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terça-feira, 11 de outubro de 2016

REAGE CENPES CONTRA A ENTREGA DO PATRIMÔNIO DA PETROBRAS <<>> SERÁ QUE A EMPRESA ESTA REALMENTE QUEBRADA ?




RENATO SANTOS 11/10/2016  Reunidos no dia 30 de setembro, um grupo de trabalhadores do Cenpes criou o movimento “Reage Cenpes”, para combater o esvaziamento do Centro de Pesquisas e defender a integridade da Petrobrás como empresa integrada de energia.





fonte : Esse boletim foi definido como proposta de trabalhadores do Cenpes 
presentes na concentração ocorrida no dia 30/09/2016 e por eles escrito, 
impresso e distribuído. reagecenpes@gmail.com

No primeiro boletim divulgado pelo grupo, os malefícios do Plano de Negócios e Gestão, apresentado por Pedro Parente, são explicitados, além de mostrar alternativas realmente estratégicas para a Petrobrás.

Um manifesto contra a entrega do patrimônio da PETROBRAS O Plano de Negócios e Gestão da Petrobras 2017-2021 foi apresentado à força de trabalho no dia 20/09/2016. 



Aplaudido pelo mercado, o objetivo do plano é reduzir a alavancagem da Companhia (razão entre a dívida líquida e o EBITDA - capacidade de geração de caixa, desconsiderados efeitos financeiros e de impostos) de 5,3 (em 2015) para 2,5 até 2018 [1]. 

A tão alardeada dívida total bruta acima dos US$ 120 bilhões [2] e o mito da Petrobras “quebrada” servem de justificativa para um plano que nada tem de estratégico, transformando a Companhia em uma empresa de E&P, exportadora de óleo cru, e ainda se baseando em parcerias para alcançar uma produção diária de 3,4 milhões de barris de óleo e gás ao final do período [2]. 

Após a divisão entre os parceiros, quanto desta produção de fato será da Petrobras atualmente é uma incógnita.

Mas antes de qualquer coisa, vamos considerar uma questão crucial:

 SERÁ QUE A PETROBRAS ESTÁ REALMENTE “QUEBRADA”?

O crescimento da dívida está diretamente vinculado a uma série de fatores: 1- Diante das perspectivas do Pré-Sal, a Petrobras investiu cerca de R$ 424,65 bilhões entre 2010 e 2014, de modo a alcançar a meta superlativa de produzir 4 milhões de barris/dia até 2020 [3]; 2- 

A política equivocada de congelamento dos preços dos derivados de petróleo, por quatro anos, para controlar a inflação, gerou um prejuízo de cerca de R$ 100 bilhões de acordo com os cálculos do CBIE [4]; 3- Uma vez que a participação da dívida dolarizada no endividamento era de 70,4% no fim de setembro de 2014 [5], a variação cambial exerce fortes influências contábeis (e não financeiras); e 4 - Queda acentuada nos preços do petróleo (de US$ 130 para US$ 50 o barril), a qual foi fortemente afetada pela mudança da política monetária do FED. 

Porém, graças ao fato de ser uma empresa integrada, as receitas da Petrobras não têm vinculação direta com o preço internacional do barril, mas se baseiam nos preços dos combustíveis no mercado interno. O lucro bruto da empresa em 2015 apresentou um crescimento de 23% em relação a 2014, passando de R$ 80,4 bilhões para R$ 98,6 bilhões. O EBITDA foi de R$ 73,859 bilhões em 2015, 25% superior a 2014 pelos maiores preços do diesel e da gasolina, além da redução dos gastos com participações governamentais e importações de petróleo e derivados devido à queda do preço do barril [6]. 

Então como explicar os prejuízos registrados nos últimos balanços da Companhia? 

Aos “prejuízos recordes” atribuem-se as perdas por impairment (desvalorização de ativos) de R$ 44,636 bilhões em 2014 e R$ 49,748 bilhões em 2015, além do valor de R$ 6,194 bilhões referentes às estimativas de pagamentos de propinas (uma exigência da PWC por ocasião da auditoria do balanço de 2014), despesas de juros e perda cambial (R$ 32,908 bilhões em 2015) e prejuízos operacionais de R$ 21,322 bilhões em 2014 e R$ 12,391 bilhões em 2015 [6]. 

A maioria das grandes petroleiras não registrou perdas por impairment, ou registraram-se valores irrelevantes, por se entender que este tipo de exercício especulativo não seria conveniente tendo em vista a volatilidade do preço internacional do barril  Além do mais, empresas que apresentam uma taxa constante de descobertas tendem a reconhecer menos impairment, pois o aumento das reservas provadas, por exemplo, significa maior capacidade de recuperação dos ativos de E&P [7]. 

