro de EDUARDO CUNHA; QUE nesta reunião EDUARDO CUNHA disse ao depoente que havia tomado a decisão de fazer um requerimento na Comissão de Fiscalização da Câmara, pedindo explicações sobre os negócios de JÚLIO CAMARGO; QUE então EDUARDO CUNHA pediu ao depoente explicações 54 Em elaboração INQ 3983 / DF mais detalhadas sobre os negócios de JÚLIO CAMARGO junto à PETROBRAS; QUE o depoente afirmou que o negócios das sondas era algo pontual de JÚLIO CAMARGO e que ele não era um representante exclusivo da SAMSUNG; QUE esclareceu a EDUARDO CUNHA que os negócios mais importantes de JÚLIO CAMARGO era a atuação dele como representante da MITSUI e da TOYO junto à PETROBRAS; […] QUE com base nas informações prestadas pelo depoente sobre JÚLIO CAMARGO, EDUARDO CUNHA disse ao depoente que faria alguns outros levantamentos de informações e comunicaria o depoente sobre os próximos passos; QUE, um tempo depois que não sabe especificar, o EDUARDO CUNHA disse ao depoente que iria preparar um requerimento junto à Comissão de Fiscalização da Câmara, pedindo informações sobre a atuação de JÚLIO CAMARGO como lobista da MITSUI e da TOYO junto à PETROBRAS; QUE neste requerimento, EDUARDO CUNHA disse que pediria informações não apenas sobre a atuação de JÚLIO CAMARGO como lobista destas empresas, mas também sobre os contratos destas empresas junto à PETROBRAS; QUE o depoente pediu para EDUARDO CUNHA lhe dar um tempo, pois iria tentar obter urna última ação junto ao JÚLIO CAMARGO para obter o pagamento dos valores, fazendo menção a tais requerimentos que iriam ser feitos; QUE EDUARDO CUNHA concordou com isto; QUE cerca de uma semana depois, o depoente teve contato com JÚLIO CAMARGO pessoalmente no escritório dele, na Rua da Assembleia, e explicou toda a situação; QUE disse a JÚLIO CAMARGO que estava ‘vindo como amigo’ e que EDUARDO CUNHA havia chegado ao limite e não estava mais disposto a dar mais tempo ao depoente; QUE disse a JÚLIO CAMARGO que, se não tivesse uma posição dentro de uma semana, de que JÚLIO iria pagar, o depoente iria lavar as suas mãos e a questão seria resolvida pelo pessoal como eles achassem melhor; QUE inclusive fez menção a JÚLIO CAMARGO à possibilidade dos requerimentos na Câmara dos Deputados; […] QUE então comunicou a EDUARDO CUNHA que não tinha obtido sucesso 55 Em elaboração INQ 3983 / DF e ele disse que iria seguir em frente com a estratégia dos requerimentos; QUE EDUARDO CUNHA não comentou se seria ele quem apresentaria os requerimentos pessoalmente e apenas comentou que faria os requerimentos; QUE EDUARDO CUNHA não comentou detalhes de como seria feito o requerimento” (fls. 2.026-2.046). Ao longo das investigações, foi identificado que, realmente, em 7.7.2011, houve apresentação dos requerimentos 114/2011 e 115/2011 pela acusada Solange Almeida, então deputada federal, perante a Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara dos Deputados, justamente com a finalidade de requisitar, ao Ministério de Minas e Energia, “informações e cópia do todos os contratos, aditivos e respectivos processos licitatórios, envolvendo o Grupo Mitsui e a Petrobras e suas subsidiarias no Brasil ou no Exterior” (fl. 375), e, ao Tribunal de Contas da União, “informações sobre auditorias feitas aos contratos do Grupo Mitsui com a Petrobras ou qualquer das suas subsidiárias no Brasil e no exterior” (fl. 394). Os referidos requerimentos foram aprovados e ensejaram os pedidos de informações, conforme se verifica dos documentos constantes às fls. 375- 409, assim como da ata da sessão da aludida Comissão (fls. 1.302-1.311). 15. Diz a acusação que, embora nos requerimentos conste a assinatura da denunciada Solange Almeida e tenha ela protocolado o documento nos sistemas da Câmara dos Deputados, o autor intelectual e material dos documentos foi o próprio Deputado Federal Eduardo Cunha. Conforme análise realizada na Informação 126/2015 (fls. 37-51 – apenso 3) e na Informação 141/2015 da Secretaria de Pesquisa e Análise – SPEA/PGR (fls. 4-11 – apenso 2), consta no campo autor dos arquivos dos mencionados requerimentos 114/2011 e 115/2011, de forma incontestavelmente convergente, o nome “Dep. Eduardo Cunha”. Realizou-se, ainda, no mesmo documento, uma análise de todos os requerimentos apresentados por Solange de Almeida na Câmara dos Deputados, no período em que exerceu o mandato, concluindo-se que os únicos arquivos em que consta o Deputado Federal Eduardo Cunha como 56 Em elaboração INQ 3983 / DF autor são exatamente os requerimentos 114/2011 e 115/2011 apresentados na dita Comissão de Fiscalização Financeira e Controle. Além disso, identificou-se que os mencionados requerimentos destoavam dos usualmente apresentados pela denunciada quanto à forma e, principalmente, em relação ao conteúdo. Por oportuno, destacam-se os seguintes trechos da Informação 141/2015: “Foram analisados todos os 32 (trinta e dois) requerimentos formulados por Solange Almeida, quando no exercício do mandato de Deputada Federal, entre os anos de 2007 e 2011, os quais são demonstrados na tabela a seguir: […] Como se vê na tabela anterior, dos 32 (trinta e dois) requerimentos apresentados por Solange Almeida, os dois únicos arquivos.pdf em que apareceu o nome ‘Dep. Eduardo Cunha’ no campo autor foram os requerimentos nos 114 e 115/2011, alusivos ao Grupo Mitsui e Petrobras. A maioria dos requerimentos apresentados por Solange Almeida refere-se a temas ligados a área de saúde, o que pode ser explicado pelo fato da parlamentar ser médica veterinária. De todos os requerimentos analisados, apenas 6 (seis) foram apresentados a Comissão de Fiscalização Financeira e Controle, sendo: - 02 (dois) de março de 2009 e tratam da convocação de audiências públicas para a aplicação dos recursos do FUST e do FUNSET; - 01 (um) de abril de 2010, subscrito coletivamente e visava à convocação de Ministro de Estado e do Presidente da CEF para esclarecer o excesso de burocracia e de demora na aprovação de convênio, construções e licitações que envolvessem recursos destinados a emendas parlamentares; - 01 (um) de agosto de 2010 convidando dirigentes da ECT; - 02 requerimentos de julho de 2011 solicitando ao Ministro de Minas e Energia cópias de todos os contratos, aditivos e respectivos processos licitatórios do grupo Mitsui 57 Em elaboração INQ 3983 / DF com a Petrobras e suas subsidiárias no Brasil e no Exterior e solicitando ao TCU informações sobre auditorias nesses contratos. Dos 32 (trinta e dois) requerimentos analisados, apenas 3 (três) não tiveram por objeto a convocação de audiências publicas, convite para comparecimento de autoridades para debates e esclarecimentos e solicitação de tramitação conjunta e retirada de pauta: - Req. 5383/2009, que visava a criação de Frente Parlamentar de Defesa dos Hospitais Universitários e de Ensino; - Req. 114 e 115/2011, alusivos ao Grupo Mitsui e a Petrobras, citados nos itens ‘28’ e ‘29’ da tabela apresentada. Os requerimentos referentes ao Grupo Mitsui e a Petrobras apresentam, portanto, em seu conteúdo e escopo, desvio do padrão de objeto dos requerimentos usualmente apresentados pela Deputada Solange Almeida em toda a sua trajetória no Congresso Nacional, considerando que jamais apresentou requerimentos solicitando a órgãos públicos informações ou de cópia de documentos. Pela que se percebe da análise das ementas dos requerimentos de Solange Almeida, seu perfil de atuação nessa esfera de atuação e no sentido de fomentar debates e audiências públicas e não apurar possíveis irregularidades. Já o Deputado Federal Eduardo Cunha valeu-se de requerimentos para solicitar informações e cópia de documentos a órgãos públicos em número considerável, como mostram os documentos apresentados no anexo 2. Em 2004, o parlamentar apresentou o requerimento n° 137 a Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática para que o Conselho da ANATEL emitisse manifestação formal sobre a alienação do controle acionário da Embratel. Em 2005, apresentou o requerimento n° 91 à Comissão de Finanças e Tributação solicitando que determine ao TCU uma extensão da auditoria das reservas cambiais brasileiras, nos moldes do Proc. TC 012118-96-6, até a data de 31/08/2005. Em 2011, apresentou 58 Em elaboração INQ 3983 / DF requerimento n° 192 à Comissão de Fiscalização Financeira e Controle solicitando informações ao Ministro da Fazenda, Sr. Guido Mantega, sobre o volume de FCVS já homologados pela CEF e novados pelo Tesouro Nacional. Também em 2011 apresentou requerimento n° 175 solicitando ao Tribunal de Contas da União cópia de todos os documentos que comprovassem auditorias na Funasa, no período de janeiro de 2007 a abril de 2010. Além do aspecto temático, também chamou a atenção as diferenças quanto ao aspecto formal dos requerimentos apresentados por Solange Almeida e Eduardo Cunha. Os requerimentos alusivos ao Grupo Mitsui e Petrobras apresentam, no aspecto formal, ao menos duas vertentes de desvio do padrão dos requerimentos apresentados por Solange Almeida em sua trajetória como congressista. A primeira observação é que além dos requerimentos n°s 114 e 115/2011 referentes ao Grupo Mitsui e Petrobras, a parlamentar empregou em apenas 4 (quatro) outros requerimentos (n°s 105/2007, 451/2009, 453/2009 e 12/2011) a palavra ‘justificação’ para intitular o segmento do texto que fundamenta o requerimento, enquanto em todos os demais requerimentos ou não houve estrutura de título ou utilizou a palavra ‘justificativa’. A segunda importante observação e que antes de 2011, a Deputada Solange Almeida nunca concluiu seus requerimentos com o pedido de ‘apoio dos nobres Pares para aprovação deste requerimento’, o que passou a ser frequente após a apresentação dos requerimentos alusivos ao Grupo Mitsui e a