A Petrobras poderia não ter penalizado seu balanço financeiro da forma como fez se tivesse considerado suas perspectivas reais (a empresa apresenta um índice de reposição de reservas acima de 100% há 23 anos [8]) ao invés de se ater à perda de seu grau de investimento. Ressalta-se que a Companhia “foi criada em 1953 e só veio a adquirir grau de investimento em 2007. 

Portanto a empresa cresceu e se desenvolveu durante 53 anos e ninguém percebeu que ela não tinha o “importante grau de investimento”. O fato é que as empresas de “rating” recebem dinheiro de grandes bancos e empresas para atribuir “rating” de acordo com seus interesses. Em 2010 foi feito um documentário chamado “Trabalho Interno”, que recebeu o Oscar em 2011, e esclarece bem o assunto” [9,10]. 

Do exposto, conclui-se que a Petrobras está longe de ser uma empresa falida e que seus “prejuízos” são muito mais jogos contábeis que problemas financeiros de fato. Nos últimos anos nossa Companhia apresentou crescimento no volume de produção de óleo do Pré-Sal, na produção de derivados, nas suas reservas provadas e no volume diário de entrega de gás natural [11], tendo sido a única empresa entre os grandes majors do petróleo a apresentar crescimento produtivo entre os anos de 2006 e 2014 [12]. 

O endividamento, porém, é um problema real, mas, especialmente diante da realidade apresentada, existem alternativas às vendas de ativos as quais a direção da empresa absolutamente desconsidera, como a conversão das dívidas com bancos públicos, empréstimo com o banco de desenvolvimento do BRICS, capitalização com recursos do Tesouro Nacional por meio do BNDES (vide Projeto de Lei 560/2015) e etc [13]. A perda de integração gerada pela venda de ativos, no entanto, contribuirá para que o mito da Petrobras falida se transforme em realidade.

CONTRADIÇÕES DO PNG 2017-2021 


Desinvestimentos que se constituem em verdadeiras entregas do patrimônio da empresa e formação de parcerias formam os pilares do plano, sendo entendidos como mecanismos para “geração de valor” para evitar novas captações líquidas no período 2017-2021 [1]. O problema é que não se assume o fato óbvio de que a utilização das receitas de privatizações para amortizar a dívida da Companhia no curto prazo, são, de longe, inferiores aos dividendos que deixam de ser recebidos no futuro, a julgar pelos valores depreciados de venda dos ativos até então entregues (49% de participação na Gaspetro por R$ 1,93 bilhões, 90% de participação na NTS por US$ 5,2 bilhões, Carcará por US$ 2,5 bilhões...).

Apenas com a valorização do real frente ao dólar a redução da dívida da Petrobras foi da ordem de US$ 31 bilhões, ou seja, mais que duas vezes superior à meta de US$ 15,1 bilhões que a direção da empresa pretende arrecadar vendendo ativos em 2016 [14,15]. O plano também prevê “a retirada integral da Companhia dos setores de produção de biocombustíveis, distribuição de GLP (gás de cozinha), produção de fertilizantes e das participações da companhia na petroquímica para preservar competências tecnológicas em áreas com maior potencial de desenvolvimento”[1]. 

O curioso é que na mesma apresentação [1] afirma-se que “buscaremos usos alternativos de maior valor agregado para o petróleo, incluindo a integração refino petroquímica”, sendo que vamos nos retirar integralmente do setor. Inconsistente, como igualmente inconsistente é a afirmação de que preservaremos a competência tecnológica nestas áreas. 

Difícil entender o que os profissionais das áreas “desinvestidas” farão durante cinco anos para se manterem na vanguarda do conhecimento. A saída da empresa do setor de biocombustíveis foi explicada pelo entendimento de que: “claramente não somos os melhores operadores deste tipo de produto. 

O Etanol, por exemplo, é um produto basicamente agrícola e certamente não é a nossa especialidade e a gente tem que ter humildade de reconhecer que tem gente que faz isto melhor do que nós”[16]. Ao mesmo tempo afirma-se que “continuaremos a ser a maior companhia integrada de energia do Brasil, em petróleo e gás com crescente participação nas energias alternativas”[1]. 

Como se pretende aumentar a participação neste setor mediante a venda de ativos? Em vez de simplesmente privatizar, o modelo de negócios da Petrobras Biocombustível deveria ser reavaliado para que a empresa tivesse acesso às matérias primas a custos mais baixos, próximos aos custos de produção, poupando a das manobras de reais e potenciais concorrentes [17]. 

De acordo com as projeções da Agência Internacional de Energia "a participação dos biocombustíveis na demanda de combustível para transporte rodoviário global deve sair dos atuais 3% para 8% em 2035" [18]. 

Não há razões para a Petrobras ter tanta humildade; a Shell por exemplo, sócia na Cosan na Raízen [19], não tem. Se o mundo caminha para as fontes renováveis, o que justifica que sigamos em sentido inverso? Subsidiária direta da Petrobras, a Liquigás, empresa que atua no engarrafamento, distribuição e comercialização de Gás Liquefeito de Petróleo (GLP), é uma outra questão que salta aos olhos. Considerada como sendo um caso de “venda pura e simples”, as transações em torno da Liquigás também esbarram no entendimento do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Como fica a questão da concentração de mercado? 

A LÍQUIGÁS 

A Liquigás está presente em 23 estados brasileiros (exceto Amazonas, Acre e Roraima) [20]. De acordo com dados da ANP, sua participação no mercado nacional é de cerca de 23% para envasados até 13 kg e 19% na venda do industrial [21]. 

De outubro de 2015 a março de 2016, a empresa apresentou uma média de venda exclusivamente de recipientes (botijões) de até 13 kg de 7.626.000 botijões. Considerando a média da margem de lucro bruto apresentada pela ANP, a Liquigás exibe um lucro bruto anual somente na venda dos recipientes de até 13 kg, de aproximadamente R$ 1,4 bilhão [22]. 

Outro ponto importante é que o banco Itaú BBA, ente responsável pela seleção das ofertas para aquisição de 100% da Liquigás [23], é sócio do Grupo Ultra, que representa a Companhia Distribuidora Ultragaz [24]. 

Isso não deveria ser proibitivo para a participação deste banco no processo? Outra polêmica é o fato de que o atual diretor financeiro da Companhia foi membro do Conselho do grupo Ultra até fevereiro deste ano [25]. 

Atuando ativamente no agronegócio brasileiro no fornecimento de produtos nitrogenados de alta qualidade às indústrias de fertilizantes e suplementos minerais, as três fábricas de fertilizantes da Companhia (FAFEN-BA, SE e PR) devem ser totalmente privatizadas segundo o PNG 2017-2021. 

Com isso, a Petrobras perderá a posição de maior produtora nacional de fertilizantes nitrogenados, abrindo mão dos benefícios que esta demanda para o gás natural representa, reduzindo seus ganhos com a produção de gás e desprezando o grande potencial agrícola brasileiro com demandas crescentes por fertilizantes (a taxa de crescimento estimada do mercado de ureia até 2020 é de 3,4% a.a. [26]). 

Em âmbito mundial o Brasil é o quarto consumidor de fertilizantes, absorvendo 5,9% da demanda global, atrás apenas dos Estados Unidos, da Índia e da China [27]. Várias barreiras impedem a viabilidade econômica de novos projetos de unidades industriais, impossibilitando o aumento da produção nacional, dentre eles, a falta de tratamento isonômico entre produtos nacionais e importados, garantindo uma justa competição no mercado, que hoje é totalmente favorável ao produto importado [26]. 

Já em 2008, alertava-se contra o oligopólio praticado pelas multinacionais no controle dos preços da produção local e importada de fertilizantes no Brasil, o qual se iniciou em 1993, com a quebra do monopólio da Companhia na produção nacional [28,29]. Com a saída da Petrobras deste setor, a tendência é de que os problemas persistam e se intensifiquem, ao contrário do que dizem as “vozes do Mercado”. Um dos produtos da FAFEN-PR, o ARLA 32 é a abreviação de Agente Redutor Líquido de óxidos de nitrogênio (NOx) Automotivo. 

O número 32 refere-se ao nível de concentração da solução de ureia (32,5%) em água desmineralizada [30]. Por determinação do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), toda a frota nacional movida a diesel deve adotar o “aditivo limpo”, seguindo as mudanças já vividas por vários países da Europa, Estados Unidos, Austrália e Japão. Com isso, estima-se que em pouco tempo o Brasil será um dos três maiores mercados de Arla no mundo, com vendas estimadas em 1,25 bilhões de litros (US$ 1,125 bilhões) em 2020 [31]. 

A Petrobras Distribuidora comercializa em sua rede de postos o produto com a marca Flua Petrobras. Alinhada ao novo PNG, a Petrobras já anunciou que está negociando a venda de suas participações na Companhia Petroquímica de Pernambuco e na Companhia Integrada Têxtil de Pernambuco (Citepe), as quais formam o Complexo Petroquímica Suape (PQS) [32]. 