Petrobras, citados nos itens ‘28’ e ‘29’ da tabela 3. Já em diversos requerimentos apresentados pela Deputado Eduardo Cunha, foram encontradas essas duas características formais. Em vários requerimentos por ele formulados entre os anos de 2008 e 2013 foram utilizados o segmento de fundamentação intitulado como ‘justificação’ e em pela menos 05 (cinco) requerimentos de sua autoria apresentados nos anos de 2011 e 2012, as quais seguem no 59 Em elaboração INQ 3983 / DF anexo 3, trazem, na conclusão, o pedido de apoio de seus pares” (fls. 4-11 – apenso 2). Além disso, em cumprimento a medida cautelar deferida nos autos da AC 3.865 (apenso 3), a Diretoria-Geral da Câmara dos Deputados prestou informações (fls. 860-877), esclarecendo que os arquivos em que constam os requerimentos apresentados pela denunciada Solange Almeida registram em seus metadados, como autor, o “Dep. Eduardo Cunha”, assim como não foram alterados quando de sua criação e inserção nos sistemas eletrônicos da Câmara, além de certificar que no dia e horário de criação dos referidos documentos, em que consta como autor o Deputado Federal Eduardo Cunha, este parlamentar estava logado com seu usuário e senha nos sistemas daquela Casa Legislativa: “FORAM identificados registros que atestam que a conta de usuário em nome de Eduardo Cosentino da Cunha (Deputado Federal) estava logada no Sistema Active Directory da Câmara dos Deputados no dia 07/07/2011 entre 11h58 e 12h19, período que compreende os supostos horários de criação dos documentos (12h02 e 12h05) conforme metadados dos arquivos originais no formato .doc obtidos do sistema Autenticador” (fl. 876). Em depoimento prestado à Procuradoria-Geral da República, o então Diretor do Centro de Informática da Câmara dos Deputados, Luiz Antonio Souza da Eira (fls. 880-888) declarou o seguinte: “Que no caso de EDUARDO CUNHA, o nome cadastrado dele no Serviço de Diretório é DEP. EDUARDO CUNHA; Que a autenticação - ou seja, a informação do autor é feita por meio de uma senha, pessoal e intransferível; Que o autenticador, como é um sistema, necessita de um login da máquina; Que o declarante ressalta que [...] foi sim a Deputada SOLANGE ALMEIDA, ou seja, foi esta Deputada que incluiu no sistema o arquivo; Que, porém é a deputada quem teria que explicar por 60 Em elaboração INQ 3983 / DF qual motivo consta o nome DEP. EDUARDO CUNHA no documento; Que, questionado se o Deputado EDUARDO CUNHA enviasse um documento elaborado com seu login para o gabinete da Deputada SOLANGE ALMEIDA, para que autenticasse, aparecia o documento como saiu na imprensa, responde que sim”. Os indícios, conforme aponta a acusação, são consistentes no sentido de que a finalidade dos requerimentos seria mesmo pressionar Júlio Camargo, o interessado na contratação com a Petrobras, mediante informações repassadas por Fernando Soares a Eduardo Cunha, já que à época não havia notícia de suspeitas de irregularidades envolvendo a Mitsui, Júlio Camargo ou seus contratos com a Petrobras, conforme relatório de pesquisa juntado aos autos (fls. 1.232-1.270). A denúncia assevera, também, que Solange Almeida atuou com plena ciência de sua finalidade ilícita, tendo em vista a relação de proximidade política entre ambos, o que viria demonstrado pelo mútuo apoio em campanhas políticas, conforme documentos juntados (fls. 1.313- 1.394). 16. Segundo a acusação, após a apresentação dos requerimentos na referida Comissão, Júlio Camargo decidiu procurar Paulo Roberto Costa, solicitando seu auxílio para uma reunião com o então Ministro de Minas e Energia, Senador Edison Lobão, marcada para 31.8.2011 na Base Aérea do aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro (fls. 832-850). Paulo Roberto Costa, aliás, confirmou a dita reunião (fls. 1.284-1.288). As declarações desses colaboradores são confirmadas pelos registros de entrada e saída na sede da Petrobras (fls. 1.642) e na Base Aérea Santos Dumont (fls. 217-289), que indicam que Júlio Camargo esteve nesses locais na data mencionada, assim como da agenda de compromissos de Edison Lobão (fls. 1728-1730). Júlio Camargo também afirma que, durante a reunião com Edison Lobão, tão logo mencionou os requerimentos da então Deputada Solange Almeida, o Senador Lobão, de imediato, encaminhou, como solução, 61 Em elaboração INQ 3983 / DF procurar o acusado Eduardo Cunha. Veja-se (fls. 832-850): “[...] disse que se considerava ‘amigo do PMDB’ e que ficou surpreso com um requerimento da Deputada SOLANGE, solicitando todos os contratos da MITSUI para serem apurados, inclusive da atuação do declarante; QUE, de imediato, LOBÃO disse espontaneamente: ''Isto é coisa de EDUARDO", referindose ao Deputado EDUARDO CUNHA; QUE não sabe por qual motivo o Ministro LOBÃO fez esta ligação imediata entre o requerimento assinado pela Deputada SOLANGE ALMEIDA e EDUARDO CUNHA; QUE reitera, porém, que este link foi feito imediatamente pelo Ministro EDISON LOBÃO, sem que o declarante tenha feito qualquer menção ao nome de EDUARDO CUNHA; QUE o declarante apenas havia dito ao Ministro que o requerimento era da Deputada SOLANGE ALMEIDA; QUE imediatamente o Ministro LOBÃO, na frente do declarante, pegou o telefone celular e ligou para EDUARDO CUNHA e disse: ‘EDUARDO, eu estou com o JULIO CAMARGO aqui ao meu lado, você enlouqueceu?’; QUE não sabe o que ele respondeu, mas LOBÃO disse que não iria continuar a conversa e era para EDUARDO CUNHA procurar o Ministro Lobão no seu gabinete, no dia seguinte, no Ministério das Minas e Energia”. Essa declaração de Júlio Camargo está em consonância também com as cópias da agenda de compromissos do então Ministro Edison Lobão, que revela a realização de uma reunião com Eduardo Cunha em 5.9.2011, ocorrida poucos dias, cinco mais precisamente, depois de ter encontrado Júlio Camargo (fls. 1.731-1733). 17. Ademais, há nos autos declarações de Júlio Camargo, no sentido de que, apesar de ter levado o assunto a Edison Lobão, as pressões não cessaram, tendo decidido, por isso, efetuar os pagamentos solicitados em reunião realizada com Eduardo Cunha e Fernando Soares para tratar do assunto e dos valores em detalhes: 62 Em elaboração INQ 3983 / DF “FERNANDO SOARES retornou a solicitação e foi ao escritório do Rio de Janeiro, dizendo que EDUARDO CUNHA aceitou ter a reunião com o declarante para resolver este assunto; QUE referida reunião ocorreu no final de 2011; QUE a reunião ocorreria na Avenida Afrânio de Melo Franco, n. 110, Rio de Janeiro, em um prédio chamado ‘Leblon Empresarial’ […] QUE FERNANDO SOARES passou o endereço e a data da reunião para o declarante, que ocorreria em um domingo, aproximadamente 19 horas; […] QUE ao chegar ao local da reunião, ligou para FERNANDO SOARES, que ainda não se encontrava no local; QUE FERNANDO SOARES pediu ao declarante para aguardar alguns minutos, pois já estava chegando; QUE pouco depois, cerca de 20 minutos depois, FERNANDO SOARES chegou conduzindo um veículo Toyota Hilux SW4, juntamente com o Deputado EDUARDO CUNHA […] QUE FERNANDO SOARES tinha a chave do local; […] QUE então o deputado EDUARDO CUNHA se apresentou e disse: ‘JULIO, em primeiro lugar eu quero dizer que não é nenhum problema pessoal em relação a você. O problema que eu tenho é com o FERNANDO e não com você. Acontece que o FERNANDO não me paga porque diz que você não o paga. Como o FERNANDO não tem capacidade de me pagar, eu preciso que você me pague’; […] QUE EDUARDO CUNHA disse: ‘Eu não sei da história e nem quero saber. Eu tenho um valor a receber do FERNANDO SOARES e que ele atrelou a você’; QUE EDUARDO CUNHA continuou: ‘Eu ainda tenho a receber US$ 5 milhões de dólares em relação a este 'pacote’; QUE EDUARDO CUNHA tinha consciência de que os valores eram relacionados à PETROBRAS e mais especificamente às sondas; QUE neste momento o declarante procurou focar a negociação e disse a EDUARDO CUNHA: ‘Vamos resolver entre nós os cinco milhões de dólares faltantes’; QUE EDUARDO CUNHA disse: ‘Eu não aceito esta condição, pois não é justo eu resolver apenas a minha parte e não resolver a parte do FERNANDO’ […] QUE o declarante disse a EDUARDO CUNHA: ‘Vamos sair daqui com o valor estimado de US$ 10 milhões de dólares, cinco para você e cinco para FERNANDO’; QUE então 63 Em elaboração INQ 3983 / DF EDUARDO CUNHA perguntou a opinião de FERNANDO SOARES e este concordou com estes termos; […] QUE EDUARDO CUNHA perguntou como seria feito o pagamento, oportunidade em que o declarante disse que provavelmente procuraria ALBERTO YOUSSEF para que providenciasse o pagamento para ambos; QUE foi aceita tal forma de pagamento […] QUE EDUARDO CUNHA disse ao declarante para acertar com FERNANDO SOARES os detalhes dos pagamentos e para acertarem o quanto antes como ocorreriam […] QUE inclusive o declarante chegou a tratar do requerimento feito na Câmara com EDUARDO CUNHA durante a reunião, assim como a ligação do Ministro LOBÃO, e perguntou a EDUARDO CUNHA como se encerraria esta questão do requerimento; QUE então EDUARDO CUNHA disse para não se preocupar, pois somente iriam receber a documentação e iriam encerrar; QUE ficou nítido na reunião que o requerimento na Câmara partiu de EDUARDO CUNHA” (fls. 831-850). As declarações de Júlio Camargo, no ponto, convergem, mais uma vez, com as de Fernando Soares, que confirmou a existência da reunião e o acordo realizado sobre os valores a serem repassados: “QUE JÚLIO CAMARGO sugeriu um encontro entre o depoente, JÚLIO CAMARGO e EDUARDO CUNHA, porque ele queria fazer uma negociação e esclarecer ao EDUARDO CUNHA o motivo dos não pagamentos; […] QUE em seguida falou com EDUARDO CUNHA, que aceitou realizar a reunião; QUE questionado sobre a data da referida reunião, inicialmente afirmou acreditar que tenha ocorrido em meados de agosto de 2011; QUE, ao ser questionado se referida reunião não poderia ter ocorrido, em verdade, em setembro de 2011, mais especificamente, no dia 18 de setembro de 2011, o depoente acredita que realmente possa ter se equivocado, pois em geral em julho o depoente está viajando e se trata de recesso parlamentar; QUE, assim, revendo, acredita que a reunião com PAULO ROBERTO COSTA tenha sido em final de agosto e 64 Em elaboração INQ 3983 / DF início de setembro de 2011, e a reunião com JÚLIO CAMARGO ter ocorrido na primeira quinzena de setembro; QUE a reunião entre o depoente, EDUARDO CUNHA e JÚLIO CAMARGO foi realmente marcada para um domingo; QUE o depoente marcou esta reunião no escritório de um advogado do depoente, SERGIO, ROBERTO WEYNE COSTA, que fica no Leblon, na Ataulfo de Paiva, esquina com Afrânio de Melo Franco; […] QUE o depoente passou o endereço do escritório para JÚLIO CAMARGO e agendamos de se encontrar por volta das 19h ou 20 horas; QUE JÚLIO CAMARGO viria de São Paulo para a reunião; QUE no domingo o depoente foi buscar EDUARDO CUNHA na residência dele e, inclusive, o avisou por mensagem de celular, que estava indo buscá-lo; QUE o depoente é quem estava conduzindo o seu veículo, que era uma Rand Rover; QUE referido veículo estava em nome da sua empresa, da HAWK EYES ou TECHINIS; QUE questionado se o veículo possuía placas EIZ 8877, confirma que sim; QUE após pegar EDUARDO CUNHA se dirigiram ao local e pararam o veículo no estacionamento que fica exatamente ao lado do edifício, no Shopping RIO DESIGN CENTER; […] QUE na reunião, ficou claro a JÚLIO CAMARGO que metade do valor devido fosse para EDUARDO CUNHA; QUE, inclusive, JÚLIO CAMARGO inicialmente queria pagar apenas a parte de EDUARDO CUNHA, deixando para pagar posteriormente o valor de FERNANDO SOARES; QUE EDUARDO CUNHA não aceitou de maneira alguma e disse que JÚLIO CAMARGO deveria fazer o acerto de ambos; QUE, no final, ficou acertado o pagamento de dez milhões de dólares, que seria feito de maneira parcelada; […] QUE JÚLIO CAMARGO disse que iria arrumar uma forma de entregar os valores em espécie para o depoente, para que repassasse a EDUARDO CUNHA; […] QUE posteriormente teve um encontro com JULIO CAMARGO no escritório dele, no Rio de Janeiro umas duas semanas depois, no qual ele disse que o depoente iria ser procurado por YOUSSEF, que se encarregaria de fazer os pagamentos em espécie que corresponderiam aos valores repassados a EDUARDO 65 Em elaboração INQ 3983 / DF CUNHA; […] QUE em relação às quantias em espécies, ALBERTO YOUSSEF entrou em contato com o depoente, oportunidade em que marcaram uma reunião pessoalmente […] QUE YOUSSEF veio e disse ao depoente que recebeu instruções de JÚLIO CAMARGO, para repassar ao depoente valores em torno de sete milhões de reais; QUE YOUSSEF disse que ainda estava operacionalizando isto, pois estava aguardando a realização de transferências de JÚLIO CAMARGO para YOUSSEF” (fls. 2.026-2.046). Também aqui a acusação trouxe aos autos elementos probatórios indicativos da realização da reunião no dia 18.9.2011, entre 18h e 21h, no Rio de Janeiro, no local informado pelos colaboradores. Em depoimento, João Luiz Cavalheiro, motorista de Júlio Camargo, informa que o conduziu na data e para o local descrito pelos colaboradores (fls. 1.419- 1.424). Consta do inquérito, ainda, que na referida data Eduardo Cunha estava no Rio de Janeiro, conforme análise da utilização da cota de passagens aéreas na Câmara dos Deputados (fls. 1.685-1.687). Também foram juntados os registros de entrada e saída de veículos no estacionamento no Shopping Rio Design Leblon, que informam a permanência de um veículo em nome das empresas de Fernando Soares, na mesma data e horário descrito pelos colaboradores (fl. 1.820). A presença de Fernando Soares no local foi também indicada pelas informações de localização geográfica constantes dos registros telefônicos do terminal por ele utilizado, as quais atestam sua presença na região do local em que se realizou a referida reunião justamente no dia e horário mencionados (fls. 1.533-1.543). 18. No que se refere aos pagamentos e à forma de disponibilização dos valores, a acusação sustenta que Júlio Camargo se valeu do auxílio de Alberto Youssef para repassar o montante dos dez milhões de dólares acordados, metade dos quais a Eduardo Cunha. Segundo a denúncia, os recursos foram transferidos por meio de quatro processos distintos de lavagem: (a) transferência de conta de Júlio Camargo na Suíça para contas 66 Em elaboração INQ 3983 / DF das empresas RFY e DGX, de Leonardo Meirelles, um dos supostos integrantes da organização criminosa de Youssef; (b) simulação de prestação de serviços e transferência de valores para as empresas HAWK EYES ADMINISTRAÇÃO DE BENS LTDA., de propriedade de Fernando Soares; (c) transferências para a conta da empresa GFD INVESTIMENTOS, de Alberto Youssef; e (d) transferências para igreja evangélica, a pedido e sob orientação de Eduardo Cunha. 19. No ponto, a materialidade e os indícios de autoria relativos aos crimes de lavagem de dinheiro, elementos básicos para o recebimento da denúncia, também se encontram presentes. Depoimento prestado por Júlio Camargo no âmbito de colaboração premiada indica que, para operacionalizar suposto pagamento de parte da propina ao Deputado Eduardo Cunha, foram transferidos valores de sua conta na Suíça para empresas de Leonardo Meirelles, associado de Alberto Youssef (fls. 853- 854): “QUE, sobre as transferências internacionais de valores para as empresas RFY IMP. & EXP. LTD. e DGX IMP. & EXP. LTD., o declarante esclarece que foram feitas três transferências: a) uma no valor de US$ 2.350.044,06 para conta da empresa RFY IMP. & EXP. LTD. em 20/10/2011; b) uma no valor de US$ 2.350.052,31 também para conta da empresa RFY IMP. & EXP. LTD. em 08/06/2012; c) uma no valor de US$ 400.052,37 para conta da empresa DGX IMP. & EXP. LTD. em 26/07/2012; QUE essas três transferências foram feitas de uma conta mantida na Suíça, no BANCO CRAMER, em nome da empresa VIGELA ASSOCIATED S/A, offshore de propriedade do declarante; QUE o declarante forneceu os extratos bancários da conta da VIGELA ASSOCIATED S/ A ao Ministério Público Federal em Curitiba; QUE esses extratos bancários registram as transferências em questão; QUE essas transferências, somadas, representam pouco mais de US$ 5.000.000,00, valor que era cobrado no caso pelo Deputado Federal EDUARDO CUNHA; QUE o destino dessas transferências bancárias foi indicado por 67 Em elaboração INQ 3983 / DF ALBERTO YOUSSEF; QUE não sabia que as contas bancárias de destino pertenciam a empresas de LEONARDO MEIRELLES, doleiro que trabalhava com ALBERTO YOUSSEF, movimentando recursos no exterior”. Sobre a movimentação dos recursos, o colaborador Júlio Camargo esclareceu, ainda, que Meirelles efetuou a entrega dos valores em espécie a Alberto Youssef, que, por sua vez, repassou o montante a Fernando Soares, por meio de duas entregas no Rio de Janeiro, ambas realizadas por Jayme Alves de Oliveira (fl. 854). Nessa linha, Alberto Youssef confirmou, em depoimento prestado no âmbito de colaboração premiada, o suposto repasse de valores a Fernando Soares (fl. 737): “QUE houve um pagamento para FERNANDO SOARES, no valor de US$ 2,0 milhões, na HFY ou DGX, em Hong Kong, e o declarante fez o pagamento deste valor diretamente para FERNANDO SOARES, no escritório deste último”. Somada a isso, a tabela apreendida em posse de Alberto Youssef, denominada “Transcareca”, supostamente utilizada para documentar transações efetuadas por Jayme Oliveira Filho a mando de Youssef, registra a entrega de R$ 1.132.250,00 (um milhão, cento e trinta e dois mil, duzentos e cinquenta reais) a Fernando Soares, em junho de 2012 (fls. 711, Evento 2, pág. 6). Ainda sobre os aludidos pagamentos, Fernando Soares detalha em seu depoimento o repasse de cerca de R$ 7.000.000,00 (sete milhões de reais), a mando de Júlio Camargo, para o denunciado Eduardo Cunha (fls. 2.026-2.046): “QUE YOUSSEF veio e disse ao depoente que recebeu instruções de JÚLIO CAMARGO, para repassar ao depoente valores em torno de sete milhões de reais; QUE YOUSSEF disse que ainda estava operacionalizando isto, pois estava aguardando a realização de transferências de JÚLIO CAMARGO para YOUSSEF; QUE neste momento YOUSSEF 68 Em elaboração INQ 3983 / DF não especificou como seriam tais operações, mas um pouco depois ele disse ao depoente que se tratavam de transferências internacionais, feitas por JÚLIO para alguma empresa relacionada a YOUSSEF, mas não mencionou o nome das empresas envolvidas; Que Youssef disse ao depoente que, assim que estivessem formalizados tais pagamentos, entraria em contato com o depoente para a entrega dos valores; QUE aproximadamente duas ou três semanas depois, Youssef marcou uma ida dele ao escritório do depoente; QUE, então, YOUSSEF esteve no escritório do depoente juntamente com JAYME, a quem YOUSSEF chamava de CARECA; QUE nesta oportunidade YOUSSEF levou entre um milhão e um milhão e meio de reais em espécie, não se recordando ao certo; QUE YOUSSEF entregou a quantia como sendo o primeiro pagamento que estaria sendo realizado a pedido de JÚLIO CAMARGO; QUE conheceu JAYME nesta ocasião, sendo apresentado por YOUSSEF como sendo uma pessoa da total confiança de YOUSSEF, com quem trabalhava há bastante tempo com ele; QUE, inclusive, YOUSSEF comentou que os próximos pagamentos seriam feitos por JAYME diretamente e que não seria necessária a presença de YOUSSEF; QUE imediatamente o depoente fez contato com EDUARDO CUNHA por mensagem, avisando que havia um valor disponível, e perguntou a ele onde poderia entregar o valor; QUE EDUARDO CUNHA disse ao depoente para procurar, no escritório dele, na Nilo Peçanha, uma