A participação societária de 36,1% no capital total da Braskem (e 47% no capital votante), uma das maiores do setor petroquímico no mundo, também será vendida, sendo que a transação esbarra nas negociações para transferência dos direitos da Petrobras para o futuro comprador [33]. 

A Companhia Petroquímica de Pernambuco produz o ácido tereftálico purificado, PTA, matéria prima para produção de filamentos de poliéster, polímeros e resina PET por parte da Citepe [34]. Para ser competitiva, a Citepe deveria também produzir filamento POY (Partially Oriented Yarn) [34,35], matéria prima para os filamentos texturizados DTY (usados na fabricação de tecidos, malhas e outros). No entanto, o atraso na produção (prevista para 2018) obriga a Citepe a importar o POY de países como a Índia, acarretando grande aumento nos custos da empresa, especialmente com a alta do dólar e a contração do mercado interno reduzindo a demanda [35]. 

Assim sendo, não parece que o problema da PQS seja algo a ser corrigido com privatização; a questão principal se refere aos erros da estratégia adotada: sem operar de forma verticalizada, a indústria não produz sua própria matéria prima e vive à mercê de importações [36]. Hoje, as empresas estão sendo negociadas em caráter de exclusividade com a mexicana Alpek [37], e mais um caminho consistente para geração de valor ao portfólio da Companhia será abandonado. “Criada em agosto de 2002 pela integração de seis empresas da Organização Odebrecht e do Grupo Mariani, a Braskem é, hoje, a maior produtora de resinas termoplásticas nas Américas, líder mundial na produção de biopolímeros e maior produtora de polipropileno nos Estados Unidos. Sua produção é focada nas resinas polietileno (PE), polipropileno (PP) e policloreto de vinila (PVC), além de insumos químicos básicos como eteno, propeno, butadieno, benzeno, tolueno, cloro, soda e solventes, entre outros. Juntos, compõe um dos portfólios mais completos do mercado, ao incluir também o polietileno verde, produzido a partir do etanol de cana-deaçúcar, de origem 100% renovável” [38]. 

A Braskem é a única petroquímica integrada de primeira e segunda geração de resinas termoplásticas no Brasil, o que se traduz em vantagens competitivas, como escala de produção e eficiência operacional. Em 2014, a receita líquida foi de R$ 47,3 bilhões/US$ 14,3 bilhões (receita bruta de R$ 54,1 bilhões/US$ 16,3 bilhões), enquanto que o EBITDA foi de R$ 9,4 bilhões/US$ 2,8 bilhões [38]. Qual a justificativa plausível e estratégica para se abandonar este negócio? 

E MAIS AQUELA QUESTÃO DO GÁS... 

A proposta de “maximizar a geração de valor da cadeia do gás”, somada à busca de uma “participação relevante no gás como energia de transição para uma sociedade de baixo carbono” tornam-se sem sentido prático, uma vez que a Companhia vende seus ativos nesta cadeia de forma acelerada, como foram os casos da Gaspetro e da NTS e como será a privatização da NTN, cuja venda está sendo planejada para 2017 [39]. 

A cisão da Gaspetro, em outubro de 2015, transformou-a em uma holding que consolida as participações da Petrobras nas distribuidoras de gás natural. Na ocasião, o Conselho de Administração aprovou também a criação de uma nova subsidiária integral da Companhia (Petrobras Logística de Gás S.A.), com a finalidade de receber os ativos e passivos não relacionados ao negócio de distribuição de gás natural segregados da Gaspetro [40]. 

Posteriormente, 49% do controle da nova holding foi vendida para Mitsui por R$ 1,93 bilhão em um processo polêmico ainda sujeito à contestação na Justiça [41], inclusive por conflito de interesses (o presidente do CA da Petrobras na época era diretor presidente da Vale, que mantinha negócios com o grupo Mistui) [42]. 

Apresentando um lucro médio entre os anos de 2012 a 2014 de R$ 1,77 bilhão [43,44], a perda de metade do capital da subsidiária da Petrobras enfraquecerá o seu caixa em pelo menos R$ 880 milhões ao ano. 