pessoa de nome ALTAIR; QUE, então, o depoente foi pessoalmente ao escritório de EDUARDO CUNHA, levando a quantia em espécie recebida, ou seja, entre um e um milhão e meio de reais; QUE questionado como era ALTAIR, respondeu que deve ter em torno de 1,75m de altura, pouco cabelo, já grisalho, com bigode, com idade de aproximadamente 60 anos; QUE ALTAIR aparentava ser um assessor ou uma pessoa de confiança, até mesmo porque todos os valores entregues no escritório foram para ALTAIR; QUE esta entrega ocorreu por volta de outubro de 2011; QUE, após isto, houve quatro ou cinco entregas, todas 69 Em elaboração INQ 3983 / DF feitas por JAYME, a maioria em seu escritório; QUE apenas uma vez JAYME foi entregar valores no condomínio do depoente; QUE JAYME, nesta ocasião, entregou o valor ao depoente na área comum do condomínio do depoente, não tendo subido ao apartamento; QUE acredita que estas entregas ocorreram até abril ou maio; QUE, no entanto, questionado ao depoente acerca do documento intitulado ‘Transcareca’ - elaborado e apreendido em poder de ALBERTO YOUSSEF para documentar as entregas feitas por Jayme Careca – sobre uma entrega ocorrida no dia 15 de junho de 2012, no valor de R$ 1.132.250,00, tendo como destinatário ‘Baiano’, o depoente acredita que realmente a pessoa de ‘Baiano’ mencionada seja o depoente e que faça referência a última entrega feita por Jayme; Que acabou se aproximando de Jayme e, após, pediu a ele para fazer entregas para o depoente; QUE em todos estes casos, o depoente recebia os valores e em pouco tempo os repassava para EDUARDO CUNHA; QUE todos os valores sempre no escritório de EDUARDO CUNHA, para a pessoa de ALTAIR; QUE apenas uma oportunidade EDUARDO CUNHA pediu para uma pessoa retirar os valores no escritório do depoente; QUE esta pessoa não era ALTAIR mas era um homem que possuía um nome diferente e que também trabalhava no escritório dele, pois já o tinha visto no escritório de EDUARDO CUNHA em outras oportunidades; QUE não sabe por qual motivo EDUARDO CUNHA mandou esta pessoa neste caso; QUE se recorda que, em relação ao valor entregue na residência do depoente por JAYME”. Ainda sobre entregas de valores para Eduardo Cunha, Fernando Soares confirmou que foram realizadas em espécie para a pessoa de Altair Alves Pinto em cerca de seis oportunidades, tendo identificado tal intermediário mediante reconhecimento fotográfico: “QUE mostrada a fotografia em anexo, o depoente espontaneamente identificou como sendo a pessoa de ALTAIR, anteriormente mencionada no Termo de Colaboração n. 3: QUE 70 Em elaboração INQ 3983 / DF se trata da pessoa de ALTAIR ALVES PINTO, conforme dados qualificativos em anexo: QUE ALTAIR, conforme o depoente já esclareceu no Termo de Colaboração n. 03, é a pessoa que trabalhava para EDUARDO CUNHA e para quem o depoente fez diversas entregas de valores em espécie destinadas ao referido parlamentar: QUE reconhece ALTAIR sem qualquer sombra de dúvidas, até mesmo porque esteve diversas vezes pessoalmente com ele entre cinco e seis vezes” (fls. 2.075-2.076). A acusação destaca que Altair Alves Pinto possui vínculos com o Deputado Federal Eduardo Cunha, já o tendo visitado em seu gabinete na Câmara dos Deputados (fl. 2.092), além de constar como fornecedor dele em despesas declaradas na prestação de contas eleitorais apresentadas ao Tribunal Superior Eleitoral (fl. 2.083). 20. Elementos probatórios outros apontam para uma segunda operação destinada ao pagamento da propina ao Deputado Eduardo Cunha, realizada entre 21 de dezembro de 2011 e 30 de outubro de 2012, por meio de suposta simulação de contratos de prestação de serviços de consultoria e transferências das empresas Piemonte e Treviso, de Júlio Camargo, para as empresas Hawk Eyes e Techinis, de Fernando Soares, totalizando o montante de R$ 3.690.021,00 (três milhões, seiscentos e noventa mil e vinte e um reais), parcelados em dez operações financeiras, conforme consta do Relatório de Análise 90/2015 do Ministério Público (fls. 1.565-1.569), elaborado com base no exame dos extratos bancários das empresas ligadas a Júlio Camargo, obtidos pela acusação por meio de ordem judicial. 21. Com relação à terceira operação para suposta liquidação do saldo devido a Eduardo Cunha e Fernando Soares, o colaborador Júlio Camargo declarou que o repasse ocorreu mediante simulações de contratos de mútuo para investimento de suas empresas Piemonte, Treviso e Auguri na empresa GFD Empreendimentos, pertencente a Alberto Youssef, na quantia de R$ 11.700.000,00 (onze milhões e 71 Em elaboração INQ 3983 / DF setecentos mil reais): “QUE na semana subsequente chamou ALBERTO YOUSSEF no escritório do declarante e esclareceu como se dariam os pagamentos acordados com EDUARDO CUNHA; QUE o dec1arante pediu para que fosse dada preferência ao pagamento de EDUARDO CUNHA; QUE o declarante não possuía dinheiro no exterior suficiente para o pagamento; QUE YOUSSEF então disse ao declarante que havia uma empresa de investimentos, a GFD, e que o declarante poderia fazer um investimento nesta empresa; QUE YOUSSEF precisava de recursos para continuar fazendo os investimentos; QUE YOUSSEF, ao receber os valores na GFD, poderia entregar em reais para EDUARDO CUNHA e FERNANDO SOARES; QUE quem operacionalizou todo o pagamento dos valores foi ALBERTO YOUSSEF; QUE, então, o declarante fez transferências para a conta da GFD, aqui no Brasil, simulando contratos de investimento no Hotel em Aparecida, em um grupo de apartamentos em Curitiba e em um hotel na Bahia; QUE transferiu o montante total de R$ 11.700.000,00 para a GFD, dividido entre as empresas“ (fl. 847). Consta dos autos, ainda, transferência de R$ 530.918,57 (quinhentos e trinta mil, novecentos e dezoito reais e cinquenta e sete centavos) da Piemonte para a GFD, além da realização de contrato, em tese simulado, de mútuo entre a Treviso e a GFD, no valor de R$ 4.400.000,00 (quatro milhões e quatrocentos mil reais), dos quais R$ 2.550.000,00 (dois milhões, quinhentos e cinquenta mil reais) teriam sido quitados ficticiamente (fl. 711, evento 23, pág. 1). 22. O colaborador Júlio Camargo também declarou que realizou doações a uma Igreja Evangélica Assembleia de Deus, a pedido de Eduardo Cunha, como forma de saldar parte das quantias supostamente a ele devidas (fls. 854-855): 72 Em elaboração INQ 3983 / DF “[…] Que, em relação aos pagamentos feitos a Igreja Evangélica Assembleia de Deus, o declarante ressalta que, no ano de 2012, depois da realização das transferências internacionais para as empresas RFY e DGX e do posterior repasse dos correspondentes valores em reais por parte de Alberto Youssef a Fernando Soares no Brasil, este último procurou o declarante e disse que ainda faltava uma quantia a ser paga ao Deputado Federal Eduardo Cunha; Que Fernando Soares afirmou que, por orientação do Deputado Federal Eduardo Cunha, o declarante deveria realizar o pagamento desses valores a Igreja Evangélica Assembleia de Deus; Que Fernando Soares disse que pessoas dessa igreja iriam entrar em contato com o declarante; Que, realmente, uma pessoa de nome Renato Costa enviou um e-mail à secretária do declarante, de nome Camila Germano Bussi, repassando os dados bancários da Igreja Evangélica Assembleia de Deus para fins de efetivação dos pagamentos; Que o declarante não conhece Renato Costa, não sabendo de quem se trata; Que, na época, sua secretária Camila Germano Bussi repassou os dados da conta bancária da igreja para o declarante, que autorizou a tesouraria de suas empresas a efetuar o pagamento; Que foram feitas duas transferências para a Igreja Evangélica Assembleia de Deus: a) uma no valor de R$ 125,000,00 da empresa Piemonte em 31/08/2012; b) uma outra no mesmo valor de R$ 125,000,00 da empresa TREVISO na mesma data de 31/08/2012; Que Camila Germano Bussi não mais trabalha para o declarante; Que o declarante nunca havia feito anteriormente doações para a Igreja Evangélica Assembleia de Deus; Que, ao repassar as informações sobre o assunto a sua advogada, o declarante disse acreditar que outras empresas efetuaram doações para essa igreja porque supõe que isso tenha ocorrido e seja algo comum em circunstâncias normais, mas não dispõe de dados concretos a esse respeito; Que, no entanto, ressalta que as transferências das suas empresas Treviso e Piemonte para a Igreja Evangélica Assembleia de Deus consistiam em pagamento de propina para o Deputado Federal Eduardo Cunha; Que o declarante professa 73 Em elaboração INQ 3983 / DF a religião católica (Igreja Católica Apostólica Romana); Que nunca frequentou a Igreja Evangélica Assembleia de Deus; […]”. Convergentemente, relatório de Análise das movimentações bancárias das empresas ligadas a Júlio Camargo, realizado pelo Ministério Público, aponta dois pagamentos em favor da Igreja Evangélica Assembleia de Deus (fls. 1.501 – 1.503): “O primeiro pagamento de R$ 125.000,00 em 31/8/2012 para a Igreja Evangélica Assembleia de Deus foi feito a partir da conta n° 130001964, titularizada pela empresa Piemonte Empreendimentos Ltda., no Banco Santander. A Igreja Evangélica recebeu o dinheiro na conta n° 90840, agência 3137 do Banco Bradesco. […] O segundo pagamento de R$ 125.000,00 em 31/8/2012 para a Igreja Evangélica Assembleia de Deus foi feito a partir da conta n° 130003461, titularizada pela empresa Treviso do Brasil Empreendimentos Ltda. no Banco Santander. A Igreja Evangélica recebeu o dinheiro na mesma conta já informada”. Ademais, encontram-se juntados no inquérito os comprovantes das respectivas transferências e cópia de e-mail enviado a Júlio Camargo por representantes da referida Assembleia de Deus informando os dados bancários para pagamento (fls. 1.276-1.280). A vinculação de Eduardo Cunha à citada Igreja está devidamente indicada na inicial acusatória: “o diretor da referida igreja perante a Receita Federal é Samuel Cassio Ferreira, irmão de Abner Ferreira, Pastor da Igreja Assembléia de Deus Madureira, no Rio de Janeiro, que o denunciado frequenta. Foi nela inclusive que Eduardo Cunha celebrou a eleição para Presidência da Câmara dos Deputados, conforme amplamente divulgado na imprensa” (fl. 680). 23. Júlio Camargo narra que houve divergência entre ele e Eduardo 74 Em elaboração INQ 3983 / DF Cunha acerca do montante ainda devido, em razão de discordância acerca da taxa de câmbio aplicável na conversão de dólares para reais: Eduardo Cunha entendeu ter ainda a receber R$ 1.000,000 (um milhão de reais). Diante disso, Júlio Camargo esclareceu que pediu a Fernando Soares para assumir metade da dívida, mas ele, por sua vez, assumiu o pagamento de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais): “QUE, em determinado momento, aproximadamente entre o final de 2013 e começo de 2014, foi procurado por FERNANDO SOARES que lhe disse que ainda havia uma diferença a ser paga, decorrente de uma variação cambial referente aos 10 milhões de dólares que já teria pago como propina, que correspondia ao valor de 1 milhão de reais; QUE demorou praticamente dois anos para pagar os 10 minhões de dólares e, depois de ter, no seu entendimento, quitado esse valor, foi procurado por FERNANDO SOARES, que lhe informou a existência de uma diferença de 1 milhão de reais para ser pago a EDUARDO CUNHA; QUE nessa reunião, FERNANDO SOARES disse ao declarante que 1 milhão de reais seria da parte devida, pelo declarante, a EDUARDO CUNHA e que a parte devida a FERNANDO SOARES estava quitada; QUE a reunião entre o declarante e FERNANDO SOARES, onde trataram do assunto, aconteceu no escritório do declarante, no Rio de Janeiro, situado na Rua da Assembleia, n. 10, conjunto 3410; QUE, durante a reunião, a primeira reação do declarante foi de perplexidade e falou que não iria pagar, mas FERNANDO SOARES convenceu o declarante de que, para se livrarem desse problema, deveriam pagar o montante; QUE acertaram que parte dessa diferença seria paga pelo declarante e parte por FERNANDO SOARES” (fls. 2.010-2.011). Ao prestar depoimento, o colaborador Fernando Soares confirmou a ocorrência da discordância, asseverando que “enquanto Júlio dizia que restava a pagar a Eduardo Cunha cerca de R$ 400 mil, Eduardo Cunha, pelas contas dele, dizia que era R$ 1,2 milhão” (fl. 2.043) e que ambos teriam 75 Em elaboração INQ 3983 / DF acertado o valor faltante de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais). Ainda sobre o pagamento do montante devido, Júlio Camargo esclareceu que, em reunião com Eduardo Cunha, no primeiro semestre de 2014, acertou o pagamento de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) em espécie, sendo que o restante devido seria pago em horas voo mediante fretamento de táxi aéreo (fls. 2011-2.012): “QUE, do valor de 1 milhão de reais, o declarante se comprometeu a pagar 500 mil reais e que o restante ficaria por conta de FERNANDO SOARES; QUE, no primeiro semestre de 2014, em data que não consegue precisar, mas após reunião com FERNANDO SOARES, reuniu-se com EDUARDO CUNHA em seu escritório em São Paulo, situado na Avenida Magalhães de Castro, 4.800, Torre II, Conjunto 62, quando tratou do pagamento dos 500 mil reais; QUE, nessa reunião, a pedido de EDUARDO CUNHA, acertou que pagaria 200 mil reais em espécie. […] QUE em relação aos 300 mil faltantes pagou com fretamento de táxi aéreo em benefício a EDUARDO CUNHA; QUE não se recorda se tratou dessa forma de pagamento (fretamento de táxi aéreo) com FERNANDO SOARES ou diretamente com EDUARDO CUNHA, ou seja, não sabe dizer se essa forma de pagamento foi definida em reunião com o próprio EDUARDO CUNHA o que acha mais provável, ou se isso já havia sido combinado com FERNANDO SOARES anteriormente; QUE determinou que a empresa Global táxi aéreo faturasse voos solicitados por EDUARDO CUNHA no valor de até 300 mil reais, para pagamento por meio da empresa Piemonti, de propriedade do declarante; QUE, para isso, conversou pessoalmente com o proprietário da Global, Sr. Eduardo Gobetti; QUE não se recorda a quem instruiu a operacionalização desses afretamentos, se EDUARDO CUNHA diretamente ou por intermédio de FERNANDO SOARES; QUE não recebia informações da Global sobre quem seriam as pessoas que voaram por indicação de EDUARDO CUNHA; 76 Em elaboração INQ 3983 / DF QUE foi faturado aproximadamente 120 ou 130 mil reais”. Para corroborar suas alegações, Júlio Camargo apresentou tabela fornecida pela Global Táxi Aéreo acerca das pessoas que teriam utilizado as horas de voo fornecidas pelo colaborador. Nela, constam os já esperados nomes de “Eduardo da Cunha”, “Altair Alves Pinto” (o mesmo Altair, segundo a acusação, encarregado de receber valores em espécie de Fernando Soares em nome de Eduardo Cunha), “Lúcio Bolonha Funaro” e “Raquel Albejante Pitta” (fl. 2.017). Ademais, Júlio Camargo entregou ao Ministério Público cópia das notas fiscais referente ao pagamento desses voos cedidos para Eduardo Cunha (fls. 2.018-2.023). 24. Em suma, a análise dos autos mostra que há indícios robustos para, nestes termos, receber parcialmente a denúncia, cuja narrativa, em seu segundo momento, ademais de reforçada pelo aditamento, dá conta de que o Deputado Federal Eduardo Cunha, procurado por Fernando Soares, aderiu ao recebimento, para si e concorrendo para o recebimento por parte de Fernando Soares, de vantagem indevida, oriunda da propina destinada a diretor de empresa estatal de economia mista, em função do cargo, por negócio ilícito com ela celebrado. Esse recebimento, porque núcleo alternativo próprio do tipo, não pode ser descartado como mero exaurimento da conduta de outrem. Os elementos colhidos confortam sobejamente o possível cometimento de crime de corrupção passiva majorada (art. 317, caput e § 1º, do Código Penal), ao menos na qualidade de partícipe (art. 29 do Código Penal), por parte do Deputado Federal Eduardo Cunha, ao incorporar-se à engrenagem espúria protagonizada pelo então diretor da Petrobras Nestor Cerveró (funcionário público para fins penais por força do art. 327, caput, do Código Penal), Júlio Camargo e Fernando Soares, bem como dela se fazendo beneficiário, tal como descrito, não no “primeiro momento” referido na denúncia original (o que configuraria concurso material com outro crime do mesmo teor), mas no “segundo momento” a que aludem a denúncia e o seu aditamento, que nisso a reforça. 77 Em elaboração INQ 3983 / DF Registre-se que é tradicional e consagrado, tanto na jurisprudência do STJ (RHC 27.628/GO, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 13/11/2012, DJe 03/12/2012) quanto na desta Corte, o entendimento segundo o qual: “Não é lícito ao Juiz, no ato de recebimento da denúncia, quando faz apenas juízo de admissibilidade da acusação, conferir definição jurídica aos fatos narrados na peça acusatória. Poderá fazê-lo adequadamente no momento da prolação da sentença, ocasião em que poderá haver a emendatio libelli ou a mutatio libelli, se a instrução criminal assim o indicar.” (HC 87324, Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA, Primeira Turma, julgado em 10/04/2007, DJe-018 DIVULG 17- 05-2007 PUBLIC 18-05-2007 DJ 18-05-2007 PP-00082 EMENT VOL-02276-02 PP-00217 RJSP v. 55, n. 356, 2007, p. 177-186) Exclui-se todavia, desde já, do quanto recebido, a causa de aumento do art. 327, § 2º, do Código Penal, incabível pelo mero exercício do mandato popular, sem prejuízo da causa de aumento contemplada no art. 317, § 1º (“A pena é aumentada de um terço, se, em consequência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional”). A jurisprudência desta Corte, conquanto revolvida nos últimos anos (Inq 2606, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 11/11/2014, DJe-236 DIVULG 01-12-2014 PUBLIC 02-12-2014), exige uma imposição hierárquica (Inq 2191, Relator(a): Min. CARLOS BRITTO, Tribunal Pleno, julgado em 08/05/2008, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-084 DIVULG 07-05-2009 PUBLIC 08-05-2009) que não se acha nem demonstrada nem descrita nos presentes autos. Fazem-se presentes, ademais, variados e seguros indícios de que o denunciado, a partir daí, seria destinatário de ao menos parte dos valores destinados por Júlio Camargo a Fernando Soares, intermediário da propina a Nestor Cerveró, em operações identificadas no período antes descrito e que se subsumem no tipo penal descrito no art. 1º, V, VI e VII, 78 Em elaboração INQ 3983 / DF Lei 9.613/1998, na redação anterior à Lei 12.683/2012, que passando a abranger qualquer “infração penal”, revogou incisos que já eram notoriamente alternativos. Os indícios existentes apontam também que Solange Almeida teria concorrido para a prática do delito de corrupção passiva, nos termos do já aludido art. 29 do Código Penal (“Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade”). Assim, não assiste razão à defesa da denunciada, de que a conduta descrita na denúncia seria de outro tipo penal. Em relação aos requerimentos do Ministério Público de “perdimento do produto e proveito dos crimes, ou de seu equivalente” e de “arbitramento cumulativo de valor mínimo de reparação dos danos causados pela infração” (fl. 684), ficam limitados, conforme exposto, aos fatos em que há indícios da prática de crimes pelos acusados, não abrangendo, portanto, o valor integralmente considerado na denúncia. 25. Ante o exposto, preenchidos os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, a denúncia é de ser parcialmente recebida, nos termos da fundamentação, prejudicados os agravos regimentais interpostos às fls. 1.982-1.985v. e 2.225-2.228. É como voto