Lembrando que a Gaspetro reúne participações em 19 empresas estaduais de distribuição de gás natural canalizado, a venda também implica em problemas de concentração de mercado por parte da Mitsui [45]. A Nova Transportadora do Sudeste S/A e a Nova Transportadora do Nordeste S/A são dois ativos altamente estratégicos para a Companhia, uma vez que gasodutos são itens obrigatórios na produção de petróleo, pois sem o escoamento do gás, o processo produtivo simplesmente para. Há que se destacar também que gasodutos exigem investimentos consideráveis, uma extensa fase de negociações com comunidades e órgãos ambientais, além de muita engenharia. 

O investimento na malha nacional foi arcado somente pela Petrobras, tendo por isso mesmo conquistado o monopólio efetivo sobre o transporte do gás. Empresas concorrentes precisam utilizar a infraestrutura sob controle da Companhia ou, opcionalmente, arcar com a construção de gasodutos paralelos, o que não aconteceu. 

A porção da malha sudeste é aquela onde se concentra a produção de gás, incluindo a do Pré- Sal. Este ativo não é estratégico? O valor a ser pago pela Brookfield, 5,2 bilhões de dólares em cinco anos [46], foi assim reduzido porque a Petrobras preferiu não provisionar uma garantia financeira a ser executada para cobrir passivos trabalhistas e tributários que fatalmente apareceriam (prática conhecida como cláusula de escrow account) [47]. 

A estratégia, vista como benéfica, embora desobrigue a empresa de um pesado pagamento futuro, acaba por revelar indubitavelmente o caráter lesivo da venda; um verdadeiro desconto no valor dos ativos da Companhia. A Petrobras procedeu da mesma forma na venda de seus ativos na Argentina para a Pampa Energia por apenas US$ 897 milhões [47]. 

Até então, a Petrobras tarifa o transporte de gás de forma diferenciada entre gás importado da Bolívia e gás nacional. Mesmo pensando no gás nacional, a tarifação é ainda um tanto controversa, uma vez que grandes produtores como Rio de Janeiro, Espírito Santo e Bahia sofrem taxação maior pela molécula de gás natural que Alagoas, por exemplo (Alagoas representa 3% da produção nacional, versus RJ, ES e BA que em conjunto respondiam por 68% da produção em 2012) [48]. 

Por que não trabalhar em políticas mais coerentes neste sentido? Por que não trabalhar na redução dos custos operacionais? Agora que um consórcio privado controla 90% da NTS e ainda sob as incertezas regulatórias do país e regimes de taxações diferenciadas, a venda da empresa foi interessante para quem? E o que dizer quanto à cobrança que será feita pelo uso deste ativo que acabamos de vender? Qual poder de barganha a Petrobras terá sobre a tarifa cobrada pelos novos donos da NTS? 

AINDA SOBRE DESINVESTIMENTOS... 


A Petrobras Chile Distribuición (PCD) é a companhia de distribuição de combustíveis da Petrobras no Chile e possui 279 postos de serviço, além de 8 terminais próprios de distribuição, operações em 11 aeroportos, participação em 2 empresas de logística e 1 planta de lubrificantes. Foi vendida por irrisórios US$ 490 milhões, para a Southern Cross Group em maio deste ano [49]. 

A participação da Petrobras de 66% no bloco exploratório BM-S-8, localizado no campo de Carcará, no Pré-Sal da Bacia de Santos, foi vendida por US$ 2,5 bilhões para a estatal norueguesa Statoil, a serem pagos em duas partes iguais, sendo que a segunda está condicionada à unitização do campo (que extrapola para áreas contíguas) [50]. Simplificadamente, o termo unitização se refere ao estabelecimento das regras para uma operação coordenada e conjunta de um reservatório de petróleo que extrapola para vários blocos, por todos os detentores de direitos de cada bloco [51]. 

De acordo com a Statoil, “trata-se de uma descoberta de primeira classe, com óleo de alta qualidade em torno de 30º API e gás associado em um reservatório espesso com excelentes propriedades. 


O reservatório abrange tanto o bloco BM-S-8 quanto áreas não licitadas ao norte, que, estima-se, devem fazer parte de rodada de licitação prevista para 2017. A Statoil está bem posicionada para ser operadora do campo de Carcará pós-unitização, na sequência desta transação, e a rodada de licitação será uma oportunidade para aumentar ainda mais a participação neste campo. 