A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) aceitou nesta quarta-feira (2) o recebimento parcial de uma denúncia contra o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), pelo suposto recebimento de US$ 5 milhões de propina do esquema de corrupção que atuava na Petrobras.
Dos 11 ministros da Corte, 6 votaram nesta quarta a favor da abertura da ação penal contra o deputado. Outros cinco magistrados irão votar nesta quinta-feira (3).
Voto do relator

Em seu voto, Teori Zavascki acolheu a denúncia na parte em que acusa Eduardo Cunha de pressionar, a partir de 2010, o ex-consultor da Samsung Heavy Industries Júlio Camargo a retomar os pagamentos de propina que haviam sido interrrompidos. Ele rejeitou parte da denúncia que acusava Cunha de atuar na negociação para a compra dos navios, entre 2006 e 2007.

"Não ficou demonstrada a participação de Eduardo Cunha e Solange Almeida nessa fase inicial. Ou mesmo que tenham os acusados recebido vantagem indevida para agilizar a negociação", disse o ministro.
"Com relação a Eduardo Cunha, a primeira parte da denúncia se baseia exclusivamente em depoimentos de delatores", acrescentou.

A parte da acusação aceita por Teori narra que o presidente da Câmara, por intermédio de ex-deputada Solange Almeida, apresentou requerimentos na Comissão de Fiscalização e Controle da Casa exigindo explicações do Ministério de Minas e Energia sobre contratos da Petrobras com fornecedores de navios-sonda.

"A denúncia trouxe reforço narrativo lógico. Eduardo Cunha e Solange Almeida teriam aderido ao recebimento de valores indevidos nesse segundo momento, 2010 e 2011", observou Teori Zavascki.

O relator destacou que Júlio Camargo disse, em sua delação premiada, ter sofrido "forte pressão" de Cunha, inclusive por meio de requerimentos em comissões. Fernando Baiano também confirmou essa versão, em depoimento ao Ministério Público.

Em seu voto, Zavascki também destacou que não levou em conta somente fatos narrados pelos delatores, mas também indícios colhidos pela investigação que confirmam pagamentos e reuniões envolvendo Cunha no recebimento da propina.

"Essas colaborações não são isoladas, elas ganham valor na medida em que são acompanhadas de elementos pelo menos indiciários muito sugestivos da veracidade", disse.

No início do voto, Teori Zavascki recomendou, e o plenário rejeitou, diversos pedidos da defesa para derrubar a denúncia, baseados em supostos erros na investigação. Um deles apontava discrepâncias entre o áudio das delações e as transcrições incluídas na denúncia.

O ministro ressaltou que as delações são apenas um meio para obtenção de provas e não são suficientes para uma condenação. "Sempre é bom lembrar que a palavra do colaborador por si só não representa nada em termos de prova. Representa o início de um caminho para a busca das provas", explicou.

Defesa e acusação
Na tribuna, o advogado de Cunha, Antônio Fernando de Souza, afirmou que a PGR também omitiu dados das investigações que seriam favoráveis ao deputado. Como exemplo, mencionou uma declaração do lobista Fernando Baiano, suposto representante de interesses do PMDB junto à Petrobras, em que ele nega participação do de Cunha na contratação.

Antes da defesa, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, afirmou que a denúncia contra o deputado está baseada em “farta prova”. "Quero reafirmar que denúncia não se assenta exclusivamente nos depoimentos das colaborações premiadas realizadas, mas em farta prova que delas resultou", afirmou Janot no início de sua fala.

O procurador mencionou registros de telefonemas, estacionamentos e estadia em salas onde Cunha teria se encontrado com Júlio Camargo, ex-consultor da Samsung, para cobrar propina. Nas reuniões, segundo Janot, ele era acompanhado por Fernando Baiano.

Denúncia
A denúncia aponta que o valor recebido por Cunha faria paxrte de uma propina de cerca de US$ 40 milhões acertada com Júlio Camargo, representante da Samsung; Fernando Baiano, lobista que intermediava o negócio em nome de Cunha; e Nestor Cerveró, e-diretor internacional da Petrobras que aprovou a compra.

As embarcações, especializadas na perfuração de águas profundas, foram adquiridas entre 2006 e 2007, pelo preço de US$ 1,2 bilhão, pagos ao estaleiro num contrato sem licitação.

Para ocultar a origem, a PGR diz que Cunha recebeu os valores em várias parcelas no exterior, por meio de contas "offshore" (abertas em países pouco fiscalizados) e empresas de fachada (com contratos simulados) e até direcionando doações para uma igreja.

A acusação também diz que, para pressionar Camargo a retomar o pagamento das propinas, Cunha teria articulado, na Câmara, pedidos de informações para fiscalizar a Samsung junto ao Tribunal de Contas da União (TCU) e ao Ministério de Minas e Energia.

Também narra em detalhes uma "reunião pessoal" entre Baiano, Camargo e Cunha para acertar a divisão dos valores, repassados em parte em espécie no escritório do deputado no Rio de Janeiro.



Procurador-geral da República, Rodrigo Janot, apresentou nesta quinta-feira (20) ao Supremo Tribunal Federal (STF) denúncias contra o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e contra o senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL) por suposto envolvimento no esquema de corrupção na Petrobras investigado pela Operação Lava Jato.
Nas denúncias, o procurador-geral pede a condenação dos dois sob a acusação de terem cometidos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro. De acordo com a Procuradoria, eles receberam propina de contratos firmados entre a Petrobras e fornecedores da estatal.

Na denúncia contra Eduardo Cunha , a Procuradoria também pede que sejam devolvidos US$ 80 milhões – US$ 40 milhões como restituição de valores supostamente desviados e mais US$ 40 milhões por reparação de danos. A PGR estima essa quantia em R$ 277,36 milhões, pela cotação atual.



Ambos os parlamentares negam as acusações. O presidente da Câmara se diz "inocente" e afirmou que foi "escolhido para ser investigado". Collor disse que o procurador Rodrigo Janot fez um "teatro" e "selecionou a ordem dos fatos".
Também foram alvos de denúncia de Janot a ex-deputada Solange Almeida (PMDB-RJ), aliada de Cunha e atual prefeita de Rio Bonito (RJ), além de Pedro Paulo Leoni Ramos, ministro do governo Collor, e mais três pessoas ligadas ao senador.
O STF terá agora de decidir se aceita ou não as denúncias. Se aceitar, os denunciados se tornarão réus e responderão a ações penais no Supremo – devido ao foro privilegiado decorrente da condição de parlamentares, Cunha e Collor não podem ser processados em outra instância da Justiça.
Na hipótese de o STF aceitar a denúncia, Cunha – devido à condição de presidente da Câmara – será julgado pelo plenário do tribunal, formado pelos 11 ministros. O julgamento de Collor ficaria a cargo da Segunda Turma do Supremo, integrada por cinco ministros, entre os quais Teori Zavascki, relator dos inquéritos da Operação Lava Jato referentes a autoridades com foro privilegiado.
Após o recebimento da denúncia, Zavascki notificará as defesas para apresentação de respostas por escrito. Depois da apresentação das respostas, o processo voltará o Ministério Público, que dará um parecer. O ministro fará então um relatório e levará o caso ao plenário, que decidirá pela abertura ou não de ação penal – não há prazo para isso.
A denúncia contra Cunha
O presidente da Câmara, Eduardo Cunha, foi denunciado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, sob a acusação de ter recebido, entre junho de 2006 e outubro de 2012, pelo menos US$ 5 milhões para viabilizar a contratação de dois navios-sonda para a Petrobras.

O procurador-geral inicia a denúncia com uma frase de Mahatma Gandhi: "Quando me desespero, eu me lembro de que, durante toda a história, o caminho da verdade e do amor sempre ganharam. Têm existido tiranos e assassinos, e por um tempo eles parecem invencíveis, mas no final sempre caem. Pense nisto: sempre."
De acordo com a denúncia, a Samsung Heavy Industry, empresa responsável pelo fornecimento dos navios-sonda, destinados à exploração de petróleo, pagou US$ 40 milhões para o ex-consultor Júlio Camargo, apontado como um dos intermediários da propina recebida pelo esquema e que fez acordo de delação premiada com o Ministério Público Federal.
Camargo, segundo a denúncia, foi o responsável por distribuir o dinheiro entre integrantes do esquema.
A quantia paga pela Samsung Heavy Industry teria sido depositada no exterior, em contas indicadas pelo lobista Fernando Baiano, apontado como operador do PMDB no esquema de corrupção e preso na Operação Lava Jato – o partido nega vínculos com Baiano.
 A Procuradoria informa na denúncia que identificou 60 operações de lavagem de dinheiro, entre as quais remessas ao exterior, entrega de dinheiro vivo, simulação de contratos de consultoria, emissão de notas frias e transferências para uma igreja vinculada a Cunha, a título de doações religiosas.
Pressão
De acordo com as investigações, após o fornecimento das sondas, a Samsung Heavy Industry parou de pagar as comissões a Júlio Camargo, o que teria levado Eduardo Cunha a pressionar para voltar a receber a propina.

Para isso, segundo a PGR, a então deputada Solange Almeida (PMDB-RJ), aliada de Cunha, apresentou à Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara requerimentos pedindo ao Tribunal de Contas da União (TCU) e ao Ministério de Minas e Energia informações sobre Júlio Camargo, Samsung Heavy Industry e o grupo Mitsui, envolvido nas negociações de um dos contratos. Conforme a denúncia, Cunha foi o autor "material e intelectual" dos requerimentos – ele nega.
Depois da apresentação dos requerimentos, Júlio Camargo procurou o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa – preso na Lava Jato e que também fez acordo de delação premiada – para reclamar da pressão pela retomada do pagamento da propina, diz a denúncia da PGR.
Segundo o texto da denúncia, Júlio Camargo pediu a Costa uma reunião com o então ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, do PMDB. Essa reunião teria ocorrido em 31 de agosto de 2011, na base aérea do aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, segundo relata a Procuradoria com base em depoimento de Camargo, que no encontro teria relatado a Lobão as pressões que vinha sofrendo.
"Isso é coisa do Eduardo", teria afirmado Lobão, segundo reproduz a denúncia. Em seguida, diante de Camargo, o ministro teria telefonado para o deputado e indagado: "Eduardo, estou com o Júlio Camargo aqui do meu lado. Você enlouqueceu?".
Após a suposta reunião com Lobão, Camargo teria relatado para Fernando Baiano a conversa com o então ministro. Segundo o texto da denúncia, ele disse que ouviu de Fernando Baiano: "Você pode falar com quem você quiser. Enquanto não pagar o que você deve, a pressão continuará cada vez maior".
Júlio Camargo resolveu pedir ajuda ao doleiro Alberto Youssef para que ele negociasse uma solução com Eduardo Cunha, segundo a narrativa da PGR. Youssef respondeu que a única alternativa era pagar os valores devidos a Eduardo Cunha, diz o texto da PGR.
Camargo recorreu então a Fernando Baiano que marcasse um encontro pessoal com  Eduardo Cunha. De acordo com a Procuradoria, o encontro se deu em setembro de 2011, em um domingo à noite, numa sala de um prédio comercial do Leblon, no Rio de Janeiro.
Segundo relato de Camargo reproduzido na denúncia, Cunha disse não ter nada de pessoal contra ele, mas que era necessário uma solução para a retomada dos pagamentos da propina.
"Julio, em primeiro lugar, quero dizer que não é nenhum problema pessoal em relação a você. O problema que eu tenho é com o Fernando e não com você. Acontece que o Fernando não me paga porque diz que você não o paga. Como o Fernando não tem capacidade de me pagar, eu preciso que você me pague", disse Cunha, segundo reproduziu a PGR.
De acordo com o texto, depois dessa reunião, os pagamentos teriam sido retomados.
A denúncia apresentada nesta quinta pelo procurador-geral não esgota a investigação do parlamentar. Isso porque uma parte da investigação – a que se refere à suposta entrega de dinheiro a aliados de Cunha – ainda continuará em apuração em inquérito que tramita no Supremo Tribunal Federal.
Cunha nega as acusações
Eduardo Cunha sempre negou ser o autor dos requerimentos de Solange Almeida e disse que jamais recebeu propina no esquema da Petrobras.