A Statoil estima que os volumes recuperáveis dentro do bloco BM-S-8 estejam na faixa de 700 milhões a 1,3 bilhão de barris de óleo equivalente (boe)” [52]. Isso quer dizer que o valor da venda indica que as reservas recuperáveis foram avaliadas em um preço de US$ 3 a US$ 5 por barril, segundo a consultoria Raymond James. “Ainda segundo a corretora, Carcará deveria exercer um papel importante na curva de produção da Petrobras a partir de 2020. A expectativa é que, sem o BMS8, a Petrobras deixará de produzir futuramente entre 462 milhões e 858 milhões de barris de óleo equivalente” [53]. Mesmo diante da proposta de transformar a Petrobras em uma empresa de E&P, a venda de Carcará foi mais um excelente exemplo de insucesso estratégico. Antecipando-se ao mais agressivo desmonte do Sistema Petrobras, o Ministério de Minas e Energia iniciou conversas com empresas e associações para discutir o “redesenho” do setor de combustíveis. 

“O governo se prepara para mudanças provocadas pela venda de ativos de refino, distribuição e logística pela Petrobras. A empresa vai deixar de ser hegemônica e passar a ser pautada pela lógica de mercado. Interferências políticas, como controle de preços, perdem espaço neste cenário” [54]. 

Ainda na mesma referência [54], afirma-se que “pelas contas da Agência Nacional de Petróleo, nesse período (até 2030), o país vai conviver com uma defasagem recorde entre oferta interna e consumo de combustíveis. A projeção é que a importação de combustíveis cresça em até 270% nesse intervalo de tempo”. Cenário, sem dúvida, desolador para a empresa e especialmente para o país. 

COMBATE À CORRUPÇÃO 

Valorizando práticas de fortalecimento da governança, o plano estabelece que “o processo de contratação de bens e serviços com foco em valor” será gerido sob o máximo atendimento aos requisitos de conformidade, em um esforço conjunto de prevenção e punição da corrupção. 

Louvável iniciativa, porém, longe de atingir seus objetivos em plenitude, uma vez que os modelos de contratação vigentes favorecem a ocorrência de perdas financeiras para a Companhia. Só para exemplificar, o modelo de gestão de obras baseado em licitações do tipo EPC (Engineering, Procurement and Construction) propiciou a formação de um cartel de empreiteiras e de um esquema de propinas em torno das obras da PETROBRAS os quais foram notoriamente lesivos à Companhia.

No entanto, muito maiores foram as perdas em função da transferência dos riscos dos projetos para as “epecistas”, as quais elevam consideravelmente seus custos em função das contratações antecipadas [55]. Este modelo de gestão, além de desperdiçar todo o conhecimento adquirido pela PETROBRAS na implantação de grandes empreendimentos, cria reserva de mercado para poucas empreiteiras [55] e, no limite da crise, gera emprego para chineses e coreanos, à custa dos 11,8 milhões de brasileiros desempregados em 2016 [56]. 

A FORÇA DE TRABALHO: O ÚLTIMO A SAIR, APAGUE A LUZ! 


Sob o discurso de que a força de trabalho é o grande valor da PETROBRAS, paradoxalmente apresentou-se [1] que a redução do número de empregados próprios foi de 9270, já desligados nos PIDVs, além dos 9670 previstos para desligamento até meados de 2017. 

A redução dos prestadores de serviços foi de 114.000 desde dezembro de 2014. Competências estão sendo perdidas, sem que tenha havido a necessária transferência de conhecimento, gerências inteiras sofreram grande impacto ou mesmo praticamente foram extintas uma vez que a maioria de seus colaboradores se desligaram nos PIDVs ou foram demitidos. 

Como a Petrobras pode se manter na vanguarda diante da perda em massa de parte relevante de seu maior valor?

PARA CONCLUIR A DISCUSSÃO SOBRE O PLANO 


Nos próximos cinco anos, a Petrobras pretende investir US$ 74,1 bilhões, uma redução de 25% em relação ao PNG anterior, sendo que 82% deste montante irá para o E&P. Apenas 17% do valor será destinado ao aumento da produção e à manutenção do parque de refino e gás, ou seja, ao invés de se buscar a autossuficiência no abastecimento interno de gasolina e diesel, prioriza-se a “vocação” brasileira de país exportador de commodities. 

Concluindo a partilha dos recursos, 1% do total será aplicado nas “demais áreas” da Companhia. É a gestão de recursos mais assimétrica dos últimos anos [57]. Pontos não explicitados durante a apresentação do PNG 2017-2021, mas muito comentados na imprensa, referem-se a venda de 51% na participação da BR Distribuidora e a venda da Transpetro. 

Talvez os maiores e polêmicos erros estratégicos de todo o plano. A Petrobras Distribuidora foi criada em 1971 como uma subsidiária integral da Petrobras, a qual passou a atuar na comercialização e distribuição de derivados do petróleo para todo o Brasil. 

Devido ao enorme desenvolvimento da Petrobras Distribuidora, já em 1974 a empresa assumiu o posto de maior distribuidora do país, exercendo sua função em caráter estritamente competitivo em condições de igualdade com as demais distribuidoras e superando concorrentes nacionais e estrangeiras. 

A Distribuidora vem desenvolvendo parcerias para a implantação de unidades térmicas a gás natural para fornecimento de energia elétrica, bem como programas destinados aos clientes visando a otimização do uso dos seus produtos, privilegiando os aspectos de economia de energia, preservação do meio ambiente e segurança industrial. No Brasil, foi a primeira companhia a utilizar bombas eletrônicas para abastecimento e a comercializar álcool hidratado e gás natural como combustíveis automotivos; e também a primeira a fornecer óleos combustíveis ultraviscosos, reduzindo expressivamente os custos nas indústrias. 

Foi também a primeira a lançar no Brasil o óleo classe SJ, o Lubrax SJ, o Lubrax SL, um óleo de última geração, em simultaneidade com os Estados Unidos, além do primeiro lubrificante para motores a álcool, o Lubrax Álcool, a Gasolina Supra, o Extra Diesel, lubrificante ecológico, além de várias outras ações comerciais pioneiras” [58]. Contrariamente ao lucro anual médio de R$ 1,72 bilhão [59], a BR Distribuidora resgistrou prejuízo de R$ 1,16 bilhão em 2015 (embora o lucro bruto gerado com a venda de produtos e serviços tenha sido de R$ 7,262 bilhões , ligeiramente superior ao obtido em 2014 [60]). 

Os fatores que impactaram no lucro líquido foram [60]: 1- Dívidas das empresas do setor elétrico que atuam no chamado Sistema Isolado, basicamente na região norte do país (provisionou-se um valor de R$ 2,863 bilhões referente às dívidas); 2 – Impairment no valor de R$ 298 milhões referentes às operações abaixo da capacidade instalada da base de Cruzeiro do Sul (Acre); e 3 – Provisão de R$ 555 milhões referentes à autuações fiscais de ICMS. Ou seja, novamente foram jogos contábeis que impediram a apresentação de um resultado positivo da ordem de R$ 1,4 bilhão [60], apesar do menor consumo de diesel e óleo combustível utilizados pela indústria, transporte e geração de energia. 

A venda do controle da BR por parte da Petrobras representaria a perda de um imenso valor para a Companhia, seja pelo desempenho operacional e presença estratégica da Distribuidora em todo país, seja pelo fato da empresa ser credora de R$ 5,4 bilhões devidos pela Eletrobrás, pela possibilidade que um controlador privado terá de controlar os preços de combustíveis e lubrificantes e pela sua capacidade de escolha dos fornecedores de derivados refinados. 

O imenso prejuízo decorrente da capacidade ociosa nas refinarias brasileiras, causada por uma preferência do controlador em importar derivados, faria com que o valor capturado pela Distribuidora deixasse de ser percebido pela Petrobras e pela sociedade brasileira como um todo [61]. Um controlador privado pode ainda adotar práticas de engenharia financeira que mininizem o pagamento de impostos federais e estaduais (evasão fiscal), rever as condições de pagamento pelo fornecimento de combustível para entes públicos como hospitais, Corpo de Bombeiros e Polícias, com prejuízos para toda a população, precarizar as condições de trabalho e terceirização de seus colaboradores e cortar programas de patrocínios sociais, ambientais e culturais [61]. 

Destaca-se também o papel fundamental da BR no fornecimento de combustível para as Forças Armadas, atuando como um dos elos fundamentais do Sistema de Segurança Nacional. 

O terceiro, da sequência de quatro documentários, Secrets of Seven Sisters, mostra como empresas de petróleo privadas podem lucrar abusivamente por conta do fornecimento de combustíveis às Instituições Militares [62]. 

Daniel Yergin, em seu livro O Petróleo, igualmente apresenta relatos históricos esclarecedores sobre a mesma questão [63]. “A BR Distribuidora, enquanto subsidiária integral da Petrobras permite que a estatal conheça e regule toda a cadeia de valor. Com domínio sobre a estrutura de custos, é possível garantir que o mercado seja competitivo. Com a alienação do controle da BR, aumenta-se o risco de formação de cartel com a extração de valores excedentes dos consumidores” [61]. 

De acordo com nota divulgada em O Globo, o Citibank já está cuidando dos trâmites para iniciar a operação de venda da BR Distribuidora. Segundo o autor da coluna, “o negócio será fechado por algo em torno dos R$ 12 bilhões” [64]. Venda estratégica para quem? “Além disso, das 21 maiores empresas de óleo e gás do mundo, 19 são integradas do poço ao posto. 