Nos primeiros depoimentos à Justiça, Julio Camargo não mencionou o nome do deputado. Posteriormente, mudou a versão e passou a incriminar Cunha. Segundo a defesa de Camargo, ele não falou antes sobre o envolvimento do presidente da Câmara por “receio” de sofrer retaliação.
Eduardo Cunha afirma que o procurador-geral da República atuou em conjunto com o Executivo para convencer Júlio Camargo a “mentir” e incriminá-lo. Depois que Julio Camargo acusou Cunha, o deputado anunciou rompimento com o governo e disse que passaria a atuar como deputado de oposição.
Na noite desta quarta-feira, Eduardo Cunha afirmou que, mesmo denunciado, não se afastará da presidência da Câmara. “Eu não farei afastamento de nenhuma natureza. Vou continuar exatamente no exercício pelo qual eu fui eleito pela maioria da Casa. Absolutamente tranquilo e sereno com relação a isso”, disse na noite de quarta (20).
O líder do PMDB na Câmara, deputado Leonardo Picciani (RJ), aliado de Eduardo Cunha, disse acreditar que a denúncia não é motivo suficiente para um afastamento dele do comando da Câmara, como quer um grupo de parlamentares de diferentes partidos, entre os quais PSOLPSB e PT. Eles avaliam formular um pedido para Cunha renunciar ou requerer ao Conselho de Ètica a abertura de um processo por quebra de decoro parlamentar.
Picciani defendeu que não haja uma condenação antecipada e disse que a “presunção de inocência" serve para qualquer cidadão, inclusive o presidente da Casa.
“Num Estado de Direito, qualquer cidadão pode vir a ser réu. O que precisa é concluir o julgamento. Apenas a condenação pode delimitar isso. Qualquer coisa diferente disso é uma antecipação de condenação, de suposições que não condizem com o Estado de Direito, seja para o presidente da Câmara quanto para qualquer cidadão”, afirmou.
Advogado e PMDB
O advogado Antonio Fernando de Souza, responsável pela defesa de Cunha, afirmou ao G1 que ainda não teve conhecimento do teor da denúncia.

“Quando tivermos acesso, vamos preparar a defesa. Mas não podemos adiantar nada, porque não sabemos nada ainda. Vamos aguardar para ver no que consistiu a denúncia, vamos examinar antes”, declarou.
Na noite desta quinta, a liderança do PMDB na Câmara divulgou nota na qual afirma que a bancada do partido se solidariza com Cunha e afirma que a presunção de inocência é cláusula pétrea da Constituição.

"Enquanto não se esgotarem todas as etapas previstas no rito da lei, não há culpados, mas apenas acusados", afirma da nota. "A bancada do PMDB na Câmara dos Deputados apoia e acredita no presidente da Casa, Eduardo Cunha, e se solidariza com ele neste momento em que alguns se açodam a defender teses que ferem o princípio primordial do Estado Democrático de Direito", diz o texto.


A denúncia contra Collor
O senador e ex-presidente da República Fernando Collor foi denunciado por pelo menos dois crimes – corrupção ativa e lavagem de dinheiro. O teor da denúncia contra Collor não foi divulgado porque cita trechos de delações premiadas ainda não validadas pela Justiça.

As investigações da Operação Lava Jato apontam que o senador Fernando Collor de Mello (PTB-AL) recebeu, entre 2010 e 2014, R$ 26 milhões como pagamento de propina por contratos firmados na BR Distribuidora.
Delatores da Lava Jato afirmaram que chegaram a pagar faturas de cartão de crédito de Collor e que o senador recebeu parte da propina em dinheiro vivo e em mãos.
Antes de o dinheiro chegar às mãos do ex-presidente da República, afirmaram esses delatores, a quantia teria circulado em um carro-forte de uma empresa de valores e em carros blindados.
Entregador do doleiro Alberto Youssef, preso na Lava Jato, o depoente Rafael Ângulo disse que entregou dinheiro vivo a Collor no apartamento dele, em São Paulo – R$ 60 mil em notas de R$ 100.
De acordo com os delatores, o principal articulador do acordo que teria resultado em propina para dirigentes da BR e para o próprio senador foi Pedro Paulo Leoni Ramos, ministro de Assuntos Estratégicos do governo Collor.
Youssef narrou, em depoimento, ter sido procurado por Leoni Ramos para lavar dinheiro desviado da BR Distribuidora.
A investigação apontou que parte do dinheiro desviado teria sido usado por Collor para a compra de carros de luxo em nome de empresas de fachada.
Em julho, a Polícia Federal apreendeu três veículos de luxo na casa de Collor em Brasília: uma Ferrari, um Porsche e uma Lamborghini. Segundo as investigações, os veículos foram comprados com dinheiro de propina supostamente recebida no esquema – o senador nega.
Conforme a apuração, os carros não estão em nome de Collor, mas sim, em nome de empresas de fechada. Dois carros são propriedade da Água Branca Participações, empresa de Collor que, conforme investigadores, não tem funcionários e é usada para lavagem de dinheiro.
As investigações também indicaram que as prestações do financiamento do Lamborghini estão atrasadas. Para a cúpula da Lava Jato, os pagamentos pararam em razão da operação, porque a propina parou de ser distribuída. Já existe, inclusive, um processo na Justiça de São Paulo para reaver o bem em razão da inadimplência.
Collor nega as acusações
Desde que foi mencionado nas investigações, Collor sempre negou as acusações e disse estranhar a inclusão de seu nome na lista de políticos supostamente envolvidos no esquema.

Em diversas ocasiões, o senador subiu à tribuna do Senado para criticar a condução da Operação Lava Jato pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Collor chegou a usar um palavrão para xingar Janot em um desses discursos.
Para o ex-presidente, Janot promoveu "vazamentos seletivos" em uma "sórdida estratégia midiática". Ele também acusou o procurador-geral de ter orquestrado as investigações para vinculá-lo ao esquema de corrupção que atuava na Petrobras.
No dia em que contestou a denúncia de que recebeu R$ 26 milhões em propina, o senador do PTB disse “nada ter a ver” com os fatos a ele imputados.  E declarou ter certeza de que “a verdade, mais uma vez, virá à tona”.
Quanto aos carros de luxo apreendidos pela Operação Politeia, um desdobramento da Lava Jato, o senador disse que são propriedade de empresas das quais é sócio majoritário e afirmou que é o responsável pelos seus financiamentos. Para ele, a apreensão dos veículos superesportivos foi "espetaculosa" e midiática".
No discurso em que xingou o procurador-geral na tribuna do Senado, Collor voltou a dizer que as acusações contra ele são "ilações".
“Reafirmo que tudo não passa de ilações. São falsas versões impingidas à opinião pública de forma a esterilizar a verdade, a escamotear as reais intenções midiáticas do procurador-geral da República e a impor a narrativa que a ele interessa", disse Collor no discurso.
Advogado e PTB
Ao G1, o vice-presidente do PTB, deputado Jovair Arantes (GO), afirmou que, para ele, a denúncia da PGR, a investigação por parte do STF e a defesa do senador Fernando Collor fazem parte do processo democrático. O dirigente do PTB disse estar certo de que Collor "irá se defender de maneira adequada.

"Eu acho que não é o caso de ele [Collor] ser expulso do partido. Ele tem o direito dele à ampla defesa, ele vai se defender, preparar suas respostas. Quem vai decidir se ele é culpado ou não é a Justiça. Eu acho muito arriscado você condendar alguém se a Justiça julgar, chegar a uma conclusão. Ele precisa ainda apresentar sua defesa", ressaltou o vice-presidente do PTB.
G1 procurou o advogado Fernando Neves, que defende o senador Fernando Collor, mas não tinha conseguido contato com ele até a última atualização desta reportagem.
À noite, a assessoria do senador divulgou nota na qual afirma que a defesa de Collor não se manifestará sobre a denúncia porque o teor não está disponível.
Segundo a nota, mesmo tendo se colocado à disposição da Polícia Federal, Collor nunca foi ouvido sobre as acusações imputadas a ele.
"As razões que levaram a Procuradoria Geral da República ao oferecimento de denúncia antes da inquirição do Senador e antes mesmo da conclusão do inquérito policial parecem atender interesses e conveniências outras que não se coadunam com a melhor apuração dos fatos", diz o texto da nota.