Se o mundo enxerga valor na integração da cadeia produtiva de petróleo, qual a razão da Petrobras abrir mão do controle sobre uma atividade essencial? A marca BR é um ponto relevante”, a mais forte expressão da Petrobras junto ao público, “mas o que está em jogo é a capacidade da Petrobras escoar sua produção, garantir mercado para seus produtos e ter equilíbrio em toda sua estrutura, maximizando os ganhos e aproveitando oportunidades em qualquer cenário econômico” [65]. 

“A Transpetro é uma importante empresa para o transporte e a logística de combustível no Brasil. Atua ainda nas operações de importação e exportação de petróleo e derivados, gás e etanol. Com mais de 14 mil quilômetros de oleodutos e gasodutos, 47 terminais (20 terrestres e 27 aquaviários) e 56 navios, a Transpetro tem o desafio de levar combustível aos mais diferentes pontos do Brasil. Suas operações também abastecem indústrias, termelétricas e refinarias. Como subsidiária integral da Petrobras, une as áreas de produção, refino e distribuição do Sistema Petrobras e presta serviço a diversas distribuidoras e à indústria petroquímica. 

Por isso, a Transpetro, tem atuação nacional, com instalações em 20 das 27 unidades federativas brasileiras” [66]. Em 2015, a receita operacional bruta foi de R$ 9,549 bilhões e o lucro líquido de R$ 1,033 bilhão, superando a média dos dois últimos anos, de R$ 908 milhões [66,67]. 

A área de dutos e terminais foi responsável por 78% da receita operacional do ano passado. De acordo com notícias divulgadas pela imprensa [68], talvez a Transpetro seja dividida em duas para facilitar a venda. A dificuldade do negócio de venda, segundo a matéria, passa pelo controle da Petrobras. “Os terminais pertencem à estatal e foram cedidos à Transpetro. Para incluí-los no projeto seria necessário uma reestruturação dos ativos. 

Outro empecilho é a dependência da subsidiária em relação à controladora – 98% do seu faturamento vem de serviços prestados à Petrobras” [68]. O presidente do Sindicato dos Marítimos (Sindmar) alerta para o óbvio: “Se a Petrobrás perde o controle, ou ela constrói outros terminais ou paga para usar os atuais a preços de mercado” [68]. Venda estratégica para quem? E o desenvolvimento em Ciência & Tecnologia? Qual o destino de Centro de Pesquisas da Petrobras dentro deste contexto de propostas tão duras e lesivas à Companhia? Por mais de 40 anos, o CENPES contou com um modelo integrado de Pesquisa, Desenvolvimento e Engenharia. Ao longo do tempo, esse modelo de desenvolvimento tecnológico mostrou-se bastante robusto, eficiente e foi responsável pelas maiores conquistas da empresa, dentre elas, a descoberta do Pré- Sal. 

Em maio de 2015, a Petrobras recebeu pela terceira vez o prêmio OTC Distinguished Achievement Award for Companies, Organizations, and Institutions “em reconhecimento ao conjunto de tecnologias desenvolvidas para a produção da camada Pré-Sal. Esse prêmio é o maior reconhecimento que uma empresa de petróleo pode receber na qualidade de operadora offshore. 

Em 1992, a Petrobras recebeu o prêmio por conquistas técnicas notáveis relacionadas ao desenvolvimento de sistemas de produção em águas profundas relativas ao campo de Marlim e, em 2001, por avanços nas tecnologias e na economicidade de projetos de águas profundas, no desenvolvimento do campo de Roncador” [69]. 

A saída da Engenharia Básica da estrutura do CENPES, muito mais que uma mera mudança de domicílio, representa a descarecterização e a perda de competências adquiridas pela Companhia na concepção e gestão de grandes empreendimentos, no desenvolvimento de tecnologias proprietárias a partir das experiências operacionais e na implantação de melhorias para as unidades industriais, que vão desde o aumento de capacidade de produção até a adequação às exigências ambientais [70]. 

A criação e o desenvolvimento do mercado brasileiro de fornecimento de bens e serviços destinados ao setor de óleo e gás se iniciou no CENPES, com a Engenharia Básica. Perdê-la pode ser o início do fim. Muito provavelmente intensificaremos a política de terceirização da pesquisa, contratando cada vez mais universidades e agora também Empresas de Base Tecnológica. Talvez, em um futuro próximo, o mais importante papel do Centro de Pesquisas da Petrobras seja apenas o cumprimento das obrigações com a ANP.

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